TROVAS À TROIKA
Olho este povo cansado
De ver a vida a passar,
De viver das aparências
Na mais dura das carências
A que o vão fazer chegar
Para o terem bem calado…
Meu povo tão criativo
De poetas e cantores,
Gente com caule e raiz
Que nunca será feliz
Nas mãos dessoutros senhores
Que o querem manter cativo
Vejo a gente nas canseiras
Das noites sobressaltadas
Pelos dias sempre incertos
E nos olhos, muito abertos,
Mil perguntas formuladas
De mil e uma maneiras…
Ah, povo, se fores dormir
E eles tentarem sufocar
O cravo que tens no peito
Ao roubarem-te o direito
De viver, de trabalhar
E, até mesmo, de sentir…
Oiço a gente que murmura,
Que duvida e quer respostas,
Que não consegue entender
Porque é que há-de acontecer
Que as regras sejam impostas
Como eram na ditadura
Povo de garra, com garras,
Que rosna sob um chicote
Que a muitos soube calar
Mas que recusa aceitar
As loucuras de um Quixote
Que nunca vestiu samarra!
Não cales, povo que sofres,
A tua revolta imposta
Por amos que não quiseste!
Mostra-te indómito, agreste,
Diz que Portugal não gosta
Que disponham dos seus cofres
Ou da força dos seus braços
Cansados de não saber
Se, amanhã terão trabalho,
Se lhes fica, ou não, retalho
Do que puderem colher,
Do fruto dos seus cansaços!
[este povo inda tem garra
pr` a derrubar os chicotes
que o tentarem subjugar
e recusa-se a aceitar
ordens vindas de Quixotes
sem burrico e sem samarra!]
Maria João Brito de Sousa