Maria João Brito de Sousa
PALAVRAS
Eu gosto de palavras que se enlaçam
Em frases simples, ou versos floridos,
Desde que, entrelaçadas, satisfaçam
Os ritmos que lhes sejam requeridos,
Quer nuas e selvagens quando passam,
Quer com mantos opacos por vestidos,
Que nas voltas que dêem, se se abraçam,
Falem tanto à razão quanto aos sentidos.
Colho-as ao fim da tarde, ou bem cedinho,
Conforme o propicie o descaminho
Por onde me conduzam tempo e espaço
E a elas me confio enquanto possa
Lembrar que, quando fui menina e moça,
Quase ousei desistir das que hoje abraço.
Maria João Brito de Sousa – 18.01.2018 -18.12h
publicado às 10:49
Maria João Brito de Sousa
NÃO MAIS QUE UM DEDAL...
Hoje sou poeta que, em tempos passados,
Teve outros cuidados. Achei-me incompleta.
Sem rumo, nem meta pr`ós passos já dados,
Vi-os naufragados sem causa concreta
E, usando a caneta, sondei meus pecados
Tão sobrestimados... tudo isso era treta
E a vida, uma recta sem fuga prós lados
Que me eram vedados. Tornei-me obsoleta.
Era natural, ou assim o pensava
Porque me cansava de vê-lo tão mal
Que achava um sinal onde nada encontrava;
Nem pedra, nem clava, nem sonho, afinal,
Ou pinga de sal, se o sal me faltava...
Pouco me sobrava. Não mais que um dedal.
Maria João Brito de Sousa – 04.12.2018 – (por volta das 8.00h)
Trabalho inspirado no soneto SOBRE MIM DISSERTO de MEA.
publicado às 10:24
Maria João Brito de Sousa
É LÁ NESSE LUGAR QUE A VIDA HIBERNA
Lá no alto onde o tempo se calou
Onde há nuvens que choram sem querer
Pra onde a lua foi e não voltou
E há estrelas acabadas de nascer…..
Lá no alto onde o tempo já brilhou
Quando o sol lá nasceu sem se esconder
Lá onde o azul do céu se misturou
Com as cinzas das estrelas a morrer
Fica o lugar mais belo, mais sereno
Onde a paz é maior o vento ameno
E a luz, eu direi mesmo que é eterna
Onde o sonho renasce e permanece
Quando a idade já nos entardece
…É lá nesse lugar que a vida hiberna!
MEA
28/11/2017
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TAMBÉM NESSE LUGAR NASCE A POESIA
“Lá no alto onde o tempo se calou”
E os astros pulsam ao sabor do espanto
Cadências de um quasar que começou
Há milhões de anos sem que o desencanto,
“Lá no alto onde o tempo já brilhou”,
O impedisse de ir espraiando um manto
Sobre o vazio de um espaço que inundou
De química, primeiro, e... depois tanto,
“Fica o lugar mais belo, mais sereno”
De todos os locais que um ser terreno
Pode engendrar, se sonha e fantasia;
“Onde o sonho renasce e permanece”,
Cresce o Homem que ainda desconhece
Quanto de si é Ciência... e Poesia.
Maria João Brito de Sousa – 29.11.2017 – 18.10h
publicado às 18:27
Maria João Brito de Sousa
Mais três tímidos pingos se juntaram
Aos três primeiros, hoje anunciados,
E, bem depressa, mil outros tombaram,
Pois já cai chuva a rodos nos telhados,
Nos canteiros do buxo que ensoparam,
Nos vidros das janelas, salpicados,
Nas gentes que aqui passam, ou passaram,
Sob chapéus-de-chuva improvisados...
Bendita sejas tu, que dessedentas!
Bendita, pelo bem que representas
Para a terra sequiosa e para a vida!
Chorando sobre a crosta, a reinventas,
A cobres de verdura e a sustentas,
Ó chuva, tão sonhada, quão fugida!
Maria João Brito de Sousa – 23.11.2017 – 16.34h
NOTA – Na sequência do soneto “Só Três Pingos...” de Maria da Encarnação Alexandre.
publicado às 17:27
Maria João Brito de Sousa
Que faço de um poema que não pinto,
Nem burilo, polindo-lhe as arestas?
Que faço ao que me escapa pelas frestas,
Daquilo que não vejo ou que não sinto?
Que faço, já que eu própria me desminto
Pois vou desperdiçando em mornas sestas
As horas de criar, quando em giestas
Podendo transmutar-me, o nem consinto?
Ah, toda a minha vida andei correndo
E agora repouso, compreendo...
Mas pudesse eu correr como corria
E garanto que, ainda que morrendo,
Seria mais veloz, menos doendo
Depois da maré-cheia, outra, vazia...
Maria João Brito de Sousa – 11.08.2017 – 11.40h
publicado às 11:48
Maria João Brito de Sousa
A VIDA
É vão o amor, o ódio, ou o desdém; Inútil o desejo e o sentimento... Lançar um grande amor aos pés d'alguém O mesmo é que lançar flores ao vento! Todos somos no mundo "Pedro Sem", Uma alegria é feita dum tormento, Um riso é sempre o eco dum lamento, Sabe-se lá um beijo donde vem! A mais nobre ilusão morre... desfaz-se... Uma saudade morta em nós renasce Que no mesmo momento é já perdida... Amar-te a vida inteira eu não podia... A gente esquece sempre o bem dum dia. Que queres, ó meu Amor, se é isto a Vida!...
Florbela Espanca, in "Livro de Sóror Saudade"
... E A MINHA...
"É vão o amor, o ódio, ou o desdém"
E esvaem-se as paixões mais exaltantes
Na própria combustão do que as mantém
Acesas como chamas rutilantes...
