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poetaporkedeusker

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UM BLOG SOBRE SONETO CLÁSSICO

Da autoria de Maria João Brito de Sousa, sócia nº 88 da Associação Portuguesa de Poetas, Membro Efectivo da Academia Virtual Sala dos Poetas e Escritores - AVSPE -, Membro da Academia Virtual de Letras (AVL) , autora no Portal CEN, e membro da Associação Desenhando Sonhos, escrito num portátil gentilmente oferecido pelos seus leitores. ...porque os poemas nascem, alimentam-se, crescem, reproduzem-se e (por vezes...) não morrem.
31
Mai23

EU?

Maria João Brito de Sousa

EU... (1).jpg

Imagem retirada .daqui

EU?
*


"Na merda acabar... como mosca indecente"?

Jamais! Eu sou gente, não mosca vulgar

Que em qualquer lugar "aterra" e, carente,

Se dá por contente com tudo o que achar
*


Que eu, pra namorar, sou muito exigente,

Só de um pretendente gostei pra casar:

Tu vens-me insultar e eu faço-te frente

C`o murro potente que, sim, te vou dar!
*


Não me há-de faltar um quindim bem gostoso

Num café jeitoso, bem perto daqui,

Mas longe de ti, que és um bom mentiroso!
*


Não ligues, que é gozo! É que não resisti

E muito me ri c`o soneto jocoso,

Mas nada maldoso, que li e reli. :)
*

 

Mª João Brito de Sousa

30.05.2023
***

Soneto criado a partir do último verso do soneto de escárnio e maldizer

TU, de Albertino Galvão.

29
Mai23

MEMÓRIAS DE UM NÁUFRAGO PERFEITO- Reedição

Maria João Brito de Sousa

O NÁUFRAGO PERFEITO (1).jpeg

MEMÓRIAS
DE
UM NÁUFRAGO PERFEITO
*

 

Do vento que sopra, da proa que afunda,

Do mastro partido, do leme encravado,

Dos longos gemidos do velho costado,

Da barca que oscila, bojuda, rotunda,
*

 

Na crista da onda, no mar em que abunda

Escolho traiçoeiro que espreita, aguçado,

Escondido na espuma, submerso, acoitado

Em zona que a Barca julgava profunda...
*

 

De tudo me lembro, se bem que já esteja,

No tempo passado, submerso também

E seja esta imagem longínqua o que eu veja
*

 

Da Barca que afunda nos sonhos de alguém

Apenas a sombra que passa e festeja

Não ser verdadeira, nem ser de ninguém!
*

 

 

Maria João Brito de Sousa

11.01.2017 - 10.52h
***

Avô na casa de Algés.gif

 

Ao meu avô poeta, António de Sousa

*

(Soneto em verso hendecassilábico)

29
Mai23

DINAMENE - Custódio Montes e Mª João Brito de Sousa

Maria João Brito de Sousa

camoes e dinamene.jpg

Imagem retirada daqui

*

DINAMENE
*
Coroa de Sonetos
*

Custódio Montes e Mª João Brito de Sousa
*

1.
*

Dinamene, onde estás que não te vejo

As ondas ocultaram-me o olhar

Porque o barca não pára de oscilar

Já desde que saí do rio Tejo
*


Vou em frente à procura dum desejo

Sê amiga a ajudar-me a encontrar

Esse cais para eu desembarcar

E assim realizar o meu ensejo
*

Uma amiga indicou-me um velho cais

Num jardim onde andou a minha idade

Vou em frente, haja mesmo vendavais
*

Para voltar a ter felicidade

Oh Dinamene, afasta os temporais

Que não aguento mais esta saudade
*

Custódio Montes

28.5.2023
***

2.
*

"Que não aguento mais esta saudade"

Mas foi vossa essa escolha meu senhor,

Que bem maior foi esse estranho amor

Ao que escrevestes, do que ao que me invade...
*


Forte amor foi o meu que na verdade

Por vós perdi a vida e o esplendor

E ao vosso mar, senhor, sei-o de cor

Que me afundei na sua imensidade...
*


Cuidai que o vosso Tejo me não esqueça

Que, às tempestades, tentarei detê-las

Contanto que Poseidon não me impeça
*

E que Éolo, ao soprar nas vossas velas,

Do que lhe peço nunca desmereça,

Senhor das minhas horas mais singelas.
*

Dinamene

por

Mª João Brito de Sousa

18.05.2023 - 13.50h
***

3.
*
“Senhor das minhas horas mais singelas”

