NO SILÊNCIO EM QUE TO DIGO - Reedição
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ESSÊNCIA
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Mudas de espanto e sem fazer sentido
Nascem palavras, brotam sensações
Que se entrechocam num ponto perdido
Gerando prados, montanhas, vulcões
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Trocando as voltas ao que foi pedido,
Emudecendo a voz de outras questões
Com que se tenham já comprometido,
Muito senhoras das suas razões!
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Como ecos fundos, chegam sons distantes
Que, cá por dentro, fazem ressoar
Roucos murmúrios de ideias constantes
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Músicas loucas, vibráteis, pulsantes
Em que o desejo se ousa decifrar
Na pauta insone de uns versos cantantes
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Maria João Brito de Sousa
16.05.2014 – 16.54h
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BANDEIRA DE CORSÁRIO
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À nuvem que crescia ordenei: - Gela!
E ela estremeceu, mas não gelou.
Quis pintar qualquer coisa e gritei: - Tela!
Mas ela fez-se surda ou nem escutou
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Restava-me a memória, esta sequela
De um sonho (in)conquistado que passou,
Escondida onde nem eu dava por ela,
Murchando à sombra desta que hoje sou
*
Escrava da minha própria liberdade,
Jamais o burburinho da cidade
Me há-de arrancar à paz do meu estuário
*
Sobre o convés do galeão, que piso,
Disparo o meu canhão, sem pré-aviso,
E desfraldo a bandeira de corsário.
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Maria João Brito de Sousa
19.07.2018 – 17.15h
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Às minhas memórias de Emílio Salgari
Eu com a avó Alice e o avô poeta na varanda da casa da rua
Luís de Camões
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SE O CHICOTE DO RAIO ME ILUMINA
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Se hoje escrevo com força de trovão
E o chicote do raio me ilumina,
São as minhas memórias de menina
Que, debruçadas neste coração,
*
Me enfunam das razões que há na razão
Essa improvável vela que, à bolina,
Singra agora indomável peregrina
Dos ventos que vão rumo ao furacão
*
Lembras-te, avô poeta, desses dias
Das chuvas fortes e das ventanias
Que tanta vez saudámos fascinados
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P´las vergastas de luz que ribombavam
Colorindo as rajadas que açoitavam
Os nossos rostos mudos e assombrados?
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© Maria João Brito de Sousa - Julho, 2020
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(escrito no dia a seguir à grande trovoada de Verão)
Fotografia de Abel Ferreira Simões
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NAS TUAS MÃOS
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Nas tuas mãos eu, ave, me confesso
E esvoaço e sucumbo e já rendida
Espero delas a graça de uma ermida
Onde a chama que sou não tenha preço
*
Eu, ave, tudo entrego e nada peço:
Submeto-me à carícia pressentida
Nas asas da candura em mim escondida
Que tu não sonharias e eu nem meço...
*
E que outra ave marinha ofertaria
Tão extrema e profundíssima alegria?
Que outra se te daria em seda pura?
*
Às tuas mãos, quem mais se atreveria
A desvendar-lhes sede e fantasia
Para enchê-las de espanto e de ternura?
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Maria João Brito de Sousa
Maio 2007
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Fotografia de António Pedro Brito de Sousa
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MÃE
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Soneto Bordado a Linho Sobre Cetim
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Nestes versos que engomo a ferro quente
sem uma ruga que ensombre, no fim,
este lembrar-te quando, estando ausente,
te não recordas, nem sequer de mim,
*
Neste auscultar-te como se presente
te mantivesse, eternizando assim,
doce, a memória, quando é tão dif`rente
de ver-te viva, bordar-te em cetim...
*
Neste dizer talvez nada sabendo
- suave inocência dos momentos tristes -,
nesta ilusão que sei, mas nunca entendo,
*
Te afirmo que, apesar de tudo, existes:
Estás nas palavras em que aqui te prendo
e na certeza de que em mim persistes.
