Maria João Brito de Sousa
Coroa de Sonetos
*
M* João Brito de Sousa e Custódio Montes *
FOSSE EU SILENE... *
1. *
Fosse eu Silene e dar-vos-ia o céu
Em troca das palavras que tecestes,
Mas sou mulher, mortal de humanas vestes
Que nada, mesmo nada tem de seu *
Porém, vosso soneto me acendeu
As cinzas apagadas... Que fizestes?
Que chamas invisíveis acendestes
Pra que delas nascesse um verso meu? *
Terei de retirar-me. Perdoai
Mas sinto que a palavra se me esvai
Como uma vela gasta ou posta ao vento *
Já vão esfriando as cinzas apagadas
E agora temo só ter escrito uns nadas
Sem brilho, sem cadência e sem talento. *
Mª João Brito de Sousa
15.03.2024
***
2. *
“Sem brilho, sem cadência e sem talento”
Escrevo cada vez mais devagar
Que falta a professora a ensinar
E o ritmo é por isso bem mais lento *
Mas mesmo assim escrevo e lá tento
Seguir o que aprendi e meditar
Afim de ter a guia a acompanhar
Lançando poemas meus ao ar, ao vento *
E ouvindo a minha mestra no poema
Lá vou concluindo eu o teorema
Na lógica que ouvi nesse passado *
Arguta, desenvolta e com mestria
Maria João é toda poesia
E volta a ensinar-me….obrigado! *
Custódio Montes 15.3.2025 ***
3. *
"E volta a ensinar-me... obrigado!"
Obrigado? Sou eu quem lhe agradece
Por dar-me a ler os versos que aqui tece
E por assim me ter iluminado *
Perdi a conta ao tempo que é passado
Desde que aqui escrevi não sei que prece
E só agora o Verso me acontece
Nem sei por que milagre ou por que fado... *
Se desenvolta fui em tempos idos,
Perdi-me neste espaço sem sentidos
E até o pensamento me fatiga *
Este milagrezinho é obra sua:
Por cada verso qu`hoje aqui construa
Mais próxima estarei da Musa antiga. *
Mª João Brito de Sousa
15.03.2025 ***
4. *
“Mais próxima estarei da Musa antiga”
E ao baú decerto a vai buscar
Que a musa não a vai deixar ficar
Sem voz por ser tão boa rapariga *
E ela gosta muito de cantiga
E as duas juntamente vão cantar
Que sempre foram ambas um só par
Jeitosas, desde cedo e muito amigas *
E quem as ouve alegra-se ao ouvir
O canto do poema a ir e vir
Nos versos que o compõem finalmente *
Exposto ao nosso olhar o resultado
É lindo, muito belo e organizado
E fica a gente, ao ver, toda contente *
Custódio Montes
15.3.2025 *** 5. *
"E fica a gente, ao ver, toda contente"
A menos que eu tropece e a magia
Se perca entre o compasso e a harmonia
E passe a ser tão só mero acidente... *
Confiarei... Que a Musa me sustente!
Embora seja simples fantasia
É ela quem compõe a melodia
Que eu escrevo numa pauta transparente... *
Batem mais lestos pulso e coração
Que cada verso é uma tentação
E as tentações são pura adrenalina... *
Coragem, coração! Não pares, pulso!
Dai a cadência a cada verso avulso,
Pulsai como se eu fosse inda menina! *
Mª João Brito de Sousa
15.03.2025 *** 6. *
“Pulsai como se eu fosse inda menina”
Menina, moça e mãe, uma senhora
No verso, a cantar, uma doutora
Com flores a aromar a sua sina *
Escreve e ao mesmo tempo nos ensina
Com arte duma guia e professora
A pôr sobre o papel a cada hora
O verso mais perfeito…obra prima *
Mas não só neste instante em maré alta
Que seja a toda a hora que faz falta
E mostre-se a brilhar, não com capuz *
Que a névoa é opaca, não é bela
Não deixa ver o céu nem uma estrela
Escreva, vá-se a névoa, venha a luz! *
Custódio Montes
16.3.2025 ***
7. *
"Escreva, vá-se a névoa, venha a luz!"
