Maria João Brito de Sousa
FANTASIA, SONHOS E BRINQUEDOS
Há fantasia, sonhos e brinquedos
Fundidos com amor e esperança
Alegria aventuras e segredos
Nos olhos inocentes da criança
E quando chora e grita com os medos
Nos seus olhos há gotas numa dança
Translúcida, que brotam quais torpedos
Até sentir de novo ar de bonança
Se na água do rio se vê espelhada
Tem nos olhos uma estrela desenhada
Que cintila nos risos que declama
Como sendo poemas, esses risos
Mágicos, que se fazem de improvisos
Quando os seus olhos vêm quem ama
MEA
1/06/2017
A CURIOSIDADE INFANTIL
"Há fantasia, sonhos e brinquedos"
E essa curiosidade natural
Que, ao fervilhar nas pontas dos seus dedos,
Desvenda do complexo ao mais banal
"E quando chora e grita com os medos",
São esses choros coisa ocasional,
Porque logo se apagam nos folguedos
Que engendra pela casa, ou no quintal...
"Se na água do rio se vê espelhada",
Sobre ela se debruça extasiada,
Fantasiando sobre o que ali viu...
"Como sendo poemas, esses risos",
São seus? Serão reflexos imprecisos?
Foi ela ou foi a água quem sorriu?
Maria João Brito de Sousa -02.06.2016 - 10.36h
publicado às 10:50
Maria João Brito de Sousa
PERDI-ME
Perdi-me nos abraços da saudade
Nos passos que me esquecem no caminho
Na escuridão que ensombra de verdade
O que restou do lar que era meu ninho...
Perdi-me nesta noite de ansiedade
Neste tempo desfeito, tão sozinho...
Sentindo a cada passo a realidade
Deste meu mundo triste...que adivinho.
Mas tento inda encontrar essa vontade
De vencer a tristeza que me invade
E luto no final do meu caminho...
Perdi-me nos abraços da saudade
Nesta triste e cruel realidade
Sentindo que por vezes já definho...
Helena Fragoso
ULTRAPASSAGEM
“Perdi-me nos abraços da saudade”,
Mas mesmo que a saudade me faltasse,
Ter-me-ia bastado a liberdade
Pedir-me que fosse eu quem a abraçasse…
“Perdi-me nesta noite de ansiedade”
E embora em minha cama pernoitasse,
Sonhei ser uma escrava que se evade
Das masmorras de fel que outrem criasse…
“Mas tento inda encontrar essa vontade”;
Onde hoje encontro só contrariedade,
Enfrento, dia e noite, o mesmo impasse…
“Perdi-me nos abraços da saudade”
Mas sobra-me esta dura realidade
E a esp`rança de que um sonho me ultrapasse.
Maria João Brito de Sousa – 25.05.2017 – 09.34h
publicado às 12:15
Maria João Brito de Sousa
QUANDO A NOITE CHEGA
Serenamente a noite chega e traz
Um bailado com fitas de luar
Num brando musical que se perfaz
Nos sonhos que se formam num olhar
Se uma sombra dançante, satisfaz
Fantasias que crescem no lugar
Onde o som do silêncio é capaz
De num abraço quente vir beijar
Os lábios que trauteiam as canções
Ao ritmo do bater dos corações
Quando sonho visita o pensamento
E junto com as estrelas e o luar
Há um conjugar perfeito um embalar
Que leva a viajar plo firmamento
MEA
9/05/2017
FINITUDES
“Serenamente a noite chega e traz”
Um pouco de descanso ao torturado
Corpo que já não busca senão paz,
Quando da própria paz se vê privado.
“Se uma sombra dançante o satisfaz”
E devaneia um tanto alucinado,
Será só porque a dor não foi capaz
De lhe apagar um sonho antes sonhado.
“Os lábios que trauteiam as canções”,
Cerram-se agora em estranhas contorções,
Que a dor que quer esquecer não foi vencida
“E junto com as estrelas e o luar”,
Está a dor, sempre pronta pr`a lembrar
Que os sonhos também morrem, como a vida.
Maria João Brito de Sousa – 18.05.2017 – 10.08h
publicado às 10:18
Maria João Brito de Sousa
EU E AS PALAVRAS
Juntos , tu, eu e as palavras, Vamos pela vida lado a lado, Tentando esquecer o que é passado, Para ter o futuro que ambicionava.