*
Maria João Brito de Sousa
03.05.2015-02.48h
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In Antologia Horizontes da Poesia VII
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UM SONETO À RESISTÊNCIA
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Neste meu lugre-escuna – ou é jangada? -
Vou resistindo enquanto vou podendo
E devo-vos dizer que me não vendo
Porque por preço algum serei comprada
*
Nem esta embarcação será tomada
Porque sou frágil mas nunca me rendo
E o verso é sempre a amarra a que me prendo
Enquanto dela sobre um quase nada...
*
Venho falar-vos desta força imensa,
Que tremeluz e tanto mais se adensa
Quanto mais vai teimando em resistir,
*
Que me flui no sentir, mas que se pensa,
Que mesmo naufragada, exausta, tensa,
Emerge e nada em vez de desistir.
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Maria João Brito de Sousa
09.04.2015 – 14.11h
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VERSOS DO DESENGANO
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O Mundo não me vê. Sou invisível
Como as teimosas ervas dos caminhos
E estes meus versos frágeis, comezinhos,
Não passam de um rumor quase inaudível...
*
Não fora eu tão humana, perecível
E eterna escrava dos meus desalinhos...
Mas os astros, amor, morrem sozinhos
E nem esse teu deus é infalível!
*
O que é o Mundo, amor que um dia amei,
Senão a rocha astral em que me sei
Até que um dia deixe de saber-me
*
Se os infinitos sonhos que (im)plantei
Nos versos dos poemas que engendrei,
Não me tornam maior que um simples verme?
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Mª João Brito de Sousa
16.04.2022 - 11.45h
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Memorando o soneto VERSOS DE ORGULHO de Florbela Espanca
Tela de Hieronymus Bosch
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VISLUMBRES DE UMA DISTOPIA
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Silenciosos nos seus corpos de aço,
Dormindo estranhos sonos vigilantes
E usufruindo, ou não, de um espanto escasso,
Estão os que já não são o que eram dantes
*
Guardam os torreões do novo Paço
E, escolhidos a dedo, são gigantes
Que correm dez mil milhas sem cansaço
E abatem de um só sopro astros errantes
*
As montanhas, rolando sobre esferas,
Desviam-se dos rios e das ribeiras
Que agora desaguam nas crateras
*
Cavadas pelas balas não certeiras:
Não há dias nem noites, só há esperas,
Frágeis conspirações, pulsões grosseiras...
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Mª João Brito de Sousa
28.03.2022 - 14.00h
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SONETO DO MAL MENOR
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Dá-me o ramo das rosas perdulárias
comprado na florista já esquecida
armado no “bouquet” morto e sem vida
das condenadas almas solitárias...
*
Dá-me uma – mais serão desnecessárias...-
na haste em que a chorei, porque, à partida,
lhe condeno a razão de ser colhida,
deixando, na raiz, funções tão várias
*
Juro que não protesto... e mais não digo!
Hoje perco a raiz, enfrento o p`rigo
e estou pronta a render-me sem chorar
*
Se o derradeiro golpe, esse castigo
que me arranca do mundo em que me abrigo,
me degolar, de vez, sem me magoar
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Maria João Brito de Sousa
26.03.2015- 15.08h
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DESOLAÇÃO
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Choro quem parte e temo por quem fica:
Se a vida tem remédio, a morte não
E o mundo vai caindo em depressão,
Sem que se saiba tudo o que isso implica
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Já que ao que tudo ou quase tudo indica,
Pouco nos deixa, esta devastação
Pr`além do rasto de desolação
Que diante de nós se multiplica
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Como vírus que, entrando em mutação,
Corrói um mundo do qual não abdica
E lhe devora a carne feita pão.
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Lá longe, ouve-se um sino que repica,
Uma voz que suplica a salvação
E outra que nega o que isso significa.
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Maria João Brito de Sousa
03.03.2021 - 11.07h
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