Cuida deste meu barco que à deriva

Não mais me leva ao pé da minha diva

Vencendo as altas vagas e procelas
*


Olimpo, endireita-me estas velas

Que o regresso à saudade me cativa

Na alma que se anima e se activa

Para alcançar as margens ledas, belas
*


Neste imenso ruído à minha volta

Quero encontrar a paz e dar-lhe a palma

E não andar num mar revolto à solta
*

Éolo, pára os ventos dá-lhes calma

Ajuda este meu barco, faz-lhe escolta

Para encontrar o amor desta minha alma
*

Custódio Montes

28.5.2013
***


4.
*
"Para encontrar o amor desta minha alma"

À vida eu voltaria, se pudesse,

Mas já não escuta Deus a minha prece

Nem vós, senhor, ao mar bateis a palma
*


Por isso jazo imersa nesta calma

Das profundezas que ninguém conhece

E esta que vos amou calma parece

No abismo negro e frio, sem ver vivalma...
*


Ah, pudesse eu voltar, por um momento,

Aos vossos braços, respirar enfim,

Para vos dar um pouco mais de alento
*


Mas quase nada sobra já de mim

Enquanto a vós vos sobra um tal talento

Que humano algum jamais o teve assim!
*

Dinamene

por

Mª João Brito de Sousa

28.05.2023 - 15.10h
***

5.
*

“Que humano algum jamais o teve assim”

Só Deus o pode ter não um humano

E quem não pensa assim é puro engano

Porque o homem não tem poder sem fim
*


Mas deixemos de lado esse latim

Senão o Poseidon dá um abano

Cobre-nos o veleiro com um pano

E lá vai água abaixo este festim
*


Sigamos, pois, avante na viagem

Para ver se encontramos, na verdade,

O que queremos ver lá junto à margem
*


Regressando talvez à nossa idade

Com a beleza e graça de ser pajem

E afastar por momentos a saudade
*

Custódio Montes

28.5.2023
***


6.
*

"E afastar por momentos a saudade"

É tudo o que mais posso ambicionar,

Mas fui vencida pelo grande mar

E morri quando em plena mocidade
*


Se assim, senhor, me fui na flor da idade,

Que sempre vos lembreis de me lembrar:

Como eu amei ninguém vos há-de amar,

Mas se outra vos trouxer felicidade
*


Ide, senhor!, gozai essa ventura

Que, a mim, tão cruamente me roubaram

Quando era tão menina e bela e pura...
*


Amainai, vagas, que os ventos mudaram!

A vossa barca está livre e segura,

Mesmo morta os meus braços vos amparam!
*

Dinamene

por

Mª João Brito de Sousa

28.05. 2023 - 17.30h
***

7.
*

“Mesmo morta os meus braços vos amparam”

Coitada, mesmo morta, ainda pensa

Que recebe do amor a recompensa

No meio dessas ondas que a levaram
*


Dinamene, as lembranças que ficaram

Voaram pelo mundo sem licença

E lembram tua imagem, tua crença

E como património nos honraram
*


Se te livrares da morte, dos grilhões

Que te levaram nova e imatura

Regressa para os nossos corações
*

Amar-te-emos mais - que és tão pura -

Como te amou o épico Camões

Sem voltar a morrer nessa aventura
*

Custódio Montes

28.5.2023
***

8.
*

"Sem voltar a morrer nessa aventura",

Pudesse eu renascer como imortal

Pr` amar o meu senhor de modo tal

Que me estimasse mais que à literatura...
*


Estou, porém, morta. Resta-me a candura

De me saber tão pura e tão leal

Que lanço a minha voz feita de sal

Até vós, meu senhor, minha ventura!
*


Vós, vivos, que escutais os meus lamentos

Nada fareis por mim. Talvez lembrar

A escrava que passou por mil tormentos
*


E a jovem que acabou por se afogar

Mas que ao falar-vos vence os elementos

E, por amor, seduz o próprio mar!
*


Dinamene

por

Mª João Brito de Sousa

28.05.2023 - 19.20h
***
9.
*

“E, por amor, seduz o próprio mar”