Ah, pudesse eu fazê-lo... mas agora
Tenho de batalhar por cada cada hora
Que vou roubando à cova e me reduz *
O tempo de escrever - qu`inda seduz -
E este nadinha de estro que em mim mora:
Rondam-me as trevas, não se vão embora,
E nisto a minha vida se traduz... *
Saltito de hospital em hospital
E eu, que sou humana e sou mortal,
Só quero a paz da minha velha casa... *
Tivesse eu pernas pra fugir dali,
Mas essas pernas já eu as perdi
E só me resta este cotinho de asa. *
Mª João Brito de Sousa
16.03.2025 ***
8. *
“É só me resta este cotinho de asa”
Mas ainda lhe dá para voar
E enquanto anda assim lá pelo ar
O lume do poema está em brasa *
Esqueça esses recantos que há na casa
Que o céu é muito lindo, de encantar
E nesse voo vai a cirandar
E o céu azul tem luz que nos abrasa *
Do alto vê-se o mar e vê-se a terra
Os barcos, as searas e a serra
Os cantos das gaivotas e as flores *
E toda esta beleza elucida
E a onda do poema é criativa
Esquecem-se amarguras e as dores *
Custódio Montes
16.3.2025 ***
9. *
"Esquecem-se as amarguras e as dores"
Assim que algum soneto venha abrir
Porta ou janela por onde fugir
Por uns instantes dos nossos temores *
Mas não concede a Musa tais favores
A quem esteja privado de a sentir
E ela aos hospitais não gosta de ir,
Não quer ouvir gemidos nem estertores *
E quando o corpo humano que ela habita
Sente aquilo que eu sinto, a Musa hesita,
Mas depressa desiste e vai-se embora *
E até a poesia se dilui
No soro que nas nossas veias flui
Quando a Musa desiste e nos ignora *
Mª João Brito de Sousa
16.03.2025 ***
10. *
“Quando a Musa desiste e nos ignora”
Não fale assim da Musa, não merece
Quando a chama ela vem, logo aparece
E vem ouvir-lhe o canto hora a hora *
Mandei-lhe o meu soneto mesmo agora
E veja como ela a teia tece
E tudo à sua volta resplandece
Com uma voz bem firme e tão canora *
Ela é sua amiga e quer-lhe bem
Talvez até bem mais que a ninguém
E gosta do seu estro e poesia *
Não vá dizer a alguém que lhe quer mal
Que ela consigo é fenomenal
E dá-lhe a si e a nós muita alegria *
Custódio Montes
16.3.2025 ***
11. *
"E dá-lhe a si a nós muita alegria"
Mas só quando se digna a dar-me ouvidos
E eu lhe cedo os cinco - ou seis?- sentidos
Com que ela irá tentar fazer magia *
Quando acontece dar-se essa alquimia,
Os versos surgem quais recém-nascidos
Que buscam novos mundos coloridos
Num espaço onde antes mesmo nada havia *
Então e só então sei ter valido
A pena acontecer eu ter nascido
Num dia de Novembro, há muitos anos *
Mais motivada fico e mais segura
E embora este meu mal não tenha cura
Faço por ter mais tempo entre os humanos *
Mª João Brito de Sousa
16.03.2025 ***
12. *
“Farei por ter mais tempo entre os humanos”
É nós agradecemos-lhe o cantar
Que em verso é difícil encontrar
Quem poetise assim há muitos anos *
A gente pensa até não ter enganos
Seguindo a sua veia de encantar
Tentando muitas vezes imitar
Mas saem-nos frustrados esses planos *
Maria João é apenas ela
Que sabe conduzir a barca bela
E não a deixa nunca ir ao fundo *
Condu-la com luar e nevoeiro
E leva o ramo erguido e dianteiro
Nos melhores poemas deste mundo *
Custódio Montes
16.3.2025 ***
13. *
"Nos melhores poemas deste mundo"
E, vez por outra, nuns menos vistosos:
Que nem sempre os meus versos são garbosos
E este estro raramente é tão fecundo *
Mas, quanto à barca - juro! -, foi ao fundo!
Mil vezes enfrentou escolhos p`rigosos,
Engoliram-na abismos e, esforçosos,
Seus versos emergiram num segundo... *
Está, contudo, tão gasta e destruída
Que muito pouco tempo tem de vida
Embora tudo faça pra manter-se *
À tona neste mar a que se fez
Quando entendeu chegada a sua vez
De cumprir o que ousara prometer-se *
Mª João Brito de Sousa
16.03.2025 *** 14. *
“De cumprir o que ousara prometer-se”
E a barca lá vai indo a navegar
Com custo, faz esforço para andar
Embora ainda bela e a mover-se *
Lá ao longe onde ainda pode ver-se
Os seus remos já cansados no remar
E sem vista mas ainda a procurar
Oxalá que não vá ela perder-se *
Sulca as ondas com ar muito solene
À procura da deusa, da Silene
Mas sem rumo que o remo se perdeu *
Lá anda, não encontra o seu roteiro
Vendo-a assim prometeu-lhe o timoneiro
"Fosse eu Silene e dar-vos-ia o céu" *
Custódio Montes
17.3.2025
***
NOTA - Aproveito o facto de o poeta Custódio Montes ter conseguido "desbloquear-me" a escrita ao enviar-me o seu soneto SILENE, que o fez ser agraciado com o Primeiro Prémio dos Jogos Florais da Associação Portuguesa de Poetas, para ilustrar esta Coroa com o Cartaz criado para a homenagem que será feita à minha humilde pessoa na próxima sexta-feira, Dia Mundial da Poesia.
Peço mil desculpas pelo meu desaparecimento, mas não tenho estado em condições de escrever ou mesmo ler as vossas publicações, queridos companheiros da Blogosfera e do Facebook.
A minha insuficiência cardíaca piorou muito, a Mistral - a minha gata - está com uma diabetes dificílima de controlar e as minhas já poucas forças esgotam-se nos pequeninos gestos que a sobrevivência me impõe.
Não espero que todos me compreendam porque se há coisas que a vida me ensinou, uma delas é que só vestindo a pele do outro poderemos entender as suas dificuldades, mas não desistirei de vos convidar a estarem presentes, na próxima sexta-feira, às 16 horas no salão do CCD - Rua Mota Pinto, 2-B, Bairro do Pombal, Oeiras.
"Traz um Amigo Também!"
publicado às 13:30