Maria João Brito de Sousa
POEMA MEU DE CADA DIA *
Sei-o só porque o sei e mais não digo
Que a estrofe, irredutível, se me impõe
Na estranha convicção que me propõe
E também na desculpa em que me abrigo *
Sei-o, tal como a terra sabe o trigo
Nessa complexidade que o compõe,
Tal como a razão trai se pressupõe
Por cada floração um rasto antigo... *
Sei-o de outro saber que é muito meu
Que se chama poema e se esqueceu
De vir documentado ou ter razões *
E por mais que o descreva apenas eu
Terei provado o mel que então escorreu
Dos versos que me encheram de ilusões *
Maria João Brito de Sousa
21.02.2012 – 19.07h ***
publicado às 11:44
Maria João Brito de Sousa
VIAGEM ESPACIO-TEMPORAL *
A Marte não posso subir nem descer
Conforme o sentido se entenda no espaço,
Mas posso ir sonhando, se bem me aprouver,
Passear nos astros sem dar um só passo *
Por lá irei estando enquanto puder
E irei descansando deste meu cansaço
Ao qual sem ter escolha me deixei prender
Até que alguém venha soltar-me do laço *
A que fiquei presa. E perco-me em Marte,
Na Terra, na Lua e por toda a parte
Vestida de abraços, sorrindo encantada, *
Por amor à Vida, transmutada em arte
Que não sei exprimir-te nem posso explicar-te
Conquanto me saiba por ela explicada. *
Mª João Brito de Sousa
01.09.2017 – 17.21h ***
(Soneto reformulado)
publicado às 10:44
Maria João Brito de Sousa
Por aqui se faz favor
publicado às 16:18
Maria João Brito de Sousa
*
O ELOGIO DO MÉTODO - Reedição *
Minh`alma é toda feita de inocência,
De ternas e selvagens rebeldias
E dos pontuais arbustos de imprudência
Que brotam junto às margens dos meus dias *
Cultivo, sem descanso, inteligência,
Privilegio sempre as harmonias
E procuro entender – venero a ciência! –
Os frutos que colher por estas vias *
Quando algo me transcende, não desisto:
Guardo para depois o nunca visto
No baú dos meus sonhos de menina *
Talvez mais tarde eu ache essas respostas
Se as questões forem sendo assim dispostas
No tempo a que uma vida nos confina. *
Maria João Brito de Sousa
21.08.2011 – 15.18h ***
publicado às 11:01
Maria João Brito de Sousa
PÉS DE BARRO *
Dar-vos-ia o que tenho, nada tendo:
O intenso travo a sal do mar que sou,
A fonte de onde o verso me brotou,
As mãos com que me rasgo e me remendo, *
A dúvida, a certeza e quanto entendo
De uns nadas de que a vida me dotou,
A beleza que tive e já murchou,
A musicalidade a que me prendo, *
A rosa, o espinho, a força, o estro, a chama
E tudo, tudo aquilo a que me agarro
Pra manter-me de pé, fugindo à cama... *
Poeta sobre frágeis pés de barro,
- que mil vezes prefiro a ´mãos com lama`.. -
Eu dar-vos-ia o céu... por um cigarro! *
Maria João Brito de Sousa
20.01.2017 - 16.11h ***
publicado às 11:18
Maria João Brito de Sousa
AQUELE VERSO QUE UM DIA PERDESTE *
Àquele verso que se te escapou
Quando te passeavas na cidade,
Julgo ter sido eu quem o achou
No chão caído e morto de saudade *
Desse poema que nem começou
Por culpa sua, ainda que a vontade
Lhe pedisse uma urgência que calou
Por ter perdido a oportunidade. *
Quis devolver-to mas, fragilizado,
Dissolveu-se inteirinho ao ser tocado
Embora eu lhe tocasse tão de leve *
Que pareciam seda, estes meus dedos...
Versos perdidos são como os segredos:
Se descobertos, têm vida breve. *
Maria João Brito de Sousa
21.01.2019 – 14.12h ***
Poema reformulado
publicado às 10:20
Maria João Brito de Sousa
NAS ARTÉRIAS E V(E)IAS DA CIDADE
Reedição *
O sangue inunda as veias da cidade
Vindo da fonte humana que o contém
E só por uns instantes se detém
Para beber um copo na Trindade, *
Para dizer bom dia a quem lá vem,
Pra dar-se num abraço de saudade,
Pra comer uns natinhas em Belém
Ou na Avenida que é da Liberdade... *
Corre esse sangue em estranho descompasso
Do Marquês ao Terreiro que, do Paço,
Passou a ser do povo que é sa(n)grado, *
E nessa infinda, imensa hemorragia
Esvai-se a cidade inteira, dia a dia,
Ao som das mansas notas do seu fado. *
Maria João Brito de Sousa
22.06.2018 -15.48h ***
publicado às 15:41
Maria João Brito de Sousa
EU, POETA E PORTUGUÊS *
Eu trago o nobre toque das areias
Do meu pequeno-imenso Portugal
E vivo em transparências de cristal
Sobre uma estranha fome de alcateias *
Eu, esboço de tritões e de sereias
Num traço decidido, horizontal,
Renasço, para o bem e para o mal,
Da cópula carnal de mil ideias... *
Aqui cresci! Castelo em construção
De um sonho e da raiz de uma ilusão
Na qual naufraga um mar todos os dias, *
Descrevo-me em longínquas caravelas,
No Sol, na Lua e nos milhões de estrelas
Em que a dor espanto, à força de ironias. *
Maria João Brito de Sousa
Junho, 2008 *
In Poeta Porque Deus Quer
Autores Editora, 2009
***
Vinheta de Manuel Ribeiro de Pavia
In LIVRO DE BORDO, António de Sousa
publicado às 11:00
Maria João Brito de Sousa
DEMOCRACIA(S)
*
Que capa ostentas tu, Democracia?
Conforme à “barricada” lhe convém,
assim te vais vestindo de ousadia,
ou de odalisca presa em pleno harém *
Pois se acaso te abraça a vilania,
a capa desbotada é que irá bem
c`o as vestes com que a grande oligarquia
disfarça a escravatura em que te tem *
Mas, sendo uma questão de perspectiva,
crer ou não crer que és tu, vendo-te assim,
por tantos aplaudida, se cativa, *
Direi, Democracia, que és, pra mim,
mero reflexo de outra que vi viva,
vestida de vermelho e... livre, enfim! *
Maria João Brito de Sousa
16.07.2015 – 15.04h ***
(poema ligeiramente reformulado) ***
publicado às 10:34
Maria João Brito de Sousa
A FLORESTA - Reedição *
Pintei numa floresta cogumelos
Sob árvores azuis, como Gauguin,
E adornei as neblinas da manhã
De violetas e de ocres muito belos *
Fui colorindo o fundo de amarelos,
Conversei com Diana, abracei Pã,
Provei o verde polme da maçã
E entrancei ramos de hera nos cabelos... *
Não houve nenhum sol, nenhuma lua
Que ousasse reclamar-me a sua posse,
Ou que reivindicasse o seu destino, *
Porque ela, omnipresente, agreste e nua,
De aspecto inacabado e sabor doce,
Nasceu-me de um soneto em desatino. *
Maria João Brito de Sousa
25.09.2009 ***
publicado às 08:57