Maria João Brito de Sousa
DIAS TRISTES * Coroa de Sonetos *
Helena Fragoso e Mª João Brito de Sousa *
1. *
Há dias e dias na vida da gente
Uns que nos sorriem, outros que até não…
Há os que nos fazem torturas à mente…
São aos quais eu chamo de " dias de cão".… *
Tem uns que são duros e que num repente
Emanam tristeza…nos deitam ao chão….
Até nos destroem a alma, a pureza
Só nos trazem mágoas, dor na contramão… *
Tem dias que tudo nos parece ausente
Em que nada vibra, nada se consente…
Dias em que o mundo é mera ilusão…. *
Enfim, dias tristes em que consciente,
Nossa alma chora, sentindo latente
A saudade, as mágoas e a solidão… *
Helena Fragoso *** 2 *
"A saudade, as mágoas e a solidão"
Podem, minha querida, ser tão passageiras
Quanto o são as aves, se de arribação,
Ou as altas chamas de alguma fogueira *
Que ao fim de umas horas se consumirão
Pra deixar só cinzas brancas e poeira...
Sim, há dias tristes, há "dias de cão",
E há dias que são riso e brincadeira *
Nesta nossa estrada, em vez de alcatrão,
Há pedras bem duras a forrar o chão
E arbustos com espinhos mesmo à nossa beira *
Mas nós prosseguimos. Não, não foi em vão
Que continuamos nesta direcção,
Neste mundo (quase) carrossel de feira! *
Mª João Brito de Sousa
29.11.2022 - 15.15h ***
3. *
Neste mundo (quase) carrossel de feira
Que descompensado corre sem noção
Com dias que roubam e de que maneira
Nossa paciência e concentração... *
Tem dias que a vida não se mostra inteira
E em que nossos passos se colam ao chão.
Dias em que os sonhos ardem na fogueira
Só restando as cinzas da desilusão… *
E neste caminho, nesta ribanceira
Os dias que passam seguem de maneira
Que haja riso, pranto, dor e solidão… *
Tem dias que a vida na sua cegueira
Nos deixa sem rumo, sem eira nem beira.
Perdidos nas sombras e na escuridão… *
Helena Fragoso ***
4. *
"Perdidos nas sombras e na escuridão"
Sem ver mais que um palmo do nosso futuro
Tornámo-nos sombras tecidas no escuro,
Quase inexistência, quase assombração... *
Mas todas as sombras são a projecção
De algo consistente, volumoso e duro,
Que pode ser gente ou somente um muro
Cuja sombra é fruto... de iluminação *
Sem luz, minha amiga, por pouca que seja
Não haverá sombra, nem quem nela esteja
Tão desiludido quanto estás agora: *
Salta-me esse muro que, do outro lado,
Tudo está mais claro, mais iluminado
E verás que as sombras terão ido embora! *
Mª João Brito de Sousa
07.12.2022 - 11.50h ***
5. *
"E verás que as sombras terão ido embora"
Levando com elas dor e solidão
Nasce um novo dia, uma nova aurora
É um dia triste? Diria que não… *
Um dia que corre nesse mundo afora
Formando um oásis mantendo a ilusão
Que há dias felizes e que a qualquer hora
Os dias mais tristes se transformarão *
Ao pular o muro vi sombras lá fora
Vi dias sorrindo numa ou outra hora
Vi sombras andando pela escuridão.. *
Então ao ver tudo, voltei, vim embora,
Pensei nesses dias que vão mundo afora
Uns tristes, é certo... outros até não. *
Helena Fragoso *
6. *
"Uns tristes, é certo... outros até não"
Que se nuns chorei, nos outros me ri
E entre choro e riso muito eu aprendi
Ao subir o muro da contradição: *
Vi os que acumulam milhão a milhão
E os que moirejam não tendo pra si
Nem um pedacinho do que nalguns vi,
E vi os sem-terra junto dos sem-pão *
Sucumbindo às bestas do nazi-fascismo
Que, por todo o mundo, escava um sujo abismo
Em que os dias - todos! - são de escravidão! *
E pra que não seja mais do que um aviso,
Pra que sobrevivam os dias do riso,
Que nos não enganem as bestas que o são! *
Mª João Brito de Sousa
09.12.2022 - 11.35h ***
7. *
"Que nos não enganem as bestas que o são"
Ferozes selvagens sempre assim os vi…
Negando aos mais pobres a casa e o pão
Com cruéis discursos como sempre li…. *
Existe a esperança, não é ilusão…
E talvez por isso eu nunca a perdi
Tem dias sorrindo, sim, na contramão
Desses tristes dias que também vivi… *
Tem dias risonhos que bem os senti
Que enquanto duraram amei e sorri
Mesmo que só fossem total ilusão… *
Nos outros, nos tristes, até me perdi
Com tanta maldade como nunca vi
Fruto desta nossa civilização… *
Helena Fragoso *
8. *
"Fruto desta nossa civilização"
