Maria João Brito de Sousa
VI VINICIUS
*
Vinde e vencei! Versejos vigorosos,
Vastas vitórias, verticais, vibrantes
Vos valorizam, vates! Véus velantes,
Vãs virtudes vos vetam, valorosos!
*
Vencei vitórias, ó vitoriosos!
Venenos vãos vos vendem! Verdejantes
Verborreias, vencidas, volitantes,
Vazam, vertem venenos vaporosos...
*
Válidos vinhos vituperam. Vícios!
Vivo e vitorioso, vi Vinicius
Versejando voragens e vertigem.
*
Vejo o vector vibrátil e vermelho,
Viço vilipendiado, vate velho
Virtuoso e voraz varando virgem.
*
Maria João Brito de Sousa – 20.07.2018 -12.45h
publicado às 07:25
Maria João Brito de Sousa
EU, O LOBO
(Soneto de Coda)
Sou um lobo e nasci para predar
Quanto me baste pra me garantir,
Bem como a todo o fruto que gerar
Na compulsão de me reproduzir,
Todo o bicho passível de matar
A dureza da fome que eu sentir,
Que também eu a sinto a protestar
Quando o sustento vai tardando em vir...
Se te assusto nas noites de luar
C´o uivo prolongado que emitir,
Mais a mim me violento, se o calar!
Mais tu matas do que eu possa caçar
E bem mais do que a fome te exigir;
A ti, dono e senhor do teu mal-estar,
Que apenas caças para te exibir,
Que mais posso dizer-te pra mostrar
Ter, também, o direito de existir?
Maria João Brito de Sousa – 27.06.2018 – 13.48h
publicado às 08:23
Maria João Brito de Sousa
FALO DO QUE SINTO
(soneto hendecassílabo com rimas encadeadas)
Já mortos, no tempo, andam os valores
mas nascem “senhores” neste nosso chão
que serão, ou não, por formação doutores...
porém... estupores?!... Isso eu sei que são!
Com ou sem razão, a esses tais “senhores”
chamo ditadores e aos que a eles dão,
por bajulação, aplausos e louvores
chamo de impostores! Digam lá que não!?
Sempre fiz questão de escrever de falar...
sem medo apontar injustiças que vejo
jamais p’lo desejo de ser aclamado...
foi-me já legado! Sem me comparar
a Ary vou gritar, porque nele me revejo,
não sou nem almejo ser vate castrado!
Abgalvão
...*…
TAMBÉM DO QUE SINTO, FALO!
Também do que sinto falo sem pudor,
Sem mudar de côr. Sobre essas, não minto,
Nem douro, nem pinto valor que é valor,
Nem que erga o teor à dor que hoje consinto
E que evito e finto, seja como for...
Sem um só rubor, direi tudo o que sinto
Sem branco nem tinto que altere o sabor,
Melhor ou pior, do que é claro e distinto.
Fujo ao tal estrelato que não me seduz,
Que sempre reduz a memória do facto
Ao mero aparato de uns jogos de luz...
Isto me conduz e portanto delato
Maldade, mau trato e quanto os traduz
Porque os reproduz sem um termo... e a contrato!
Maria João Brito de Sousa – 18.06.2018 – 12.38h
Pablo Picasso - Self Portrait, 1907
publicado às 09:59
Maria João Brito de Sousa
MURMÚRIOS DO TEMPO
Às vezes há murmúrios pelo tempo… O vento geme em portas e janelas As nuvens dissimulam as estrelas O sol fica sem brilho, pardacento
O céu muda de azul para cinzento A chuva traz-nos novas aguarelas; Mudando a Natureza as suas telas Talvez ela até faça algum lamento
Porém o tempo chora e há beleza No cinza de que veste a Natureza Embora haja uma bruma no seu rosto
Serão choros do tempo, de tristeza? Há tratos que lhe damos com rudeza Talvez haja no choro algum desgosto...
Joaquim Sustelo
(editado em MURMÚRIOS NO TEMPO)
...* ...
SILÊNCIOS DO TEMPO
Outras vezes o Tempo silencia
As vozes murmuradas dos poetas,
Guardando-as em caixas tão secretas
Que nem um adivinho as acharia
E ninguém sabe por que as guardaria,
Por que razão as cala se, directas,
Essas vozes se erguiam muito erectas
No tempo em que o poema resistia.
Lamentos, ou sorrisos, ficam mudos
Nas gavetas dos linhos, dos veludos
E das sedas que o Tempo resguardou
Dos humanos ouvidos, quais riquezas
Que se tornassem bem guardadas presas
Do silêncio a que o Tempo as condenou.
