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poetaporkedeusker

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UM BLOG SOBRE SONETO CLÁSSICO

Da autoria de Maria João Brito de Sousa, sócia nº 88 da Associação Portuguesa de Poetas, Membro Efectivo da Academia Virtual Sala dos Poetas e Escritores - AVSPE -, Membro da Academia Virtual de Letras (AVL) , autora no Portal CEN, e membro da Associação Desenhando Sonhos, escrito num portátil gentilmente oferecido pelos seus leitores. ...porque os poemas nascem, alimentam-se, crescem, reproduzem-se e (por vezes...) não morrem.
22
Ago22

CONVERSA ENTRE DOIS SONETISTAS

Maria João Brito de Sousa

Varina e pescador (1).jpg

Varina e Pescador, 1918, óleo sobre madeira

de José de Brito (1855–1946). Coleção particular

***

CONVERSA ENTRE DOIS SONETISTAS
*

Coroa de Sonetos
*

Custódio Montes e Mª João Brito de Sousa
*


1.
*

O barco vai ao largo a navegar

Leva dentro os seus sonhos em viagem

Mostra-nos a beleza da paisagem

Que circunda esta praia junto ao mar
*


Espero que ele volte que ao chegar

Vou sondar qual o sonho e a mensagem

Que deixou ou que teve na passagem

Para nele a seguir eu embarcar
*


Hei-de ir onde ele for…à ré me ponho

Sigo a rota que teve no seu sonho

Indo além nessa rota outra vez
*


Para quê? Vou dizer: assim abarco

Os sonhos que na rota teve o barco

E terei esses sonhos eu talvez
*


Custódio Montes

10.8.2022

***

2.
*

"E terei esses sonhos eu talvez",

Ou guardarei os meus noutro porão

Que um bote a remos, feito galeão,

Aguarda nesse porto a sua vez
*


De ir ao mar e voltar, mês após mês,

E há nesse bote a absurda compulsão

De enfrentar e vencer um furacão

Apesar dessa sua pequenez...
*


Quisera eu ir aos remos desse bote

Inda que só glosando alheio mote

E embora alheada e já sem garra
*


Não pudesse movê-lo um metro, não...

Faltam-me, agora, a força e a paixão

E assim não sou formiga... nem cigarra!
*


Mª João Brito de Sousa

20.08.2022 - 12.50h
***

3.
*

“E assim não sou formiga …nem cigarra”

Mas terei meu trabalho a fazer

No barco o meu ego a crescer

Desde o mar largo até chegar à barra
*


Vestido bem de leve, de cimarra,

Na praia a ver o barco aparecer

E à volta nuvens brancas - que prazer-

Ouvindo o som nas cordas da guitarra
*


Areia branca, luz pela chegada

Nos braços que me estende a minha amada

Na hora em que aporto do meu mar
*


Tormentas lá se foram já passaram

Os sonhos que eu tive e que ficaram

Aumentam o meu gosto de a amar
*

Custodio Montes

20.08.2022
***

4.
*

"Aumentam o meu gosto de a amar"

Enquanto eu me procuro em desespero

Que já mal sei quem sou ou o que quero

Da bela barca em que me faço ao mar...
*


Não estou dorida mas prefiro estar

Bem mais magoada mantendo o meu esmero

A estar assim sem dor, nem destempero,

Nem Musa que me valha onde eu falhar...
*


Entro e saio da Barca, feita tonta

E nestas voltas nunca mais `tou pronta

Pra me fazer ao mar que em mim havia:
*


Não sei onde perdi os velhos remos,

Nem onde fica o mar que ambos sabemos

Que à Musa e só à Musa pertencia...
*


Mª João Brito de Sousa

20.08.2022 - 16.19h
***
5.
*

“Que à musa e só à musa pertencia”

Mas que eu igualmente procurava

Para ver se lá dentro encontrava

O sonho que a pensar tanto queria
*


Então ondas saltei que o mar fazia

E no redemoinho que ondulava

A musa para mim de lá olhava

Fiquei cheio de amor e de alegria
*


E disse: musa amiga, anda cá

Inspira-me, agora, anda lá

Permite que eu acabe só mais esta
*


Modesta poesia que eu prometo

Que quando acabar este soneto

Descansas porque eu tenho uma festa
*

Custódio Montes

20.8.2022
***

6.
*

"Descansas porque eu tenho uma festa"

Maior que qualquer outra que conheças,

Que acaba exactamente onde começas

E só se esgota quando nada resta
*


Das mil e uma coisas que lhe empresta

Esta (ir)realidade em que tropeças

Quando nós duas andamos a meças

Enquanto equilibradas numa aresta...
*


Sendo eu um pouco tu, tu serás eu,

Trarás contigo um pouco do que é meu

E, vice-versa, também de teu trago
*


Este dom de escrever como quem canta,

De tecer mantos, de "pintar a manta"

E de compor soneto em verso mago.
*

 

Mª João Brito de Sousa

20.08.2022 - 20.35h
***

7.
*

“E de compor soneto em verso mago”

Que encanta a ave rara que esvoaça

E que admirada olha e com graça

Enquanto esse poema aqui eu trago
*


A seca transformou quase em lago

Esta grande albufeira de água escassa

Que era a inspiração de quem cá passa

E agora trouxe à musa grande estrago
*


O barco passa lento e até encalha

Mas lá se vai remando e não me falha

O remo que me ajuda até à foz
*


A festa terminou e vou dormir

Ao acordar então hei-de aqui vir

Para que este soneto ganhe voz
*

Custódio Montes

21.8.2022
***

8.
*

"Para que este soneto ganhe voz"

E a Musa não se vá de novo embora

Também a minha voz lhe empresto agora,

Voz que foi feiticeira, há tempo, em Oz
*


E que agora se foi, deixando a sós

Aquela em que morou, mas já não mora...