Que ao capitalismo tanto idolatrou,
Renasce o nazismo do que del` sobrou,
Mais letal que um vírus, mais sem compaixão *
Mas se há esp`rança ainda de lhe pôr travão,
Esses dias tristes em que a dor cravou
Punhais de aço puro nos que dizimou,
Em dias felizes se transformarão! *
Planta a tua esp`rança companheira amiga
Para que ela em breve se transforme em espiga
E pra que da espiga nasça essoutro pão *
Que consola a alma e conforta a barriga,
Que ora trigo loiro, ora uma cantiga,
Tanto é poesia quanto é refeição! *
Mª João Brito de Sousa
13.12.2022 - 17.20h ***
9. *
"Tanto é poesia quanto refeição,"
Que alimenta a alma, que dá cor à vida
Nesses dias tristes que sem compaixão
Tudo vai embora sem ter despedida… *
Mas tem um momento de consolação
Em que os dias chegam sorrindo pra vida
Dias de alegria de amor de paixão
De uma liberdade por nós conseguida… *
Aí companheira de luta de vida,
Sorriem os dias na paz que é vivida
Em nossos momentos de satisfação… *
E os dias tristes estarão de partida
Levando tristezas retalhos de vida…
Deixando alegrias, paz no coração. *
Helena Fragoso ***
10. *
"Deixando alegrias, paz no coração"
Como a que hoje sinto por de novo ler-te:
Não há mais angústia que me desconcerte
Nem que a voz me tolha pra prender-me ao chão! *
Virão alegrias, amiga, virão,
Embora eu não possa, certeira, dizer-te
Quando exactamente sorrirão ao ver-te,
Só posso afirmar-te que te sorrirão *
E estes tristes dias que a tantos oprimem,
Serão apagados pelos que redimem
Todas as angústias e todos os prantos *
Virão dias claros que os prantos suprimem
E enquanto aguardamos, nossos versos exprimem,
Nos sonhos de agora, a esp`rança de tantos! *
Mª João Brito de Sousa
18.12.2022 - 15.05h ***
11. *
Nos sonhos de agora a esprança de tantos…
Que com fé desejam a paz neste mundo…
Dias de tristeza e outros de encantos…
Faz parte da vida, verdade no fundo… *
Nesses dias tristes, nem sabemos quantos,
Dias do fascismo, um momento imundo…
Sofreram na carne, e Deus…foram tantos…
Outros que sumiram nesse submundo… *
Mas vamos em frente construindo a fundo
Um novo universo a bem deste mundo
Uns dias, sim, tristes, outros serão santos … *
E mesmo algum ódio, talvez iracundo
Se transforme em sonhos em sonhos que a fundo
Serão mesmo a esprança, a esprança de tantos… *
Helena Fragoso ***
12. *
"Serão mesmo a esprança, a esprança de tantos"
Que de novo vêem erguer-se o nazismo
Conquanto o julgassem morto em cada abismo
Que o próprio cavara por todos os cantos *
Foi enorme o pasmo, grandes os espantos
Que nos abalaram como um brutal sismo,
Mas de novo calmos, quebrou-se o mutismo
E entre os que resistem não cabem mais prantos *
Não sei dizer como, nem sei dizer quando,
Mas vejo o nazismo de novo afundando
No profundo abismo que pra nós cavou *
Não será com balas, mas será lutando
Que os que quer esmagados o irão esmagando
Até que digamos: - O monstro acabou! *
Mª João Brito de Sousa
18.12.2022 - 19.15h ***
13. *
"Até que digamos o monstro acabou"…
Até que tenhamos paz e liberdade…
Até derrotarmos quem nos torturou
Com ódios, com guerras, matanças, maldade…. *
Até que vejamos que o mundo mudou
Que haja novos dias de luz, claridade…
Que os dias renasçam do bem que os criou
Os dias felizes a bem da verdade… *
Há dias e dias que a vida mudou
Com tudo o que a gente viveu e lutou
Até houve dias deixando saudade… *
Os tais dias tristes que o vento levou
Os dias risonhos que o sol nos doou
Tristes ou risonhos … dias de verdade… *
Helena Fragoso ***
14. *
"Tristes ou risonhos... dias de verdade",
Dias que nos encham de amor e de paz,
Dias que nos mostrem que há gente capaz
De remir os erros desta sociedade, *
De implantar, no mundo, a solidariedade
Com fundas raízes, não breve e fugaz,
Dando um passo em frente e, a seguir, dois atrás,
No que vai tocando à nossa liberdade... *
Que a guerra entre os povos termine de vez!
Se aquilo que vejo é também o que vês,
Que quem sofre e paga é quem está inocente, *
Então, companheira, que pague quem fez
De cada alegria, dor e morbidez:
"Há dias e dias na vida da gente"! *
Mª João Brito de Sousa
21.12.2022 - 13.50h ***
publicado às 14:38