Maria João Brito de Sousa
Peço-te mil perdões por ter-te amado,
Porque te amei demais... Eu, a Poeta,
Pintei-te de outra cor, quis-te paleta,
Quis-te só para mim, quis-te encantado...
Amar-te tanto assim foi sempre errado.
Tornei-te meio-ser, alma incompleta,
Tentando ir caminhando em linha recta
Num círculo perfeito e pré- traçado...
Amei-te em cada gota do meu sangue,
Amei-te até morrer, caindo exangue;
Amei-te além de mim. Tão mais além...
Gravei na dimensão dos meus sentidos
Um ideal de humanos desmentidos
Que nos foi condenando. A nós, também...
Maria João Brito de Sousa - 2008
Imagem retirada da internet
publicado às 12:16
Maria João Brito de Sousa
A MULHER INTERROMPIDA II
Subitamente carne, eu aterrei
Neste planeta incerto, e quis viver!
Neste acto (in)voluntário de nascer
Trouxe comigo o mar que, um dia, herdei.
Subitamente vida, eu comecei
A pesquisar o mundo, a qu´rer saber...
Vivi-me por inteiro até morrer
E, sem saber porquê, depois voltei.
Sem sair deste espaço, o que eu andei!
As mil e uma voltas que não dei,
As mil e uma coisas que não vi!
Há quantos mil milénios eu me sei
Nas vezes que morri, nas que acordei
Sobre o estranho planeta em que nasci...
Maria João Brito de Sousa - 27.08.2008 - 13.03h
Imagem retirada do site www.sabercultural.com
NOTA DE RODAPÉ - Este soneto classifica-se entre os "poemas de
rima pobre", pois todos os versos terminam
em palavras da mesma categoria gramatical.
Neste caso específico são Pretéritos Perfeitos
de verbos. Em poesia a classificação "rima pobre" não tem
uma conotação negativa. É apenas uma
classificação como outra qualquer, sem valor qualitativo.
publicado às 13:03
Maria João Brito de Sousa
Meu estranho, independente, ousado Ego,
Os mundos que me impões são sem fronteiras!
Incitas-me, nas horas derradeiras,
A viagens sem fim que nunca nego!
Meu Ego em mil constantes mutações,
Mantendo, em mim, perfeita unicidade,
A rir das rédeas presas da vontade,
Alheio às mais prementes tentações...
Cósmico Ego, disperso em coisas tantas,
Que todo-poderoso me comandas
Ignorando esta humana imposição!
Meu Ego (esse indif`rente ao que eu consigo...),
Nem sei se complemento ou inimigo
Da minha natural preservação...
Imagem - "Os Guardadores de Luas"
Óleo sobre Tela, 100x60cm
Maria João Brito de Sousa, 2006
publicado às 13:32
Maria João Brito de Sousa
Não me quero da cor que em mim pintais!
Só me quero da cor que o mar me pinta
Numa paleta mágica de tinta
Nestas horas azuis e matinais!
Não me vejo na cor com que me olhais!
Só me vejo na cor em que me sinta
Nos cambiantes de azul que o mar consinta
Em "dégradés" perfeitos, casuais...
Na paleta do mar é que me espelho
(e nela me revejo e me aconselho...)
Nos cinzentos-azuis de um sol nascente...
O mar é quem me pinta e nele me encontro
E renasço da cor desse confronto
Entre esse azul marinho e toda a gente!
Escrito no comboio, hoje, às 7.00h
Imagem retirada da internet
publicado às 13:16
Maria João Brito de Sousa
Era um estranho torpor feito de nada
Que lhe invadia o ser ao sol-poente
E ali ficava, amorfo, alheio, ausente,
Da alma quase doente, de alquebrada...
Depois nascia a Lua. À hora errada
Brotava-lhe a palavra, o verbo urgente
E punha-se a plantar (verso ou semente?)
No suporte irreal da madrugada...
Vestia uma "casaca de cometas"
E percorria a casa, qual fantasma,
C`o olhar apontado ao infinito...
No seu mundo de ideias inconcretas,
Ele era omnipotente. Ó mundo, pasma!
Partiu-se (e não partiu!), esse proscrito...
Ao Poeta António de Sousa
Imagem - Fotografia do Poeta aos 16 anos.
publicado às 12:35
Maria João Brito de Sousa
I
... e que me importa a mim perder-me em vida
Se à morte irei legar meu estranho encanto?
Já nada mais me importa e, no entanto,
Vou adiando a hora da partida...
... e que me importa a mim morrer agora
Se, depois, tanto fez muito viver?
Pouco ou nada me importa! Eu quero é SER
Enquanto não chegar a minha hora...
Patéticos, alguns, `inda acreditam
Que tempo é quantidade e não hesitam
Em procurar na carne o imortal...
Não sabem que de nós só fica o traço
Porque o mundo é pequeno e não tem espaço
Para, de nós, guardar quanto é real...
II
Ó mundo, o que te impede de chorar?
Que estranha submissão te cala o pranto
E te condena, assim, ao desencanto
Desse grito que tentas silenciar?
Ó mundo, se amanhã eu acordar
E não estiver quebrado o mudo encanto,
Hei-de gritar por ti! Gritarei tanto
Que medo algum me há-de fazer calar!
Ó meu pequeno mundo maltratado
No silêncio a que foste condenado
Por alguma razão que desconheço!
Ó meu pequeno mundo estrangulado,
O teu imenso grito sufocado
É tudo quanto, à vida, agora peço...
Imagem retirada da Internet
publicado às 11:30
Maria João Brito de Sousa
No Palácio das Vozes Dissidentes
Entoam-se cantigas. Batem palmas
Os fantasmas de outrora, cujas almas
Esvoaçam em sentidos bem dif`rentes
E das crispadas mãos, em alvoroço,
Soltam-se sons distintos e primários
Enquanto sob o fumo de incensários,
Em torno do Palácio se abre um fosso...
Neste palco se trava a velha guerra
Entre o Bem e o Mal sobre esta Terra,
Num ritual constante, interminável;
No espaço se confrontam Vida e Morte,
Se escolhe ou redefine a nossa sorte...
(o palco é bem real, embora instável...)
Imagem retirada da Internet
publicado às 12:05
Maria João Brito de Sousa
Um poente debrua a ferro e fogo
A linha horizontal do fim do mar
E retoma um percurso milenar
Pois pára de o bordar e volta logo.
A sua condição, que não revogo,
Impõe-me uma cadência pendular;
Deste lado, onde o Sol vem pernoitar,
Preguiça o mar imenso em que me afogo,
Do outro, aonde o Sol vai renascer,
Surge uma luz difusa, num crescendo,
Ressuscitam palavras entre os vivos
E recomeça a vida em cada ser...
Quanto a mim, que só disso vou vivendo,
Coube-me descrevê-lo, entre adjectivos...
Fotografia tirada por mim a uma flor de bananeira
publicado às 13:39