Que a tragou no seu ventre tão profundo

Que abarca muito mais que meio mundo

Mas que a mantém imersa num altar
*


Amante que salvou sem se salvar

Tão bela com seu ar fresco e jucundo

Levada pelo mar fero, iracundo

Que depois a prendeu para a amar
*


Agora com o mar ela é poder

E continua amante interessada

Ajuda quem lhe pede para ver
*


Se lhe pode encontrar a sua amada

Atenuando a dor e o sofrer

Como quem sonha ali ter uma fada
*


Custódio Montes

28.5.2023
***

10.
*

"Como quem sonha ali ter uma fada"

Me quis o mar prender... e me prendeu

E foi o meu senhor quem me perdeu,

Esse que amei como ama uma encantada
*


Bem me viu, meu senhor, quase afogada,

Mas nem essa aflição o comoveu,

Que foi ao manuscrito que escolheu

E não a mim que me julgava amada...
*


Agora foi o mar que me tornou

Sua escrava leal. Eternamente

Serei escrava que a escrava retornou
*


Neste meu trono de algas, não sou gente,

Que em gente nunca o mar me transformou,

Nem Poseidon me deu o seu tridente!
*


Dinamene

por

Mª João Brito de Sousa

28.05.2023 - 20.50h
***


11.
*

“Nem Poseidon me deu o seu tridente”

Mas és muito importante na magia

Que entregas e que dás à poesia

Por salvar Portugal e sua gente
*


Perante a destruição quase eminente

Do livro que nos dá tanta alegria

Salvou-o o escritor que se afligia

Com a mão livre e um olho somente …
*


Tinha uma mão ao alto e a outra mão

Afastava a procela ao seu redor

E nessa grande e enorme confusão
*


Não sabia qual era o bem maior

Que tinha ali bem junto ao coração….

Perdendo um, salvou o outro amor
*

Custódio Montes

28.5.2023
***

12.
*

"Perdendo um, salvou o outro amor"

E crerás tu que o deva perdoar

Por conseguir um outro amor salvar

Entregando-me à minha eterna dor?
*


Talvez tenhas razão e, se assim for,

De que me vale agora lamentar?

Amor de escrava só o quer o mar

Que nela descarrega o seu furor...
*


Tu, que estás entre os vivos, desconheces

O que é ser-se uma eterna prisioneira

Das profundezas em que permaneces
*


Dia após dia, a eternidade inteira,

Sem que ninguém atenda às tuas preces

Nem entenda se és falsa ou verdadeira!
*

Dinamene

por

Mª João Brito de Sousa

28.05.2023 - 22.45h
***
13.
*

“Nem entenda se és falsa ou verdadeira”

Mas que queres que diga? Na verdade

Eu sou ninfa e por toda a eternidade

Mesmo que me aflija e o não queira
*


Camões logo soube isso e à primeira

Quis namorar comigo e à vontade

Andou à minha volta em liberdade

E correu o mar todo à minha beira
*


Mas com a tempestade veio a onda

Que nos forçou a andar dentro e fora

Agora não há sítio onde me esconda
*

Vagueio pelo mar a toda a hora

E só me encontrarão andando à ronda

Sem pressa, devagar e com demora
*

Custódio Montes

28.5.2023
***

14.
*

"Sem pressa, devagar e com demora"

Eu hei-de procurar-te, Dinamene,

Ainda que sem vela e que sem leme

Me perca mar adentro, ou mar afora...
*


Seja eu eterno só por uma hora!

Não haverá ninguém que me condene

Nem um segundo, só, em que não reme

Para encontrar-te onde uma vaga aflora!
*

Não cessarei, amor, de procurar-te

Nesse mar que, por ter-te, agora invejo,

E do qual, meu amor, hei-de arrancar-te
*


Pra devolver-te à vida num só beijo,

Que amar-te assim, amor, também é arte:

"Dinamene, onde estás que te não vejo"?
*


Lviz Vaz de Camões

por


Mª João Brito de Sousa

29.05. 2023 - 00.00h
***

 

DINAMENE (1).jpg

 

 

 

 

