Maria João Brito de Sousa
Dar-vos-ia o que tenho, nada tendo;
O intenso travo a sal do mar que sou,
A fonte de onde o verso me brotou,
As mãos com que costuro e me remendo,
A dúvida, a certeza e quanto entendo
De uns dotes com que a vida me dotou,
A beleza que tive e já murchou,
A musicalidade a que me prendo,
A rosa, o espinho, a força, o estro, a chama
E tudo, tudo aquilo a que me agarro
Pr`a manter-me de pé, fugindo à cama...
Poeta sobre humanos "pés-de-barro",
- que mil vezes prefiro a ´mãos com lama`.. -
Eu dar-vos-ia o céu... por um cigarro!
Maria João Brito de Sousa - 20.01.2017 - 16.11h
publicado às 21:30
Maria João Brito de Sousa
Não sei se é desta névoa que se evola
Das letras, sob as minhas mãos geladas,
Se destas teclas, quase tão estouvadas
Como as meninas, quando não há escola,
Já me escapa a palavra, como a bola
Rola em pátio de escola quando, ousadas,
As meninas se lançam nas jogadas
Com que qualquer criança se consola...
Mas, sendo as dos meus olhos, são culpadas
Pelo mau desempenho que as desola
Depois de descoberto e, já cansadas,
Guardam os versos dentro da sacola
E ausentam-se da estrofe, envergonhadas;
Já nem tentam "jogar", se for por esmola...
Maria João Brito de Sousa -14.01.2017 - 11.14h
publicado às 21:30
Maria João Brito de Sousa
(Soneto Petrarquiano)
Talvez um dia - eu posso lá saber... -,
No culminar do ser, que é toda a morte,
Um verso suavemente me conforte
E a morte, em vez de dor, me dê prazer...
Talvez, talvez, talvez... ouso dizer,
Apesar de saber ser certa a sorte
De me perder da bússola e do Norte,
Talvez nem dê por ela, se a escrever
E, deixando por cá quanto me importe,
Pouco importe, depois, quando vier
E seja a morte apenas um transporte,
Ou seja quanto eu dela pretender
Quando, cansada de mostrar-me forte,
Puder ficar cansada de viver...
Maria João Brito de Sousa - 12.01.2017 - 12.05h
Imagem - "Nu, feminino" , Manuel Ribeiro de Pavia
publicado às 21:30