A CEIA DO POETA II - Reedição
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Saiba aqui de que se trata
CRAVOS DE ABRIL II
*
Sobe, a Verdade, aos ramos desbastados
Do craveiro, inda em flor, dos seus direitos
E vê os cravos seus serem sujeitos
A desmentidos. Alguns, mais ousados,
*
A toda a hora são caluniados
E acusados de terem mil defeitos,
Ou de se desdizerem quando eleitos
Se forem por vilões manipulados...
*
Vira, a Verdade, os seus antepassados
Caçados como bichos, torturados,
Quebrados pela força ou já desfeitos
*
E teme agora que tão tristes fados
Voltem a repetir-se, convocados
Pela exacerbação dos preconceitos.
*
Mª João Brito de Sousa
09.10.2023 - 00.45h
***
CRAVOS DE ABRIL
*
(Aos velhos e aos que ainda estão em botão)
*
Se hoje vivemos revestidos
Do que pisaram mal floriu
E se nos soam aos ouvidos
Gritos que mais ninguém ouviu
*
Cuidai então dos que, oprimidos,
Deram ao chão que em flor se abriu
A força imensa dos sentidos
Que a burguesia então traiu!
*
Sei que calais esta verdade
Como quem esconde um pecadilho,
Que vos encheis da saciedade
*
De um pai que o foi sem ter um filho
E só semeia crueldade
Em searas-bomba sem rastilho!
*
Mª João Brito de Sousa
08.10.2023 - 16.00h
***
Nota - O meu primeiro soneto em versos octossilábicos de compasso binário,
com acentuação tónica na quarta e oitava sílabas métricas.
Aqui, por favor
Faça favor de ouvir, aqui
Fotografia de António Pedro Brito de Sousa
*
OUTONO
*
Dobrado sobre si, colhe uma flor...
Colhe depois, mais outra e outra ainda
enquanto às folhas, uma a uma, alinda
com tons que fazem jus à sua cor:
*
Ao verde-vivo, doira em seu redor
num ciclo que não pára, que não finda
de honrar esta estação enquanto ainda
não há sinais de Inverno e de rigor
*
Então, mergulha a terra em fundo sono
ao deixá-la cinzenta, enregelada,
Assim que se retire o suave Outono
*
Mas, por detrás do gelo e da geada
que parecem votá-la ao abandono,
já outra Primavera aguarda, ousada.
*
Maria João Brito de Sousa
05.10.2018 – 12.11h
***
DOBRAR O BOJADOR
*
Sonhei que enfim dobrava o Bojador...
Que bojador dobrei se em todo o lado
o encontrei mais forte e refinado
nas formas de causar-nos medo e dor?
*
Em sonhos o cruzei, navegador
de um velho mar, de um mar já navegado
pela barca dos sonhos engendrado
com remos, com velames, com motor.
*
Naufrágios, sempre os houve e no temor,
porque abundavam vagas e rochedos,
embati contra o velho Adamastor
*
Quando fugia dos meus próprios medos...
Acordei. Toda eu era suor
mas, ao monstrengo, roubei-lhe os segredos!
*
Maria João Brito de Sousa
04.10.2018 – 09.29h
***
DONA ELITE DE OLIGARQUIA & SA
*
Das migalhas que ao povo atirava,
Dona Elite, pensando melhor,
Entendeu ser demais o que dava
E que ao povo sobrava vigor
*
Porque, quando a migalha abundava,
Poderia sentir-se um senhor
E atrever-se a sonhar que mandava
Em si próprio, apesar de “inferior”
*
Dona Elite, prevendo o pior,
Sem cuidar do que ao povo faltava
Comeu tudo o que, a si, lhe sobrava:
*
Comeu pobre e criado e senhor
E, por fim, sem notar quanto inchava,
Engoliu tudo quanto restava
*
Até ver que mais nada, em redor,
Preenchia o vazio que gerava
E onde, impante e rotunda, orbitava
*
Muito alheia ao seu próprio fedor.
*
Maria João Brito de Sousa
09.10.2013 – 18.42h
***
NOTA – Soneto em verso eneassilábico com dupla “coda” ou “estrambote”
"WHAT A WONDERFUL WORLD!"
*
O mundo, Amor, será maravilhoso
Mesmo depois de mim, quando no mar,
A minha velha Barca naufragar
Num Inverno qualquer, mais rigoroso
*
E se por um momento doloroso
Eu deixasse, no Mundo, de apostar,
Não teria sabido ao Mundo amar,
Nem desta Vida obtido qualquer gozo...
*
Ah, Mundo-Vida, quanto me prendeste
Pois, de quanto tiraste, mais me deste
Desta riqueza a que nem vejo o fim
*
Quando, por dentro, a chama me acendeste
Morra eu embora nalgum dia agreste,
Maravilhada vi-te aceso em mim!
*
Maria João Brito de Sousa
15.06.2016 - 14.22h
***
Eu e Margarida Farrajota, 2013
Fotografia de Carlos Ricardo
*
SONETO TERCEIRO
*
Jovem não sou, nem Saudade é meu nome...
Tão pouco sou saudável e formosa
Mas não resisto a uma boa glosa
E, à minha Musa, não há quem a dome
*
Que essa me alenta a vida e ma consome
Numa contradição que me é preciosa
Embora mais pareça impiedosa
A algum olhar fugaz que aqui se assome...
*
Quão mais cortante o fio desta navalha,
Mais destemida fico, a mais me atrevo:
Pode algum verso ter defeito ou falha,
*
Posso até ir além do que o que devo
Mas, se tombar, que tombe na batalha
Deste meu temerário e louco enlevo!
*
Maria João Brito de Sousa
29.09.2021 -15.40h
***
Poema inspirado em dois sonetos à SAUDADE da autoria de Custódio Montes.
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