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poetaporkedeusker

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UM BLOG SOBRE SONETO CLÁSSICO

Da autoria de Maria João Brito de Sousa, sócia nº 88 da Associação Portuguesa de Poetas, Membro Efectivo da Academia Virtual Sala dos Poetas e Escritores - AVSPE -, Membro da Academia Virtual de Letras (AVL) , autora no Portal CEN, e membro da Associação Desenhando Sonhos, escrito num portátil gentilmente oferecido pelos seus leitores. ...porque os poemas nascem, alimentam-se, crescem, reproduzem-se e (por vezes...) não morrem.
29
Jul22

MARIA-SEM-CAMISA- Reedição

Maria João Brito de Sousa

EU, 5 ANOS (1).jpg

Maria-Sem-Camisa

*

 

 

Maria-Sem-Camisa, a sem dinheiro

Que passa pela vida ao Deus-dará,

Tem fama de ser estranha e de ser má

Mas é, tão só,  poeta a tempo inteiro

*

 

Maria vai plantando em seu canteiro

Sementes de si mesma ... o que não há

Engendra-o Maria, e tanto dá

Ter pouco se tão rica foi primeiro

*

 

 Maria-Sem-Camisa planta ideias

 E disso vai colhendo o seu sustento

 Sem cuidar da chegada ou da partida

*

 

 Porque os frutos colhidos são candeias,

 São estrelas a luzir no firmamento

 Da órbita em que traça a sua vida.

*

 

 

 

 Maria João Brito de Sousa

14.01.2008 - 21.15h

***

NOTA - Este foi o primeiro soneto que editei neste Blog

28
Jul22

SONETO TARDIO - Reedição

Maria João Brito de Sousa

SONETO TARDIO

 

*

Mergulhei no sonho das alegorias

Já que de energias e sons me componho,

E o tempo é risonho se der garantias

De enfrentar fobias sem medo ao medonho.

*

 

Hoje pressuponho que, ao longo dos dias,

De conchas vazias, apenas, disponho...

Que mais me proponho quando, horas tardias,

Em vez de harmonias, encontro bisonho

*

 

Um tempo a que oponho sons e melodias?

Sim, houve avarias, mas não me envergonho

Das coisas que sonho. Se roubas fatias

*

 

Dessas fantasias de mel e medronho,

Depressa reponho quantas me desvias

Que entre as sombras frias me adentro e me exponho.

*

 

 

Maria João Brito de Sousa – 21.05.2019 – 21.16h

 

soneto tardio (1).jpg

27
Jul22

AMOR NÃO SE CONQUISTA NEM SE IMPÕE

Maria João Brito de Sousa

magritte-610x350.jpg

AMOR NÃO SE CONQUISTA

NEM SE IMPÕE
*

 

Amor não se conquista nem se impõe:

Sente-se num repente por alguém

E assim que chega, diz-nos a que vem,

Mostrando sem reserva o que propõe
*


De espanto e de ternura se compõe,

Por vezes toda a vida se mantém

Mas magoa bem mais que o que convém

Se apertam as algemas que nos põe...
*


Amor é de si próprio a recompensa

Pois quanto há de sublime, Amor condensa,

E quanto se abomina, Amor renega...
*


Mas pobre de quem ama em demasia:

Não tem remédio, Amor, nem garantia

Há contra as vendas com que Amor nos cega.
*


Mª João Brito de Sousa

27.07.2022 - 15.30h
***

"Os Amantes" - René Magritte

 

26
Jul22

FERA E DONO - Reedição

Maria João Brito de Sousa

 

fera e dono (1).jpeg

FERA E DONO

*


Tu estavas de joelhos junto à fera

- um titã que rugia, que rosnava -

Na tua face impávida, severa,

Nem sombra de temor se adivinhava

*

A morte ali, espreitando, à tua espera,

E cada gesto teu a ignorava,

Como se protegido pela esfera

Do aço que a vontade em ti forjava

*

- A fera é o Soneto!, afiançaste.

Não soube se o domaste, ou não domaste,

Porque a noite caiu. Fiquei com sono

*

 

E fui dormir. Ainda vislumbrei

Em sonho os vossos vultos, mas não sei

Qual de vós era a fera e qual  o dono...