A palavra é a minha companhia, Nos melhores momentos e nos maus, Quando a minha vida está um caos, Busco na palavra a energia.
Às vezes não encontro o que dizer, E por essa razão eu fico triste, E sinto que por dentro estou vazia.
Mas quando começo a escrever, Vejo que a Paixão ainda existe, E volta de novo a alegria.
Maria Idalina Pata
29-03-2017
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O MEU CANTIL DE PALAVRAS
"Juntos, tu, eu e as palavras",
Escrevemos tudo aquilo que entendermos
Desde que essas palavras sejam termos
Concretos e leais, nas suas lavras...
"A palavra é a minha companhia",
Minha raiz, meu fruto e meu sustento;
Dela me nasce um caule, inda rebento,
Que cresce noite a noite e dia a dia...
"Às vezes não encontro o que dizer"
Porque a palavra tarda em renascer
Quando a vida me lança em campo hostil,
"Mas quando (re)começo a escrever",
Cada palavra, diga o que disser,
Enche de esp`rança e seiva o meu cantil...
Maria João Brito de Sousa - 31.03.2017 - 09.58h
publicado às 12:23
Maria João Brito de Sousa
COLHEITA
Surge o coro dos pássaros cantores
na catedral pagã da mataria.
O milho ruivo e os pomos tentadores
cobrem a terra pródiga e sadia.
É o tempo da colheita. Os segadores
remoçam, cantam, choram de alegria.
Como prêmio ao suor dos lavradores,
não vai faltar o pão de cada dia.
Garças esbeltas, de alva formosura,
passeiam pelo campo aquela alvura
que põe, no verde, branquidões bizarras.
E o coqueiro se curva, satisfeito,
porque ainda vibra, dentro do seu peito,
o zunido estridente das cigarras...
Vasco de Castro Lima
In osecularsoneto.blogspot.pt
COLHEITAS,,,
"Surge o coro dos pássaros cantores"
E eu páro de cantar, que é já cumprida
A função de aliar-me aos produtores
Das mais belas colheitas desta vida.
"O tempo é de colheita. Os segadores"
Empunham, com mão forte e decidida,
As foices e, esquecendo algumas dores,
Empenham corpo e alma na corrida.
"Garças esbeltas de alva formosura"
Vão-nos sobrevoando a grande altura,
Um mesmo sol dourado os abençoa
"E o coqueiro se curva, satisfeito,"
Completando um cenário tão perfeito
Que nos lembra uma tela de Malhoa...
Maria João Brito de Sousa - 30.03.2017 - 12.39h
publicado às 12:47
Maria João Brito de Sousa
JÁ FOSTE RICO E FORTE E SOBERANO
Já foste rico e forte e soberano, Já deste leis a mundos e nações, Heróico Portugal, que o gram Camões Cantou, como o não pôde um ser humano! Zombando do furor do mar insano, Os teus nautas, em fracos galeões, Descobriram longínquas regiões, Perdidas na amplidão do vasto oceano. Hoje vejo-te triste e abatido, E quem sabe se choras, ou então, Relembras com saudade o tempo ido? Mas a queda fatal não temas, não. Porque o teu povo, outrora tão temido, Ainda tem ardor no coração. Saúl Dias, in "Dispersos (Primeiros Poemas)"
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DEPOIS DE CADA NOVA PROVAÇÃO
"Já foste rico e forte e soberano,"
Cruzando o mar remoto dos mil medos,
Das ondas, dos abismos, dos rochedos
Que a tantos provocaram tanto dano.
"Zombando do furor do mar insano",
Tentaste ir desvendando os seus segredos
E, conseguiste, embora os mil degredos,
Conhecê-los melhor, ano após ano.
"Hoje vejo-te triste e abatido",
Como se toda a gesta o fosse em vão
E vão te fosse o tanto já cumprido,
"Mas a queda fatal não temas, não"!
Erguer-te-ás mais forte e aguerrido
Depois de cada nova provação!
Maria João Brito de Sousa - 26.03.2017 -18.59h
NOTA - Sául Dias é o pseudónimo literário de Júlio Maria dos Reis Pereira, irmão de José Régio.
