GLOSANDO JORGE DE SENA
INDEPENDÊNCIA
Recuso-me a aceitar o que me derem.
Recuso-me às verdades acabadas;
recuso-me, também, às que tiverem
pousadas no sem-fim as sete espadas.
Recuso-me às espadas que não ferem
e às que ferem por não serem dadas.
Recuso-me aos eus-próprios que vierem
e às almas que já foram conquistadas.
Recuso-me a estar lúcido ou comprado
e a estar sozinho ou estar acompanhado.
Recuso-me a morrer. Recuso a vida.
Recuso-me à inocência e ao pecado
como a ser livre ou ser predestinado.
Recuso tudo, ó Terra dividida!
Jorge de Sena, in 'Coroa da Terra'
... OU MORTE.
"Recuso-me a aceitar o que me derem",
Enquanto o não pagar. E pago foi
Por estas mãos que quase nada auferem
Deste trabalho infindo que as corrói.
"Recuso-me às espadas que não ferem"
E à forja em que uma espada se constrói,
Pois, de todos os gumes que me esperem,
Há-de ser sempre o meu que mais me dói.
"Recuso-me a estar lúcido ou comprado"
E recuso-me a ser manipulado
Pelas razões de outra razão qualquer.
"Recuso-me à inocência e ao pecado"
E a viver sorrindo conformado,
Porque aceitá-lo obriga-me a morrer!
Maria João Brito de Sousa - 02.02.201 - 08.23h