28
Mai23

PALAVRAS DE LAVA

Maria João Brito de Sousa

Florbela pinterest (1).jpg

PALAVRAS DE LAVA
*
A Florbela
*

Desperta, sorria mal o sol nascia

Contudo soía pensar que chorava

Quando ambicionava o que mais lhe doía

Sendo a rebeldia o que em si germinava
*


Nada lhe faltava, nem mesmo a alegria

Com que defendia a perfeita palavra

Mas não lhe bastava, nem mesmo a ousadia

Com que se batia pelo que sonhava...
*


Contudo escutava e àquilo que ouvia

Filtrava, escolhia e depois preservava

O que era de lava, lava que escorria
*


Tão estranha quão fria porque não queimava

E porque ficava, tal qual melodia,

Em quem a ouvia sempre que falava.
*

 

Mª João Brito de Sousa

27.05.2023 - 13.45h
***

 

Soneto hendecassilábico com rima encadeada

27
Mai23

NÃO DESENCANTES O SAPO - Reedição

Maria João Brito de Sousa

o sapo.jpg

NUNCA (DES)ENCANTES UM SAPO!
*
Coroa de Sonetos
*
Mª João Brito de Sousa e Custódio Montes
*
1.
*
Quebra-se a magia do beijo assombrado
Que magicamente fez, do sapo, humano...
Quanta angústia emerge, quanto desengano
Pra quem fora um simples sapo descuidado!
*
Vá lá! Nunca beijes um sapo encantado!
Lembra-te que podes causar-lhe tal dano
Que o pobre batráquio, de bichito ufano,
Passe a ser humano. Coitado, coitado!
*
Pobre desse sapo que estando inocente
De culpa, de intriga, de ódio e de traição,
Se torna consciente das falhas que tem
*
Quando, por um beijo, se transforma em gente
E perde inocência. Que desilusão...
Tu, quando o beijaste, sabia-lo bem!
*
Maria João Brito de Sousa
19.06.2008 - 08.53h
***
2.
*
“Tu, quando o beijaste, sabia-lo bem”
Enganaste o sapo, fizeste-lo gente
Perdeu a candura, não é inocente
Maldizem o beijo que ao sapo convém
*
O encanto quebrou-se e agora ninguém
O olha assapado na água envolvente
O beijo espalhado na coxa carente
Passa por humano e o sapo também
*
Que se vá o encanto que fique a pureza
Do coaxar belo no meio do lago
Que mesmo sem beijo a gente agradece
*
No meio do campo vendo a natureza
Sente-se alegria, alegria e afago
E o coaxar do sapo entoa em prece
*
Custodio Montes
23.5.2022
*
3.
*
"E o coaxar do sapo entoa em prece"
Na toada exacta que à espécie convém
E em versos que um sapo conhece tão bem,
Quanto aos nossos versos sequer reconhece...
*
Batráquio que o seja, não fia, não tece,
Nem sabe de beijos que lhe of`reça alguém
E encontra fartura no pouco que tem,
Porque de mais nada precisa ou carece...
*
No seu charcozinho ou na sua lagoa,
Há sempre um coaxo que vibra e ressoa:
O seu hino à Vida é mais belo que o nosso
*
E mais espontâneo e mais verdadeiro...
É mestre, o batráquio, no canto certeiro
E eu falho, por vezes. Só canto o que posso...
*
Mª João Brito de Sousa
23.05.2022 - 14.10h
***
4.
*
“E eu falho, por vezes. Só canto o que posso…”
Mas canto que cante é sempre engraçado
O sapo não canta tão emalhetado
Embora o que cante seja sem esforço
*
O sapo no canto canta fino e grosso
E é um encanto ouvi-lo espaçado
À beira do charco quieto sentado
Com as mãos no queixo sem grande alvoroço
*
Também no poema se ouve a canção
Que nos prende a alma e o coração
Descrevendo o lago e o sapo a cantar
*
E por essa forma o coaxar e o canto
Só dão alegria nunca desencanto
Não beijo assombrado se o quiser beijar
*
Custódio Montes
23.5.2022
***
5.
*
"Não beijo assombrado se o quiser beijar"...
Beijá-lo não quero que o assustaria
E o seu belo canto não mais se ouviria
Nem nesse seu lago, nem noutro lugar
*
Que sapo assustado deixa de cantar,
Quase não respira, cala a melodia
E por predadora logo tomaria
Qualquer princesinha que o fosse agarrar...
*
Canta, sapo, canta! Fica descansado,
Quero-te batráquio não (des)encantado,
Que de realezas estou há muito farta
*
E se teço c`roas, são de outro jaez,
Nunca as teceria pra nenhum "princês"
E esta minha Musa também mo descarta.
*
Mª João Brito de Sousa
23.05.2022 - 16.25h
***
6.
*
“E esta minha musa também mo descarta”
Que a musa é fina não é nenhum sapo
Disso ela foge e também eu me escapo
Que de aventuras a musa está farta
*
O sapo medonho que raios o parta
A não ser que cante com graça e guapo
E não todo imundo sujo como um trapo
Com voz de primeira e não voz de quarta
*
Mas vamos por partes e sem ofender
Não beijar o sapo fui eu a dizer?
A coroa o disse e sem desengano
*
Logo à primeira, mesmo a começar
Prosseguiu a musa e a deambular
Disse: não se faça do sapo um humano
*
Custódio Montes
23.5.2022
***
7.
*
"Disse: não se faça do sapo um humano"
Que são, os humanos, muito complicados
Enquanto os sapinhos vivem sem cuidados
E cuidam das hortas sem causar-nos dano...
*
