GLOSANDO FLORBELA ESPANCA (16)
DESEJOS VÃOS
Eu qu’ria ser o Mar d’altivo porte
Que ri e canta, a vastidão imensa!
Eu qu’ria ser a pedra que não pensa,
A Pedra do caminho, rude e forte!
Eu qu’ria ser o Sol, a luz intensa,
O bem do que é humilde e não tem sorte!
Eu qu’ria ser a árvore tosca e densa
Que ri do mundo vão e até da morte!
Mas o Mar também chora de tristeza...
As Árvores também, como quem reza,
Abrem, aos Céus, os braços, como um crente!
E o Sol altivo e forte, ao fim dum dia,
Tem lágrimas de sangue na agonia!
E as Pedras... essas... pisa-as toda a gente!..
Florbela Espanca, in "Livro de Mágoas"
REFLEXÕES...
"Eu queria ser o Mar d`altivo porte",
Sentir-me a flutuar na vaga imensa
Que se ergue prepotente, irada, tensa,
Pr`a desfazer-se em espuma, num desnorte...
"Eu queria ser o Sol, a luz intensa",
O brilho luminoso, o raio forte
Que, aceso, nos aquece e recompensa,
Mas nos foge a seguir, tal como a sorte...
"Mas o Mar também chora de tristeza",
Desfaz-se a vaga em espuma e, sem surpresa,
Rende-se à noite escura o astro ardente
"E o Sol altivo e forte, ao fim dum dia",
Vai concedendo à Lua a primazia
De um brilhozinho suave e transparente...
Maria João Brito de Sousa - 09.02.2016 - 14.27h