*

 


Maria João Brito de Sousa

16.07.2018 -13.06h
***

 

(soneto ligeiramente reformulado)

 

24
Jul22

UMA LUZ - Custódio Montes e Mª João Brito de Sousa

Maria João Brito de Sousa

UMA LUZ
*

Coroa de Sonetos hendecassilábicos
*

Custódio Montes e Mª João Brito de Sousa
*

1.
*

Eu tenho uma luz que clareia o olhar

Que cego nasci e cego tenho andado

Mas vou-me encostando bocado a bocado

Assim prosseguindo livre e a cantar
*


Cá dentro nasceu-me este mundo sem par

Com aves voando mais o seu trinado

Um céu com estrelas muito iluminado

Os corgos correndo directos ao mar
*


A cegueira à volta não deixava ver

Cá dentro gerou-se toda a claridade

Que engrandece a vida e me faz viver
*


Com sonhos libertos que me traz a idade

Tantos afazeres dentro do meu ser

Que me enchem a vida de felicidade
*

Custódio Montes
***


2.
*

"Que me enchem a vida de felicidade",

Tanto quanto baste para qu`rer vivê-la

Sem baixar os braços, sem desistir dela

E sem erguer nela templos à saudade
*


Que o tempo não pára, pronto se me evade

Não me dando espaço para o que ergo nela...

Insisto, contudo! Não me prende a trela

Da cegueira imposta, nem da validade
*


Do meu corpo gasto, que eu não tenho idade

Se escrevo ao compasso desta liberdade:

Galopa, galopa, cavalo sem sela,
*


Vai galgando as ruas da minha cidade

Que quando te esgotes, corre uma amizade

A dar-te uma força, a abrir-te a cancela!
*


Mª João Brito de Sousa

23.07.2022 - 10.45h
***


3.
*

“A dar-te uma força, a abrir-te a cancela”

E a palavra avança segue o seu caminho

Há-de haver quem tenha por ela carinho

Já que na escrita fica sempre bela
*

 

E iluminada posta sobre a tela

Exposta em soneto dentro dum livrinho

Alegra em casa e também ao vizinho

Caminha no mundo já fora da cela
*


Em cada paragem vai ser admirada

Já que a palavra bem feita e tratada

Enriquece a história para sempre fica
*


E vai-se a cegueira que aparece luz

Traz o raciocínio, riqueza produz

E a vida prossegue cada vez mais rica
*

Custódio Montes

2.7.2022

***

4.
*

"E a vida prossegue cada vez mais bela"

Quando iluminada por essa luzinha

Que assim que se acende, connosco caminha

Ainda que sendo pequena e singela
*


Como esta que emana da chama da vela

Que derrama aromas nesta sala minha

E que sempre acendo quando estou sozinha

Ou acompanhada, escrevendo na tela...
*


Seja a luz tão sábia e tão protectora

Que, à sombra, conceda uma ou outra hora

De repouso e pausa para os nossos braços
*


Que já percorreram tantas longas milhas

Quantos, no planeta, há de atóis e de ilhas,

Dos profundos mares, milenares terraços.
*

 

Mª João Brito de Sousa

23.07.2022 - 15.15h
***


5.
*

“Dos profundos mares, milenares terraços”

Por onde se anda sempre a divagar

Ou em pensamentos ou a imaginar

Lançando poemas por esses espaços
*


Que somos poetas sem ter embaraços

Compomos palavras no vento e no mar

Com sonhos de amor porque é tão bom amar

E com amizade mandamos abraços
*


A luz que ilumina o nosso pensamento

De dentro promana e é complemento

De toda a magia que dentro irradia
*


E por cá andamos de dia e ao sol posto

Com contentamento a poetar com gosto

Canções que nos trazem enorme alegria
*


Custódio Montes

23.7.2022
***

6.
*

"Canções que nos trazem enorme alegria"

E mais um lampejo da luz que acendemos

Ao juntar os versos com que entretecemos

Uma nova c`roa, como por magia...
*


Metade amizade, metade poesia,

Já cresce a estrutura... Tanto já fizemos!

