QUE ESTRANHA LOUCURA A MINHA V, VI E VII
À PORTA DO ESPELHO
Precisamente um sonho! Um sonho só
E um dom ou uma dádiva - sinónimos...
Dispersa-me em milhões (serão het`rónimos?)
E abraça-se a mim fechando o nó.
Precisamente e só um sonho louco,
Que me enlaça, me prende e me seduz,
Aceso em mim... e tudo se reduz
Ao muito que sei ter, tendo tão pouco...
Nesta abundância vivo e comunico
E tenho muito mais do que o mais rico
Porque vivo do amor que tudo tem...
Aqui, nesta loucura abençoada,
Percorro, neste mundo, a minha estrada
Por dentro de mim mesma e sem ninguém...
A EXULTAÇÃO DO ESPELHO
Eu ergo-me do chão, meu velho amor!
Da força deste meu eterno abraço
À doce solidão na qual me enlaço
E reinvento a vida em nova cor...
Sou árvore caída que se ergueu,
Que germinou da pedra e estendeu ramos
E vou continuar (todos nós vamos...)
Por onde me levar um sonho: - O meu!
Sou palimpsesto deste humano fruto,
Sou êxtase da vida e sou produto
De quantos ideais o mundo oculta.
Sou eco da palavra e sou reflexo
Do espelho que devolve o meu amplexo:
- Selvagem, louca, louca... (o espelho exulta!)
A ACEITAÇÃO DA LUA
A aceitação da lua é paradigma,
É este anoitecer na vertical
Cumprindo o seu sereno ritual
Na estranha condição de ser enigma.
A aceitação da lua em seu abraço
É bênção, oração, serenidade,
É este alheamento da vontade
Na absurda languidez em que me traço.
Eu, loucamente lua, mas serena,
Solene comunhão da minha pena
Com essa luz de leite, branca e pura.
Eu sei que a lua-mãe comanda a vida,
A hora da chegada, a da partida,
A própria aceitação desta loucura...
Imagem - "Fio de Prumo", Aguarela e Pena
Maria João Brito de Sousa, 2002