O nome que usou enquanto artista plástico foi Julio.
publicado às 22:18
Maria João Brito de Sousa
O SEU NOME
Ela não sabe a luz suave e pura Que derrama numa alma acostumada A não ver nunca a luz da madrugada Vir raiando, senão com amargura! Não sabe a avidez com que a procura Ver esta vista, de chorar cansada, A ela... única nuvem prateada, Única estrela desta noite escura! E mil anos que leve a Providência A dar-me este degredo por cumprido, Por acabada já tão longa ausência, Ainda nesse instante apetecido Será meu pensamento essa existência... E o seu nome, o meu último gemido.
João de Deus
(Campo de Flores, 1893) In Poemas Portugueses Antologia da Poesia Portuguesa do Séc. XIII ao Séc. XXI, Porto Editora
INOCÊNCIA(S)
"Ela não sabe a luz suave e pura"
Que um soneto lhe acende, ao desfolhar-se
E não pode, portanto, recordar-se
De jamais ter provado essa doçura,
"Não sabe a avidez com que a procura"
Da pura melodia, ao ter-se, ao dar-se,
Lhe traria a certeza de encontrar-se
A fundo, até ao ponto de ruptura,
"E mil anos que leve a Providência"
A apontar-lhe o caminho, é bem sabido
Que, enchendo-se de pressa e de impaciência
"Ainda nesse instante apetecido",
Nunca o encontrará. Pura inocência
Julgar, por puro azar, tê-lo perdido...
Maria João Brito de Sousa - 11.03.2017 - 15.43h
publicado às 15:41
Maria João Brito de Sousa
TRISTÊZA
O sol do outomno, as folhas a cair, A minha voz baixinho soluçando, Os meus olhos, em lagrimas, beijando A terra, e o meu espirito a sorrir... Eis como a minha vida vae passando Em frente ao seu Phantasma... E fico a ouvir Silencios da minh'alma e o resurgir De mortos que me fôram sepultando... E fico mudo, extatico, parado E quasi sem sentidos, mergulhado Na minha viva e funda intimidade... Só a longinqua estrela em mim actua... Sou rocha harmoniosa á luz da lua, Petreficada esphinge de saudade... Teixeira de Pascoaes, in 'Elegias'
(Foi respeitada a grafia original)
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ROTA
"O sol do outomno, as folhas a cair"
Dos ramos açoitados, baloiçando,
Porque o vento implacável vai soprando
E antecipando o frio que irei sentir,
"Eis como a minha vida vae passando"
E como, apesar disso, hei-de cumprir,
Enquanto esta vontade o consentir,
Os dias que essa vida me for dando...
"E fico mudo, extatico, parado"
À espera, sem saber se é já chegado
O instante derradeiro, o da partida;
"Só a longínqua estrela em mim actua",
Iluminando a Barca que flutua
Ao sabor das marés da minha vida...
Maria João Brito de Sousa - 01.03.2017 -12.58h
Retrato de Teixeira de Pascoaes, Columbano Bordalo Pinheiro
publicado às 12:09
Maria João Brito de Sousa
UM POUCO DE PRIMAVERA
Naquela verde relva do jardim
Há salpicos de vida já brotando
Com a brancura fresca do cetim
São mesa posta a pássaros em bando
Que saltitam por ela em frenesim
Ora ali voando ora debicando
Num bailado de voos sem ter fim
E em alegres chilreios vão rimando
Versos em que prometem Primavera
Em abraços voados pla atmosfera
Que nas manhãs de sol pintam no espaço
E expressam melodia tão fremente
Com destreza singela e inocente
Mudando a cada instante seu compasso
MEA
21/02/2017
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MÁTRIA
"Naquela relva verde do jardim",
Expressando a vida em cor, rejubilantes,
Há vidas que parecem não ter fim,
Que renascem tão vivas quanto dantes,
"Que saltitam por ela em frenesim"
Contrariando os mais recalcitrantes,
Pois Vida, ao renascer, renasce assim,
Em ciclos pré-datados e constantes...
"Versos em que prometem Primavera",
Toda a Vida os compõe, vindos da espera
Que precede as razões de cada dia
"E expressam melodia tão fremente",
Que nada, nem ninguém, nega ou desmente
Que seja, a Vida, a mãe dessa harmonia!
Maria João Brito de Sousa - 23.02.2017 - 09.40h
publicado às 10:17
Maria João Brito de Sousa
O BURRO
Vai ele a trote, pelo chão da serra,
Com a vista espantada e penetrante,
E ninguém nota em seu marchar volante,
A estupidez que este animal encerra.