Nesta nossa barca, ninguém pousa os remos,

Nem nas horas mortas da maré vazia!
*


Mas "depressa e bem" traz sempre um senão:

Queimei o arroz que apurava ao fogão...

Paciência! Que importa s`inda lhe aproveito
*


Quanto baste para uma refeição?

Não me importo nada, garanto que não:

Sou eu quem o come, com ou sem defeito!
*

 

Mª João Brito de Sousa

23.07.2022 - 16.40h
***

7.
*

“Sou eu quem o come, com ou sem defeito”

Eu como de tudo pois tenho vontade

Não falta apetite na realidade

E com um bom copo mais eu me deleito
*


Ao vir para a mesa tudo aproveito

Sou de boa boca sem sobriedade

Como a minha parte sem dificuldade

E durmo a sesta logo que me deito
*


Se o arroz se queima acompanho com pão

Deito algum na sopa sem complicação

E com o presigo o como também
*


E para além disso, fosse eu cozinheiro

Cozia o arroz em novo braseiro

Lavando a panela de novo e bem
*

Custódio Montes

23.7.2022
***

8.
*

"Lavando a panela de novo e bem",

Braseiro não tendo, vou-me contentando

C`o fogo que tenho - eléctrico e brando -

Que, apesar de brando, esturrica também...
*


A culpa foi minha, que culpa não tem,

O pobre aparelho, de eu estar poetando

Em vez de, aprumada, o ficar vigiando,

Mexendo o "risotto" e virando o acém...
*


Da próxima vez, não vou ser descuidada,

Nem virei prá sala até estar terminada

Refeição que tenha já posto no fogo...
*


Isto afirmo agora que estou bem escaldada,

Mas dentro de dias, de novo olvidada,

Não juro cumprir esta regra do jogo...
*

 

Mª João Brito de Sousa

23.07.2022 - 17.55h

***


9.
*

“Não juro cumprir esta regra do jogo...”

Mas falhamos sempre que temos um gosto

Assim como digo, consigo aposto

Que diz isso agora mas não o faz logo
*


Faço-lhe uma aposta que aceite, lhe rogo,

Ao ter muita fome, visível no rosto,

Com o tacho ao lume com conduto posto

Vá para a cozinha e acenda o fogo
*


Com a sua pressa de me responder

Ao ver meu soneto o seu vai fazer

Indo para a sala. Quando acabar
*


Lembra-lhe a panela que deixou ao lume

Mau cheiro inala e, como de costume,

Deixou o conduto de novo queimar
*

Custódio Montes

23.7.2022
***

 

10.
*

"Deixou o conduto de novo queimar",

Diz-me com tal graça que a rir me deixou

Tanto e de tal forma que se me olvidou

Um verso oportuno que pensara usar...
*


Aceito essa aposta que, sei, vou ganhar

Já que prá cozinha, de novo, não vou:

Comerei aquilo que já se queimou,

Não corro mais riscos de o arroz "bispar"...
*


Mas onde a luzinha que connosco estava?

Dela me esqueci enquanto gargalhava,

Mas penso que ainda lhe sinto a presença...
*


Ei-la aqui tingida de cores informais,

Sorrindo às apostas concretas, banais,

Que agora fizemos... sem sombra de ofensa!
*


Mª João Brito de Sousa

23.07.2022 - 19.05h
***

11.
*

“Que agora fizemos …sem sombra de ofensa”

Mas nestas apostas falámos do assunto

Que as nossas ideias em todo o conjunto

A luz pressupõem na sua presença
*


A ideia que chega e que a gente pensa

Não é luz acesa? Isso eu lhe pergunto

E o que nós dissemos é tema adjunto

É isso que penso com sua licença
*


A gente interpreta o seu interior

Pensamos a ideia, damos-lhe valor

Falamos connosco sentimos a vida
*


Voltamos à ideia, torna-se evidente

E assim cá dentro sinto-me contente

A cegueira acaba que vai de vencida
*


Custódio Montes

23.7.2022
***

12.
*

"A cegueira acaba que vai de vencida"

E em boa verdade, tem toda a razão

Pois nascem ideias da tal reflexão

Que nos ilumina. É verdade sabida!
*


Mas a nossa cr` oa, de improviso urdida,

Requer outra garra a que chamo paixão

- talvez raciocínio que ande em foguetão... -,

Veloz como a luz a que demos guarida!
*


Assim a Paixão e a Razão, de mãos dadas,

Tornarão mais belas estas caminhadas

De versos amigos e conversadores
*


Que se entreajudam se a Musa vacila:

Bem certo é que caia uma c`roa que oscila,

Que anda aos solavancos, que nem tem valores...
*


Mª João Brito de Sousa

23.07.2022 - 21.00h
***

13.
*

“Que anda aos solavancos, que nem tem valores...”

