Maria João Brito de Sousa
SONETO À "CHEF" *
(Sem jaleca, nem estrelinhas) *
Sim, já usei palas, uma em cada olho,
Mas uma jaleca com direito a estrela,
Nunca usei nenhuma, nunca pude tê-la
Por não saber como... bringir um repolho! *
Não tendo jaleca, estrelinhas não colho
Nem mesmo as que observo da minha janela;
Sou tão só poeta, escrevo à luz da vela,
Mal vou distinguindo espargos de restolho... *
Quem me faz um prato com este soneto
Sem peixe, sem carne, nem sabor concreto?
E acabo eu de ouvir que de um bom cozinhado *
Um "Chef" estrelado faria um poema...*
Que o faça, que eu provo! Salgou-lhe um fonema?
Faltou-lhe a mestria de um vate inspirado! *
Mª João Brito de Sousa
27.02.2022 - 12.00h
***
* Chef Óscar Geadas na finalíssima do programa MasterChef Portugal
publicado às 09:16
Maria João Brito de Sousa
Leia aqui, por favor
publicado às 09:23
Maria João Brito de Sousa
AQUI - Coroa de Sonetos *
Mª João Brito de Sousa e Custódio Montes
1. *
Aqui, cada parede é nervo e pele
E os livros que reli vezes sem fim
Vão sendo o pasto fértil do corcel
Que o verso monta quando sai de mim *
Aqui, a casa cumpre o seu papel
De irmã de pedra, de alma, de jardim
Ou berço improvisado por cinzel
Já transmutado em mão por ser assim... *
Se um alter-ego tenho, é este espaço
Que mais do que uma casa é um abraço
Que a Musa nunca hesita em partilhar *
Mas nem eu, nem a Musa voltaremos
A vislumbrar corcel no qual montemos
No instante em que esta Barca naufragar. *
Mª João Brito de Sousa
25.02.2022 - 12.00h
***
2. *
“No instante em que esta Barca naufragar”
Mas não vai naufragar que a tormenta
De vagas e mais vagas se alimenta
E no fim da tormenta vai vogar *
E ao irmos nesse barco a navegar
Estende-se a visão que nos aumenta
O gosto de viver e nos sustenta
A força que nós temos para andar *
E vejo, minha amiga, que alegria
Que lhe volta a visão e a mestria
E todo o brilhantismo a aparecer *
E ver a companheira sem estorvo
Voltar a poetar aqui de novo
Que bom e que alegria, que prazer… *
Custodio Montes
25.2.2022
***
3. *
"Que bom e que alegria, que prazer"
Direi também ao ver que me responde
Com a espontaneidade que não esconde
E sem outras desgraças conhecer... *
Vão afundar-me a Barca e vai doer...
Não sei exactamente quando e onde,
Mas minha Barca e tudo quanto a ronde
Está mais que condenada a perecer *
Saí da cirurgia e logo após
Fui confrontada com o facto atroz
Da iminência de perder a Barca *
Mas não quero afligi-lo, informo apenas
Que as horas, de tão poucas, são pequenas
E a minha inspiração vai sendo parca... *
Mª João Brito de Sousa
25.02.2022 - 14.12h *** 4. *
“E a minha inspiração vai sendo parca….”