Muitas vezes, manhoso, ele se emperra,
Sem dar uma passada para diante,
Outras vezes, pinota, revoltante,
E sacode o seu dono sobre a terra.
Mas contudo! Este bruto sem noção,
Que é capaz de fazer uma traição,
A quem quer que lhe venha na defesa,
É mais manso e tem mais inteligência
Do que o sábio que trata de ciência
E não crê no Senhor da Natureza.
Patativa do Assaré (1909-2002)
In "O Secular Soneto"
(osecularsoneto.blogsot.pt)
BURRO(S)
"Vai ele a trote, pelo chão da serra,"
Carregando no lombo a carga alheia,
Porque burro de carga não coxeia,
Nem quando em sujo lodo um casco enterra.
"Muitas vezes, manhoso, ele se emperra"
Causando ao dono enorme cefaleia,
Quando, na hora de voltar à aldeia,
Entenda ser demais quanto carrega...
"Mas contudo! Este bruto sem noção"
De que quem ganha a teima é o patrão
Que à chicotada o quebra, tarde ou cedo,
"É mais manso e tem mais inteligência"
Do que muito "finório" de aparência
Que nunca diz que não porque tem medo.
Maria João Brito de Sousa - 02.02.2017 -15.19h
publicado às 12:00
Maria João Brito de Sousa
INDEPENDÊNCIA
Recuso-me a aceitar o que me derem. Recuso-me às verdades acabadas; recuso-me, também, às que tiverem pousadas no sem-fim as sete espadas. Recuso-me às espadas que não ferem e às que ferem por não serem dadas. Recuso-me aos eus-próprios que vierem e às almas que já foram conquistadas. Recuso-me a estar lúcido ou comprado e a estar sozinho ou estar acompanhado. Recuso-me a morrer. Recuso a vida. Recuso-me à inocência e ao pecado como a ser livre ou ser predestinado. Recuso tudo, ó Terra dividida! Jorge de Sena, in 'Coroa da Terra'
... OU MORTE.
"Recuso-me a aceitar o que me derem",
Enquanto o não pagar. E pago foi
Por estas mãos que quase nada auferem
Deste trabalho infindo que as corrói.
"Recuso-me às espadas que não ferem"
E à forja em que uma espada se constrói,
Pois, de todos os gumes que me esperem,
Há-de ser sempre o meu que mais me dói.
"Recuso-me a estar lúcido ou comprado"
E recuso-me a ser manipulado
Pelas razões de outra razão qualquer.
"Recuso-me à inocência e ao pecado"
E a viver sorrindo conformado,
Porque aceitá-lo obriga-me a morrer!
Maria João Brito de Sousa - 02.02.201 - 08.23h
publicado às 12:00
Maria João Brito de Sousa
FERMOSO TEJO MEU...
Fermoso Tejo meu, quão diferente
te vejo e vi, me vês agora e viste:
turvo te vejo a ti, tu a mim triste,
claro te vi eu já, tu a mim contente.
A ti foi-te trocando a grossa enchente
a quem teu largo campo não resiste;
a mim trocou-me a vista, em que consiste
o meu viver contente ou descontente.
Já que somos no mal participantes,
sejamo-lo no bem. Ó quem me dera
que fôramos em tudo semelhantes!
Mas lá virá a fresca primavera:
tu tornarás a ser quem eras d'antes,
eu não sei se serei quem d'antes era.
Francisco Rodrigues Lobo - 1580/1622
(Apud Carolina Michaëlis de Vasconcellos, "As Cem
Melhores Poesias Líricas da Língua Portuguesa"—
Londres, 1910).
Nota - Soneto e dados bibliográficos retirados do blogue "O Secular Soneto"
ROUBANDO UM BEIJO AO TEJO
"Fermoso Tejo meu, quão diferente"
me pareces do rio que outrora amei;
vejo-te tão distante que nem sei
se deste estranho amor ficaste ausente...
"A ti foi-te trocando a grossa enchente",
a mim foi-me moldando o mar que ousei,
o sonho feito barca em que embarquei
e a minha rebeldia impenitente...
"Já que somos no mal participantes"
e havendo um mesmo mar à nossa espera,
saibamos, tu e eu, ser bons amantes...
"Mas lá virá a fresca primavera :"
tornar-te-ás mais brando, eu, mais severa,
e um beijo não nos rouba mais que instantes...
Maria João Brito de Sousa - 29.01.2017 - 11.08h
publicado às 11:53