E quer que concorde? Não sei se o faça

Que assim o fazendo ninguém leva a taça

Nem nesta coroa seremos doutores
*


E eu que pensava receber louvores

Se assim pensarmos não teremos graça

E a nossa coroa resvala em desgraça

E de ouvir teremos outros professores
*


Ao ter eu pensado ver a claridade

Na luz que me vinha dar felicidade

Afinal não soube erguer este meu canto
*


Mas revendo agora o que se escreveu

Se é mau o meu canto bonito é o seu

E ao lê-lo de novo nele encontro encanto!
*

Custódio Montes

23.7.2022
***

14.
*

"E ao lê-lo de novo nele encontro encanto",

Tal como eu encontro que aquilo que disse

Foi que, solitária, seria tolice

Criar esta c`roa, tecer-lhe este manto
*


E a dois, este pouco, transforma-se em tanto

Que os versos redobram de tagarelice

E escrevo as ideias antes que as previsse:

Isto quis dizer, isso eu lhe garanto!
*


Luminosa e estável se encontra a coroa

Que está quase pronta e que muito bem soa

Ao humano ouvido que a queira auscultar
*


E embora alguns versos se riam à toa

- tonteiras que sei que o leitor me perdoa -,

"Eu tenho uma luz que clareia o olhar" !
*

 

Mª João Brito de Sousa

23.07.2022 - 23.00h
***

ESSÊNCIA.jpg

19
Jul22

RAZÃO - Mª João Brito de Sousa e Laurinda Rodrigues

Maria João Brito de Sousa

O SONO DA RAZÃO PRODUZ MONSTROS - GOYA (1).jpg

"O SONO DA RAZÃO PRODUZ MONSTROS"

Francisco de Goya

***

RAZÃO - Coroa de Sonetos

*
Mª João Brito de Sousa e Laurinda Rodrigues
*


1.
*
Chegaste escondida nas asas do tempo:

És ré sem sentença nem culpa formada

E germe da força que (in)gere o talento

Duma humanidade confusa e cansada
*


Encontro-te sempre. Não te oiço um lamento

Que a raiva - até ela! - se quer registada

Num ficheiro próprio e num só documento

Conquanto te nasça por tudo e por nada...
*


Chegaste e provaste de todos os frutos:

Exultaste os partos, choraste os teus lutos,

Sonhaste os teus sonhos, lavraste o teu chão...
*

 

Hoje destronada, Razão que aqui canto,

Quem ousa remir-te envergando o teu manto

Que sempre foi pródigo e fértil, Razão?
*

 

Mª João Brito de Sousa

16.07.2022 - 12.40h
***

Gravura de Francisco de Goya
***

2.
*

"Que sempre foi pródigo e fértil, Razão?"

um manto de luz pejado de estrelas

ou apenas triste, magra escuridão

que nem tua Musa se oferece p'ra vê-las.
*


Porquê tanto encómio na mente/razão

se ela funciona, em nós, como trelas

prendendo o sentido da nossa emoção

que ela se nega demais por contê-las?
*


Razão, ó razão, que és "razão pura"

não estragues dos versos a linda figura:

deixa extravasar o medo de Ser!
*

Porque, sendo mente, és pura estrutura

pejada da história que vem da cultura

e vai perseguir-te, depois de nascer.
*

Laurinda Rodrigues
***

3.
*

"E vai perseguir-(me) depois de nascer",

Sem medos, que medo não sinto... que queres?

Seduzem-me os monstros que deito a perder

No poço sem fundo dos fracos prazeres...
*


À Razão não perco e pretendo-a manter

Dialéctica eterna dos meus afazeres...