Um seu conterrâneo foi um soberano
A falar de sapos, esses mal amados,
Por quem desconhece que os pobres coitados
Nos são muito úteis quando, ano após ano,
*
Nos livram de insectos e salvam das pragas
Que assolam as folhas e destroem bagas...
Bambo*, o sapo velho, quem pode esquecê-lo
*
Se morto em serviço, firme no seu posto,
Só porque não tinha beleza no rosto,
Só porque não era cativante e belo?
*
Mª João Brito de Sousa
23.05.2022 - 20.15h
***
Vide "Bambo" in "Bichos", Miguel Torga
***
8.
*
“Só porque não era cativante e belo”
Mas sempre a saltar na horta e no canteiro
A comer as larvas limpar o terreiro
Por isso, agrada e é muito bom tê-lo
*
O sapo é útil não é um flagelo
Se feio parece ele é um bom parceiro
Comendo os insectos, limpando o lameiro
Ajuda no campo, dos braços é elo
*
Um “bambo” é verdade mas não é de borga
Descrito em Bichos pelo Miguel Torga
Como nos informa com sua mestria
*
Louvemos o sapo, não lhe quero mal
Sem lhe darmos beijos a esse animal
Nem o endeusarmos com a poesia
*
Custódio Montes
23.5.2022
***
9.
*
"Nem o endeusarmos com a poesia"...
Torga humanizou-o na prosa, contudo,
E fez dele um mestre que, apesar de mudo,
Falava de amor e de Filosofia
*
Como quem faz jus à tal sabedoria
Que da Vida entende um pouquinho de tudo...
Ah, se ao velho Bambo nesta estrofe aludo,
Aludo à amizade e, quem sabe?, à magia
*
Mais bela, decerto, do que a do tal beijo
Que deu a princesa ao sapito do brejo
Julgando que o dito era um rei, nunca um sapo...
*
Tem tino, princesa! Não vês que o encanto
Do nobre batráquio dispensa o teu manto
Que é, pra ele, um pobre e cerzido farrapo?
*
Mª João Brito de Sousa
23.05.2022 - 23.00h
***
10
*
“Que é, pra ele, um pobre e cerzido farrapo?”
Isso porque o Bambo é inteligente
Mas mais nenhum sapo é assim cojente
Para distinguir a tal manta de trapo
*
Queria a princesa pensar que o sapo
Era antes Bambo tão nobre e valente
Que, na realeza, parecesse gente
Errou, enganou-se, tirou-lhe um fiapo
*
Nem nós no poema temos gosto insano
De fazer do sapo um príncipe humano
Para a tal princesa o poder beijar
*
Confundiu decerto e ficou em apuro
Por ter confundido o sapo anuro
Com príncipe amado para namorar
*
Custódio Montes
24.5.2022
***
11.
*
"Com príncipe amado para namorar"
Confunde a princesa o tal sapo anuro...
Posso ser insana, mas aqui lhe juro
Que ao sapo prefiro de longe admirar
*
A pensar num homem para me casar:
A um, sim, amei-o, mas mais não aturo,
E se, no passado, previsse o futuro,
Talvez preferisse nem me apaixonar...
*
Bem sei que, consigo, tudo foi dif`rente,
Que esse amor perdura e que vive contente
Com sua princesa num reino encantado,
*
Enquanto eu afirmo que amo a solidão,
Que escrevo o que escrevo nessa condição
E não troco um brejo por trono ou condado!
*
Mª João Brito de Sousa
24.05.2022 - 10.15h
***
12.
*
“E não troco um brejo por trono ou condado”
Nem quero princesas tão namoradeiras
Que gozem o sapo só com brincadeiras
Mesmo que o beijem como encantado
*
Mas falar de amor agora é escusado
Para mais falarmos de tantas asneiras
Que a nossa princesa de várias maneiras
Fez passar ao sapo como namorado
*
Se andasse ocupada não tinha desejo
De ao sapo encantado querer dar um beijo
E não nos daria tanta ocupação
*
Mas sem ter trabalho, farta, à boa vida
Quis-se imaginar como sendo a querida
Dum sapo encantado e do seu coração
*
Custódio Montes
24.5.2022
***
13.
*
"Dum sapo encantado e do seu coração"
Tenta uma princesa ser dona e senhora...
Não sabe, a tontinha, que os sapos de agora
São poucos, passaram a espécie em extinção
*
E exigem, portanto, maior protecção...
Cuidado, princesa, que a fauna e a flora
Devem preservar-se bem mais do que outrora
Em nome de um mundo mais limpo e mais são!
*
Esses teus caprichos de dama mimada
São sonhos traídos, não servem pra nada!
(embora eu confesse que os utilizei
*
na C`roa de versos que aqui vou tecendo...)
Princesa, princesa! Tu estás-te é esquecendo:
Tão livre é o Sapo quão nu vai el Rei!
*
Mª João Brito de Sousa
24.05.2022 - 16.15h
***
14.
*
“Tão livre é o sapo quão nu vai el Rei!!”
Por isso, Princesa, vê lá se te apoucas
Nessas preferências, que queres tão loucas
Deixa lá o sapo que eu investiguei
*
Que ter tais amores, isso também sei,
Já não é namoro: princesas são poucas
Vestem como as outras e não usam toucas
Não andam em charcos tão fora de lei
*
E já nem o “Bambo” vai nessas cantigas
Que tem bambo fêmea não quer raparigas
Nem por elas fica tão apaixonado
*
Tece, pois, princesa um novo novelo
Que o sapo rejeita, não quer teu anelo
“Quebra-se a magia do beijo assombrado”
*
Custódio Montes
24.5.2022
***