Tentei reinventá-la na demora,

Mas não me resta dela mais que uns pós...
*


Contudo, a Barca espera e faz-se tarde

E eu que nunca fora assim, cobarde,

Salto para o convés, pego nos remos
*


E consigo avançar um palmo ou dois...

O resto ficará para depois

Que, por ora, isto é tudo quanto temos.
*

 

Mª João Brito de Sousa

21.08.2022 - 11.35h

***
9.
*

“Que, por ora, isto é tudo quanto temos”

E muito é o que leva já o bote

Com ricas prendas idas no seu lote

E outras que hão-de ir pelo que lemos
*

A musa por lá anda que bem vemos

Só quem não queira ver e que não note

Poemas com beleza e alto dote

É que em vez de ver musa vê somenos
*


O barco ao fazer esta viagem

Voltará com mais força e coragem

E ao chegar ao cais volta a partir
*


Com estes viajantes sem ter medo

O seu percurso encanta por tão ledo

E vai querer andar a ir e vir
*

Custódio Montes

21.8.2022
***

10.
*

"E vai querer andar a ir e vir"

Que é esse o seu destino, a sua sorte,

Que ora rumando a Sul, ora pra Norte

Levará no porão quanto eu sentir
*


Menos do que isto não lhe irei pedir

E ainda que sem Musa menos forte,

Eu própria me encarrego do transporte

De alguns dos versos prontos pra florir
*


A Barca avança agora livremente,

Sem grande esforço, ao sabor da corrente,

Quase como se a Musa fosse ao leme
*


E, no entanto, a Musa continua

Escondida em parte incerta, muda e crua:

A ninguém obedece e a nada teme.
*


Mª João Brito de Sousa

21.08.2022 - 15.00h
***

11.
*

“A ninguém obedece e nada teme”

Isso é porque ninguém lhe mete medo

Mas talvez alguém saiba um segredo

Para a obrigar mesmo a ir ao leme
*


E digo mais, talvez ela até reme

Se se vir envolvida num enredo

Que a faça ver perigo que bem cedo

Lançará mão ao remo em caso extreme
*


Não pode ela fazer só o que quer

Tem que dar ao poeta o que fazer

E perder esse jeito, essa mania
*


A musa para ter nossa atenção

Tem que nos dar a força, a inspiração

Porque sem musa acaba a poesia
*

Custódio Montes

21.8.2022
***

12.
*

 

"Porque sem musa acaba a poesia"

E sem ela decerto morrerei,

Terei de impor à Musa a minha lei

Se não quiser morrer triste e vazia...
*


Ela é, porém, rebelde e tão vadia

Que juro que não posso - ou que não sei -

Mantê-la no cantinho onde a guardei

Ao dar-lhe o coração por garantia
*


Sei que ela existe e que é parte de mim,

Que vai viver comigo até ao fim,

Mas que só faz aquilo que ela quer
*


E se o resto de mim estiver doente

Ela se afasta triste e descontente

Pra mostrar que deixou de em mim caber.
*

 

Mª João Brito de Sousa

21.08.2022 - 22.13h
***

13.
*

“Pra mostrar que deixou de em mim caber”

E abandona o meu barco a navegar

Sem sonhos em que possa divagar

Nem sequer os do barco conhecer
*


Ó musa não me traias, anda ver

Os segredos que andam neste mar

Vem comigo, anda lá, vamos zarpar

Sobre as ondas para sonhos poder ter
*


Eu e tu muita coisa realizamos

Abraçados enquanto navegamos

E vais ver que escolhemos lindo tema
*


Tu inspiras-me a mim e eu escrevo

Uma coisa bem linda e de relevo

Eu e tu só nós dois e um poema
*


Custódio Montes

22.8.2022
***

14.
*

 

"Eu e tu só nós dois e um poema"

Pra que o naufrágio seja protelado

E deixe o barco de estar encalhado

Na mais deserta praia do fonema
*


Que o teu barco de versos jamais tema

A vastidão de um mar nunca explorado

Porquanto navegá-lo é o seu fado,

E num fado não cabe um só dilema
*


Vá, barco, faz-te ao mar tempestuoso:

Não temas o Inverno rigoroso,

Nem o mais forte vento que soprar!
*


Isto lhe digo, prevendo a recusa

Mas, a dado momento, diz-me a Musa:

"O barco vai ao largo a navegar"!
*

 

Mª João Brito de Sousa

22.08.2022 - 10.40h
***

 

Imagem - Trabalho de meu bisavô, José de Brito, retirado do blogue A Matéria do Tempo

 

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