Não a quero pura nem estática ver,

Porque ela só pára se a não entenderes
*


E viva se espelha nas mãos proletárias,

De maneiras tantas, de formas tão várias,

Que os seus belos frutos sempre irão brotar
*


Ao longo de ramas reais, necessárias

Às almas obreiras e extraordinárias

Que entendem ser justo a Razão resgatar.

*

Mª João Brito de Sousa

18.07.2022 - 13.08h
***

4.
*

"Que entendem ser justo a Razão resgatar"

e dar-lhe o estatuto de criatividade

mesmo que, depois, a mente larvar

só produza ideias da posteridade.
*


Ó ervas daninhas, crescidas no ar,

da vossa presença não tenho saudade.

Quero enlouquecer e me apaixonar

sem ter normativos de terceira idade.
*

 

E, como uma onda, cobrir os sentidos

de torpes palavras e agudos gemidos

deixando na terra o gosto das águas...
*


Talvez sejam gestos, há muito esquecidos

em sono acordado de sonhos dormidos,

de uma alma insana nascida de mágoas.
*

Laurinda Rodrigues

***
5.
*

"De uma alma insana nascida de mágoas"

Nasceram dif`rentes posturas de classe:

Conspira o burguês, cria montros e fráguas

Que amansem "proletas", vencendo esse impasse
*

 

Cruzam-se os seus barcos. Vão mansas as águas...

Tão só de aparência pois quem as olhasse

Sondando o que cresce para além das tábuas,

Veria o que eu vejo... e talvez não gostasse...
*


Mas para que o saibas, aqui te confesso

No Pós-Modernismo ter visto progresso...

Cresci seduzida por ele. E contudo,
*


Amadurecida, só vi retrocesso...

Ser escriba ou poeta é todo um processo

De talento - é certo! - mas também de estudo.
*


Mª João Brito de Sousa

18.07.2022 - 16.50h

***

6.
*

"De talento - é certo! - mas também de estudo"

criaste teu espírito de Razão letrada.

Eu só partilhei o cinema mudo

onde todo o gesto é gesto de fada.
*


Percebo, no entanto, um pouco de tudo,

um tudo de tudo, um tudo de nada...

e, sempre sonhando, eu nunca me iludo

nem às frustrações eu fico fixada.
*


Se o mundo se arroga o Ser da Razão

deixando que morra o amor e a paixão

que sempre fecunda a terra e o mar,
*

 

Sempre gritarei ao outros meu "não"

por quererem impor essa reclusão

que a Razão impõe, em vez de sonhar.
*

Laurinda Rodrigues
*

7.
*

"Que a Razão impõe, em vez de sonhar"?

És tu quem o diz, que eu nunca o diria,

Já que é pelo sonho que me hei-de guiar

De dia e de noite, de noite e de dia
*

 

E à Razão, coitada, querem-na enterrar

Com sonhos e tudo, junto à mais-valia

Da mão que trabalha pra pouco ganhar

Que o grosso do lucro alimenta a avaria...
*

 

Em boa verdade te digo e repito

Estar ela em extinção neste mundo em conflito

Por ser dela o sonho que se concretiza
*


E tudo isto é fruto de um esquema, de um mito,

Que a quer difamada para que o aflito

Não saiba nem sonhe quanto idealiza!
*


Mª João Brito de Sousa

18.07.2022 - 20.30h

***

8.
*

"Não saiba nem sonhe quanto idealiza"

é imperativo do Código que indica

as razões do jogo, que o jogo precisa

p'ra salvar o Ego, de que nunca abdica.
*


É tal sua força, que julgo exterioriza

que tem de enfrentar o medo, que fica

quando, à noite, só e triste, precisa

dessa mão e colo que o dulcifica.
*


Somos todos sábios e néscios na vida

a querer desvendar sentido à partida

p'ra morte que chega, nunca com razão...
*


E usamos a história, que foi muito lida,

contando o segredo e a mágoa da ferida

por termos matado nosso coração.
*

Laurinda Rodrigues
***

9.
*

"Por termos matado nosso coração",

Dirão alguns néscios e sábios em coro

Não compreendendo que foi a Razão

Que foi despojada da c`roa de louro
*


E logo enterrada em três palmos de chão

Pela burguesia sedenta do ouro,

Senhora da guerra que actua à traição

E nos manipula sem qualquer decoro
*


Não vês que anda o mundo cego e tresloucado,

Que tudo confunde, virtude e pecado,

E que andam os pobres cada vez mais pobres,
*


Que embora pulsando num peito estouvado,

Nem um coração foi detido e julgado

Em nome de causas que se afirmam nobres?!
*

 