26
Mai23

CONVERSANDO COM JOSÉ SARAMAGO - Reedição

Maria João Brito de Sousa

Converando com Saramago (1).jpeg

SONETO ATRASADO

*

De Marília os sinais aqui ficaram,
Que tudo são sinais de ter passado:
Se de flores vejo o chão atapetado,
Foi que do chão seus pés as levantaram.

*

Do riso de Marília se formaram
Os cantos que escuto deleitado,
E as águas correntes neste prado
Dos olhos de Marília é que brotaram.

*

O seu rasto seguindo, vou andando,
Ora sentindo dor, ora alegria,
Entre uma e outra a vida partilhando:

*

Mas quando o sol se esconde, a noite fria
Sobre mim desce, e logo, miserando,
Após Marília corro, após o dia.

*

José Saramago

In “Os Poemas Possíveis”

 

**************

 

SONETO DO ENCONTRO TARDIO

*

Atrás de mim vieste e me alcançaste

No rasto dos sinais por mim deixados,

Mas tivesse eu mais rio, mais chão, mais prados,

Soubesse eu desses sonhos que sonhaste,

*

Mais sinais deixaria onde passaste:

Mais lágrimas, mais risos entoados,

Mas muito menos passos apressados

Teria dado até onde me achaste...

*

Caminhava apressada pela vida,

Sem cuidar de cuidar que havia um fim,

Sem notar que passava distraída,

*

Mas que um rasto deixava e, sendo assim,

Te apontava uma rota percorrida

Que a tua antecipava, atrás de mim...