Maria João Brito de Sousa – 17.06.2018 – 14.47h
Imagem - O Poeta Pobre - Carl Spitzweg
publicado às 10:36
Maria João Brito de Sousa
PAIXÃO DE NAMORADOS
Como a chama reclama combustível, Para manter-se acesa e aquecida, A paixão, igualmente perecível, Depende do desejo pra ter vida.
Como a chama, a paixão é suscetível De extinguir-se depois de consumida, Mantendo-se, porém, inexaurível, Se a fonte dos desejos for mantida!
Não a fonte da eterna juventude, Mas a tal sensação de plenitude Que completa os casais apaixonados;
Que funde, além dos corpos, nossas almas Nas chamas da paixão, que, mesmo calmas, Nos fazem para sempre namorados!
Belém, 12 de junho de 2018. Jay Wallace Mota.
...* ...
A CHAMA DA AMIZADE
E quando a chama acesa permanece
Cúmplice, humana, atenta e solidária,
Quando por tudo e nada se enternece
E emana uma luzinha igualitária,
Será companheirismo, o que enaltece
Essa luz que julgámos temporária,
Mas que reluz ainda e mais parece
Ter-se tornado humana luminária.
Não explode em grandes brilhos de paixão,
Mas vai-nos garantindo a combustão
Por muito, muito tempo, essa luzinha
Que se acendeu na ponta de um rastilho
E cuja chamazinha, no seu brilho,
Começa a ser tão tua quanto é minha.
Maria João Brito de Sousa – 17.06.2018 – 10.17h
publicado às 10:33
Maria João Brito de Sousa
VIDEO
publicado às 16:26
Maria João Brito de Sousa
CONVERSANDO COM HELENA TERESA RUAS REIS
"De primaveras mesmo sendo Inverno",
De um Verbo novo e sempre mais eterno
Por cada nascituro abrindo a vida,
Dar novo olhar à dor que foi vencida.
Natal feliz: um mundo p'ra o que sofre.
Abaixo os sons do mal e o cheiro a enxofre!
Renove-se p'la paz todo o terror
Co'a Bíblia ou o Corão chamado Amor.
O sono de Jesus nos dê sossego
Num berço onde a miséria enobrece
E humildes nos curvamos numa prece.
Fruto terno e raiz a que me apego...
Ó inverno em Natal nossa esperança,
Quimera que nasceu doce criança!
Helena Teresa Ruas Reis
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"Quimera que nasceu doce criança"
E a todas as crianças representa
Fazendo, do Natal, terna mudança
Que a todos nos enlaça e nos sustenta.
Calem-se, então, os loucos da matança
Cuja riqueza, injusta e opulenta,
Nos torna a vida dura e sem parança
E sempre sacrifica alguém que tenta
Contra a ganância impor-se e dizer; Não!
Que nunca, nunca mais se nasça em vão,
Que nunca mais se sofram agonias,
Que se unam sempre o Amor e a Razão,
Pois cada um de nós tem por missão
Construir um Natal todos os dias!
Maria João Brito de Sousa – 22.12.2017
publicado às 17:51
Maria João Brito de Sousa
MEU LUGAR
Carmo Vasconcelos
O meu lugar cativo está no Além,
que este daqui, por marco provisório,
tem seu tempo marcado, transitório,
é morada perpétua de ninguém.
Estamos de passagem, mas porém,
não é caminho vão, de todo inglório,
pois se revela p'ra alma sanatório
de erros passados - carma que detém.
Na breve estada cabe-nos saldar
o "deve" e "haver" de vidas mal vividas
na displicência própria dos infantes;
sair da senda dos ignorantes,
crescer na luz das chances concedidas,
p'ra ganharmos, enfim, "nosso lugar".
Carmo Vasconcelos
DE TOMBO EM TOMBO ATÉ SE DESFAZER
Seja Depois o meu lugar cativo,
que no Tempo o concebo e não no Espaço
onde inteira me entrego ao tempo escasso
de amigos e poetas com quem privo.
Também estou de passagem... se hoje vivo,
nunca sei se amanhã se solta o laço,
mas enquanto te encontro, a ti me abraço,
poema que me tentas, louco e esquivo...
No “deve” e no “haver”, fico a perder;
devo mais do que dou, dando-me inteira
de corpo e alma e mais do que o possível,
Mas foi-me agreste a sorte que, insensível,
transmutou rocha em seixo de ribeira
que tomba e rola até se desfazer...
Maria João Brito de Sousa – 29.12.2017 – 11.10h
publicado às 13:41
Maria João Brito de Sousa
SAUDADE DO PIUÍÍÍ
Regina Coeli
Lá longe, onde o passado jaz perdido,
Sempre via um alegre trem passar;
Deixava som saudoso ao meu ouvido,
Um gostoso "piuííí" solto no ar...