Mª João Brito de Sousa

19.07.2022 - 09.10h
***

10.
*

"Em nome de causas que se afirmam nobres",

a Razão declara submissão e paz,

com promessas vãs que sempre descobres

estar pr'além daquilo de que se é capaz.
*


Assim divididos um e outro, encobres

que a sua verdade é mentira e jaz

entre a multidão de ricos e pobres

que acabam iguais, quando a morte apraz.
*


Em nome da honra e do compromisso

brincas à Razão e invocas feitiço,

destino cruél que vem do Além.
*


Mas - ai! - já não escapas e acreditas nisso

pois é com palavras que a maldade atiço

em forma de medo, de raiva ou desdém.
*

Laurinda Rodrigues

***

11.
*

"Em forma de medo, de raiva ou desdém"

Respondes àquilo que serena exponho...

Qual de nós conhece tudo o que convém

Ao homem que cresce dentro do seu sonho?
*


Desdenha, enraivece... nada nos detém,

Nem sequer o monstro mais cru, mais medonho

Que afronte e desminta um homem de bem,

Redimido agora, jamais enfadonho
*


Desconheces, creio, que o capitalista

Destrói a Razão pra que ela desista

De ser ferramenta dos trabalhadores
*


Eu, que em mim a trago, tenho-a por benquista

Irmã do explorado, Musa do artista

E um alvo a abater, para os seus censores.
*


Mª João Brito de Sousa

19.07.2022 - 11.26h
***
12.
*

"E um alvo a abater, para os seus censores"

descobres na pele, nos nervos, Razão?

É Razão porquê, se são delatores

e, sem caridade, não estendem a mão?
*


Estarás a ser alvo de estranhos temores

de um planeta exangue, com fome de pão,

sem qualquer resposta de dias melhores

mergulhado apenas na destruição?
*


Nas minhas entranhas, é certo que sei

que todo o presente é fruto da lei

que já vigorou em tempos passados...
*


Não falo, nem escrevo, sobre aquilo que dei,

o que recebi, aquilo que esperei...

Apenas desejo novos seres alados.
*


Laurinda Rodrigues
***

13.
*

"Apenas desejo novos seres alados",

Ícaros - quem sabe? - com asas de cera,

Mais tarde ou mais cedo sendo castigados

Plos deuses irados do topo da esfera
*


Tal qual a Razão foi, por seus jurados

Sem escudo lançada na jaula da fera

De compridas garras, dentes afiados

E a ferocidade sem fim da quimera
*


Tu e eu, burguesas privilegiadas,

Temos perspectivas bem distanciadas:

"Nem guerra entre os povos, nem paz entre as classes!"
*


Sim, são bem bonitas essas tuas fadas,

Mas que sabem elas de bocas esfaimadas,

Dos povos sem terra e dos grandes rapaces?
*


Mª João Brito de Sousa

19.07.2022 - 15.00h
***


14.
*

"Dos povos sem terra e dos grandes rapaces"

sei mais do que pensam ou julgam pensar...

Nasci de outra vida em tempos fugaces

onde não havia Razão para cantar.
*


No entanto cantei, sem temer as classes,

brincando ao poder que quer dominar...

E, sendo mulher de poucos enlaces,

troquei-lhes as voltas e soube singrar.
*


De burguesa tenho poesia editada

que posso exibir, quando estou tentada

a jogar, com os outros, esse passatempo...
*


E, um dia, a Razão há-de estar parada,

abrindo-te as portas quando, p'la calada,

"chegaste(,) escondida nas asas do tempo".
*

Laurinda Rodrigues
***

 

 

 

 

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