*

Marília

*

(Maria João Brito de Sousa – 20.11.2012 – 11.20h)

24
Mai23

DÚBIAS TEORIAS

Maria João Brito de Sousa

bailarina Degas (1).jpg

Pormenor de tela de Edgar Degas

*

DÚBIAS TEORIAS
*


Pouco se sabe sobre o bom soneto

Que, como um ovo, perfeito se fecha

E que eu encaro como um amuleto

Que me enfeitiça e que não mais me deixa
*


Mesmo sendo pequeno e até discreto

Tem o suave mistério de uma gueixa:

Dizem, alguns, que está velho, obsoleto,

Mas ele ainda (en)canta e não se queixa!
*


Não chora, este soneto, antes se ri

E dança, e canta e faz acrobacias

Sobre os catorze versos que escrevi
*


Heroicamente alheio às tropelias

Das críticas erguidas contra si

Por muitas mais que dúbias teorias.
*

 

Mª João Brito de Sousa

23.05.2023 - 13.30h
***

23
Mai23

FORÇA - Reedição

Maria João Brito de Sousa

Pavia - Força (1).jpg

Manuel Ribeiro de Pavia

*

FORÇA
*


Vem-nos, a força, duma alma crestada

Por átomos de sonho e de ideais

E, às vezes, conseguimos fazer mais

Quando julgámos não poder mais nada
*


Vem improvável, mais do que adiada

- à luz das mentes tidas por normais -

Povoar-nos de sonho o velho cais

Da barca eternamente naufragada
*


Virá de onde diríamos não vir

Nem a remota sombra de um auxílio:

Impossível, absurda e, no entanto,
*


Vem como se quisesse destruir

As fronteiras reais do nosso exílio

Pra vir morar connosco em qualquer canto.
*


Maria João Brito de Sousa

13.11.2010 – 13.42h
***

 

 

22
Mai23

CONCURSO

Maria João Brito de Sousa

Eu e MR no almoço HP 2023.jpg

CONCURSO
*


Sentada na poltrona a correr mundo,

Correm meus dedos tanto quanto eu corro

Que em cada dedo mora um vagabundo

Nadando tanto mais quão mais lho rogo
*


E nestas artes nunca me confundo:

Sou eu que sobrevivo ou cedo e morro

Se a Barca meter água e for ao fundo

Sem que haja um só pedido de socorro
*


Por parte de algum verso moribundo

A naufragar num mar que surge em jorro...

À Morte lanço à pressa um não rotundo
*


Mas se ela não desiste e eu não discorro

Mais do que um "não" rosnado e furibundo,

Quem vence este concurso a que concorro?
*

 

Mª João Brito de Sousa

21.05.2023 - 23.00h
***

 

 

 

21
Mai23

O DISCURSO - Reedição

Maria João Brito de Sousa

discurso.jpg

O DISCURSO - Reedição
*

 

Impõe-se-me um discurso, urgentemente!

Aquilo que disser será escutado

E há que ter, como tal, muito cuidado,

Não se torne a palavra independente
*

 

Que o discurso é, por vezes, inclemente:

Nós damos-lhe a função de ser recado

E, o tonto,  faz-se ambíguo e torna errado

O que, sendo pensado, era inocente
*

 

Porque, ao dizer, desdiz o que foi dito,

Ganha vontade própria, é traiçoeiro

E, às vezes, transmutado em ditador,
*

 

Consegue desmentir quanto foi escrito,

Ilude o alheio ouvido a tempo inteiro

E destrói a carreira ao orador!
*

 

Mª João Brito de Sousa

20.05.2008
***
.

 

19
Mai23

PASSAR AO LADO - Reedição

Maria João Brito de Sousa

passar ao lado.jpg

“PASSAR AO LADO”
*


E quando mal dormimos porque a dor

Teimou a noite inteira, acrescentou-se

E conseguindo levar a melhor

Deixou dentro de nós a dor que trouxe,
*

 


Não há espaço pra sonho, ou chão pra flor:

Já não há espanto. Nada é pêra-doce

E tudo, analisado ao pormenor,

Parece um pesadelo. Antes o fosse!
*

 


Mas pesa-me este longo desabafo:

Não tendo a fina lira que tem Safo,

Nem as paixões soberbas de Florbela
*


Poeta em carne viva e já tardia,

Subtraio à raiva uns palmos de ironia,

Passo-lhe ao lado e... já nem dou por ela!
*

 


Maria João Brito de Sousa

19.05.2018 – 09.08h
***

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