A criançada, olhar embevecido,
Aplaudia o trenzinho em seu cantar,
"Piuííí, Piuííí!", um eco repetido
Até sumir sua imagem devagar...
No relembrar de dias tão distantes
Fica-me uma tristeza acre e sem fim:
Jamais verei "piuííís" como vi antes...
Um trem desliza e corre pelo chão,
Circula e encanta todos, não a mim,
Porque não traz "piuííí” ao coração...
Regina Coeli
Brasil
MEMÓRIAS DO “POUCA-TERRA, POUCA-TERRA”
Não houve “piuííís” no meu Dafundo,
Mas houve um “pouca-terra, pouca-terra”
Que enchia todo o meu pequeno mundo
Das fantasias que outro mundo encerra...
Passa agora um combóio, longe, ao fundo,
Mais distante e tão rápido que enterra
Ao passar bem veloz, num só segundo,
Sessenta e cinco anos, quando berra
Sobre os carris de ferro que devora...
Ao velho “pouca-terra” evoco em vão;
Não é tristeza, não, que essa não mora
No mais profundo do meu coração...
A menina cresceu, sofreu... não chora,
Mas ama ainda como amava então...
Maria João Brito de Sousa -19.12.2017 – 18.28h
Portugal
publicado às 10:05
Maria João Brito de Sousa
"E nasce outro dia de sonhos, de esp`rança"
Desta gasta noite de desilusões
Que vence o cansaço, que traz a bonança
Que à beira do palco conduz multidões...
Cantemos que o mundo ainda é criança!
Crianças, nós todos, rumando às paixões
Que o soneto acende... e enceta-se a dança
Que o cria e partilha sem mais concessões!
Vai ficando escuro... do escuro da sala,
Um verso que nasce espontâneo se exala
Das pontas dos dedos, geladas, geladas...
Conversas que passam, mas nada nos cala;
Se um verso nos chama, passemos à fala
Que ao escuro da sala nos trouxe as chamadas.
Maria João Brito de Sousa - 19.12.2017
NOTA - O primeiro verso - entre aspas - é da autoria do poeta Joaquim Sustelo
publicado às 14:29
Maria João Brito de Sousa
SONATINA XII (do livro "Treva Branca")
É bom que eu viva ao léu, pois me acostumo
à solidão que assusta a quem não crê,
pois se de algum receio eu sou mercê,
passeio, canto e ando, rio e fumo.
Num certo dia que virá, presumo,
não tendo amigos nem sequer você,
talvez que eu me lamente, só porque
a sorte não nos pôs no mesmo rumo.
E, se ao chegar a hora em que se apaga
a luz da vida, uma saudade vaga
quiser velar na minha soledade,
ouvidos não darei ao seu alento,
porque saudade é sempre sofrimento
por mais que seja alegre uma saudade.
Alda Pereira Pinto
Brasil
Soneto recolhido no blogue “O Secular Soneto”
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ENCONTRO CASUAL DE DUAS SOLISTAS
Não passeio, nem canto. Escrevo e fumo
enquanto grafo um verso... talvez dois...
outros doze, a jorrar, virão depois
completar-me o soneto em que me assumo
Reflexo de um poema – ou seu resumo... -
nos estilhaços em que o desconstróis,
honesto, firme, não sonhando heróis,
de ti colhendo o fruto. A polpa. O sumo.
Vi-te por mero acaso. Este soneto
foi o ponto de encontro, o mar secreto
onde já de partida eu navegava
Quando te vi passar rebelde, agreste...
Olhei-te fixamente, mas nem deste
por mim, que estranhamente em ti me olhava.
Maria João Brito de Sousa – 14.12.2017 – 09.00h
Portugal
publicado às 09:07
Maria João Brito de Sousa
"Pensando nos secamos e perdemos Esta força selvagem e secreta Esta semente agreste que trazemos E gera heróis, homens e poetas"
Ary dos Santos
Glosa
"Deuses somos nós!"
"Pensando nos secamos e perdemos"
Mas, não pensando, iremos na colecta
Do que outrem, mais astuto, nos prometa
E que, no fundo e sem saber, já temos;
"Esta força selvagem e secreta"
Em que, hora a hora, nos reacendemos
Já que concretamente a concebemos
Abstracta, de aparência, mas concreta,
"Esta semente agreste que trazemos"
Nesta barca de espanto, em seus dois remos,
Na vela que reclama hastes erectas
"E gera heróis,(e) homens e poetas"...
Eis quanto nos define. O que seremos?
Dessa mesma matéria o talharemos!
Maria João Brito de Sousa - 22.06.2017 – 16.48h
In “ERA UMA VEZ UM POETA...
ARY DOS SANTOS, UM POETA ORIGINAL”
Antologia Horizontes da Poesia, 2017, Euedito
publicado às 19:34