Mas não lhe correu bem a cirurgia
Que nos trouxesse a nós essa alegria
E a beleza e o tom da sua marca ? *
A amiga é sem dúvida a monarca
No reino do soneto e poesia
Que vendo mesmo pouco é na mestria
Aquela que entre nós mais longe abarca *
Espero, faço votos, tenho crença
Que ultrapasse bem rápido a doença
E volte para nós em plenitude *
E que o mal que na vista hoje traz
A deixe sossegada, a deixe em paz
E volte, amiga, cheia de saúde *
Custodio Montes
25.2.2022 *
5. *
"E volte, amiga, cheia de saúde"
Diz-me o amigo sem sequer sonhar
Que muito em breve ficarei sem lar
Ainda que a visão agora ajude... *
Sim, sim, coloco as gotas amiúde,
Mas tenho o outro olho por op`rar
Com raios laser para eliminar
Uma camada opaca como grude *
Mas não, não é por isso que estou triste,
Nem é por isso que a Musa desiste
De dar-me uma mãozinha enquanto escrevo *
Esta tristeza é quase um desespero
Que me domina a escrita e que é sincero;
Não poderei pagar algo que devo. *
Mª João Brito de Sousa
25.02.2022 - 17.10h
***
6. *
“Não poderei pagar algo que devo”
A quem tanto educa e tanto ensina
Mas essa há-de ser a minha sina
Que nunca pagarei com o que escrevo *
Eu quando escrevo, escrevo com enlevo
Mas não tive o condão de quem opina
Com o saber profundo e a doutrina
De quem desde menino tem relevo *
E não me deixe só com minha musa
Que ela é preguiçosa e não usa
O que a sua lhe dá em profusão *
Quero o seu desafio permanente
Para que eu me sinta mais contente
E force a minha musa a dar-me a mão *
Custodio Montes
25.2.2022 ***
7. *
"E force a minha musa a dar-me a mão"
Ainda que na rua e sem abrigo
Me encontre exposta ao frio e ao perigo
Duma morte por pura inanição? *
Mas já me fez sorrir e há gratidão,
Imensa gratidão no que lhe digo
Ainda que não creia, qu`rido amigo,
Que compreenda a minha situação. *
Mas avancemos porque há pormenores
Que mais me doem do que as próprias dores
Nos quais não quero agora nem pensar *
E com alguma sorte talvez morra (rsrsrsrs...)
Antes de ser lançada na masmorra
Dos que não têm casa pra morar *
Mª João Brito de Sousa
25.02.2022 - 18.45h ***
8. *
“Dos que não têm casa para morar”
Eu digo mal da sorte e tenho pena
Mas a amiga tem casa e casa amena
Muito bem situada em frente ao mar *
E quando faz poemas, ao olhar
A vista alarga ao longe bem serena
E enche-se de brio e força plena
Ao vir a sua musa e poetar *
Que belo ver os barcos sobre as ondas
Embrulhando-se alegres bem redondas
E ouvir o seu som e o seu bater *
Tem casa onde mora e bem rica
E porque nela mora, nela fica
Assim o profetizo e tem que ser *
Custodio Montes
25.2.2022 ***
9. *
"Assim o profetizo e tem de ser"
E eu, querendo que assim seja, nem replico,
Antes sinto das ondas o salpico
E fecho os olhos para o receber *
Mais tarde pensarei no que fazer
Que agora é pelas ondas que me fico
E enquanto uma sopita depenico
Penso que bom que é voltar a ver! *
À minha Musa, julguei-a perdida
E ela voltou embora combalida...