"Todos somos no mundo ´Pedro Sem`"
Que exalta as suas naus já vacilantes
Pr`a logo descobrir que, sem vintém,
Tudo voltava a ser como era dantes...
"A mais nobre ilusão morre... desfaz-se..."
E a realidade, essa, compraz-se
Lembrando o quanto pôde ser fatal...
"Amar-te a vida inteira eu não podia";
Traída a dimensão da poesia,
Foi a mim que eu deixei de ser leal...
Maria João Brito de Sousa - 06.02.2016 - 14.31h
publicado às 10:10
Maria João Brito de Sousa
(Soneto em decassílabo heróico)
E anima-se a matéria criativa
até ao ponto exacto e necessário
para que nasça, enfim, matéria viva
do que, antes, parecera o seu contrário
E cresce, a cada dia mais activa,
não pára de fluir de modo vário
na direcção daquilo que a motiva
pr`a desaguar, por fim, no seu estuário...
Digo, porém, que não será cativa
da força de algum ponto estatutário,
nem verga à reprimenda punitiva,
Porque é pertença do mais rico erário
duma Arca que flutua e que anda à d`riva
no rio do nosso humano imaginário.
Maria João Brito de Sousa - 29.08.2015 - 17.56h
NOTA - Esta Fórmula, ou como lhe entendam chamar, aplica-se às línguas - todas elas! -, mas não só...
publicado às 10:59
Maria João Brito de Sousa
(Soneto em decassílabo heróico)
Ó vagas do meu mar, loucas marés que ao longo de uma vida me perderam, ó jangadas de espuma, ó vãs galés de uns sonhos que em poema aconteceram,
Não sei se ainda estou sobre os meus pés se vos evoco e lembro que estiveram ao leme desta barca, ou no convés de um sonho que bem poucos conheceram
Mas, livre ou brutalmente aprisionada, o amanhã que o diga. Eu calo agora por hoje, ou para sempre, a voz magoada
Que me comanda a vida a toda a hora e a cada instante insiste em ser cantada, mesmo quando empurrada borda fora...
Maria João Brito de Sousa – 05.06.1015 -16.16h
Imagem retirada do Google
publicado às 17:20
Maria João Brito de Sousa
(Em verso heróico)
Da mesmíssima massa em que sois feitos, por percorrer-me a carne um sangue igual, assumo como vós certos defeitos que expresso num poema acidental
Tenho, decerto, humanos preconceitos, infimos medos que disfarço mal, gestos azedos, duros, imperfeitos, que se me escapam sem que eu dê por tal,
Mas... como todos vós, tenho direitos; venha o que venha, do que é virtual, piso os atalhos, muito embora estreitos,
Que ousei escolher sem previsão geral do que sabemos serem os efeitos de amar-se a vida e ser-se, assim, mortal.
Maria João Brito de Sousa – 02.05.2015 -19.48h
Gravura de Manuel Ribeiro de Pavia
publicado às 22:44
Maria João Brito de Sousa
… e solta-se um soneto alvoroçado Da estranha compulsão do gesto breve Que cresce de um anseio exacerbado Nos insensatos dedos de quem escreve. Traduz um sonho só, deixa de lado O jugo do silêncio em que prescreve E ao ver-se desse jugo libertado Diz, por vezes, bem mais do que o que deve. Tem pouco espaço pr`a dizer-se inteiro Mas, habilmente, custe o que custar, Num nada se constrói teimosamente; Pode ser temerário, aventureiro, Ou simples, incorpóreo eco lunar, Mas não terá nascido inutilmente!
Maria João Brito de Sousa – 31.05.2012 -16.51h
Imagem das Ilhas Galápagos retirada da net
publicado às 17:22
Maria João Brito de Sousa
Passa num nada este nada Que duma vida nos cabe Quando olhamos para a estrada Temendo que ela se acabe… Vamos medindo a passada Antes que tudo desabe Mas, duma estrada acabada, Pouco ou nada a gente sabe Pois, por mais que se procure Razão para os desatinos A que a estrada conduzia, Nunca evitamos que jure; - Todos vós nasceis meninos e haveis de morrer um dia…
Maria João Brito de Sousa – 06.04.2012 -13.21h
NOTA - Peço desculpa pela inusitada apresentação do texto poético... a decisão foi do Sapo...
publicado às 13:47
Maria João Brito de Sousa
O, Sagesse, seule capable de nous guider à travers de la vie! O toi qui enseignes la vertu et qui domptes le vice, que serions-nous sans toi, nous et tous les hommes?
C`est toi qui as enfanté les villes, en inspirant aux hommes épars l`amour de la société; c`est toi qui leur as fait rapprocher leurs demeures,
contracter des unions saintes, inventer une langue et une écriture comunes. C`est toi qui as dicté les lois, formé les moeurs, civilisé les peuples.
Je cherche un asile auprés de toi; j`implore ton secours. Content jusqu`ici de suivre en partie tes leçons, aujourd`hui c`est tout entier que je me donne à toi. Un seul jour passé dans le bien et selon tes préceptes, vaut mieux qu`une immortalité coupable.
A quelle puissance aurions nous donc recours plutôt qu`a la tienne, ô toi qui nous donnes la tranquilité de la vie et qui nous ôtes la terreur de la mort?
Cícero, Tusc. 5.2.
L`ARBRE ET SON FRUIT
Sois attentif à l`accomplissement de tes oeuvres, jamais à leurs fruits.
Ne fais pas l`oeuvre pour le fruit qu`elle procure, mais ne cherche pas pour cela a éviter l´oeuvre.
Malheureux sont ceux qui aspirent à la récompense!
Bhagavad-Gita
publicado às 14:22