Por vezes nem eu mesma a reconheço *
Porque ora se retira desistente,
Ora volta aguerrida e, de repente,
Mede em estatura bem mais do que eu meço... *
Mª João Brito de Sousa
25.02.2022 - 20.00h
***
10. *
“Mede em estatuto bem mais do que eu meço”
Por isso, continua sem parar
Olhando o Tejo e a ver o verde mar
Com rápidos poemas de sucesso *
E eu, ao ver-lhe o estro, até lhe peço
Que ajude assim o meu a melhorar
Para ver no poema um versejar
Que tenha em sua senda algum acesso *
Olhando e vendo-a ir pelo caminho
Aguço o meu engenho um pedacinho
E fico bem melhor ao vê-la a ela *
Eu sinto esse canto, ouço-o bem
Gostava de cantar assim também
Com essa melodia alegre e bela *
Custodio Montes
25.02.2022
*** 11. *
"Com essa melodia alegre e bela"
Também a sua Musa vai cantando
E sei que à minha Musa convidando
Para cantar com ela e para ela :) *
Aqui, a minha casa é barco à vela
E se esta a Barca é Onde, o Mar é Quando;
Vão-se as coisas, aqui, transfigurando
Conforme acontecia em tinta e tela... *
A palmeira e as plantas suculentas
Falam comigo e ficam muito atentas
Aos gestos das mãos magras e doridas *
Que aspergem água prás dessedentar
E de manhã bem cedo, ao acordar,
Sussurram-me palavras nunca ouvidas... *
Mª João Brito de Sousa
25.02.2022 - 21.41h ***
12. *
“Sussurram-me palavras nunca ouvidas…”
De certeza, de sonhos encontrados
Que vieram na noite transportados
Por versos amenos induzidos *
E as palmeiras e os campos coloridos
Sobre o mar, sobre o Tejo espelhados
Trouxeram ao dormir, versos rimados
Com palavras e com sons nelas vertidos *
Por isso, essas palavras encantaram
Seus ouvidos que nunca as escutaram
Trazendo-lhe depois inspiração *
Muito bem, que a quero aplaudir
Agora, ao me deitar, que vou dormir
Manifestando a minha admiração *
Custodio Montes
35.2.2022 ***
13. *
"Manifestando a minha admiração"
É de alegria, espanto e amizade
Que me encho quando o leio e na verdade
Já não sinto nem sombra de aflição... *
Descanse amigo que eu não posso, não,
Deitar-me agora que o sono me invade
E afasto o sono à custa da vontade
De pôr as gotas no meu olho são... *
À meia noite em ponto há-de soar
O alarme do relógio a recordar
A hora exacta da medicação *
E não quero que os olhos ensonados
Se fechem e se esqueçam dos cuidados
Que me impõe a recente operação *
Mª João Brito de Sousa
25.02.2022 - 22.56h ***
14. *
“Que me impõe a recente operação”
Deixe lá que a não torno a maçar
Que a coroa está quase a terminar
Terminando também nosso serão *
Mais uns versos a ter em atenção
Agora que voltei a acordar
Para ver se consigo completar
Os versos que aqui me ficarão *
O sono já vem vindo bem depressa
Mas eu hei-de cumprir esta promessa
Sem que venha Morfeu e me interpele *
Estou atrapalhado e não consigo
E vejo em cada canto só perigo
"Aqui, cada parede é nervo e pele" *
Custodio Montes
25.2.2022 ***
publicado às 09:10
Maria João Brito de Sousa
AQUI *
Aqui, cada parede é nervo e pele
E os livros que reli vezes sem fim
Vão sendo o pasto fértil do corcel
Que o verso monta quando sai de mim *
Aqui, a casa cumpre o seu papel
De irmã de pedra, de alma, de jardim
Ou berço improvisado por cinzel
Já transmutado em mão por ser assim... *
Se um alter-ego tenho, é este espaço
Que mais do que uma casa é um abraço
Que a Musa não resiste a partilhar *
E nem eu, nem a Musa voltaremos
A vislumbrar corcel no qual montemos
No instante em que esta Barca naufragrar. *
Mª João Brito de Sousa
25.02.2022 - 12.00h
publicado às 12:05
Maria João Brito de Sousa
NOTÍCIAS *
Queridos amigos e camaradas, a minha cirurgia à catarata do olho direito será efectuada já na próxima quinta-feira.
Como tenho uma infinidade de consultas e exames, a partir de hoje e durante toda a corrente semana não é provável que consiga marcar presença nos blogs, no FB e no HP pois estarei todas as manhãs e uma boa parte das tardes no hospital.
Um GRANDE abraço para todos vós!
Mº João
publicado às 07:10
Maria João Brito de Sousa
3. *
“Te cubro inteiro quando estou feliz”
Mas na tristeza, claro, também quero…
Ouvi a entrevista e reitero
A beleza de ser um aprendiz *
Se é tarde muito tarde não se diz
Que mesmo nesta idade ainda espero
Que a musa nos afaste o desespero
E nos dê outro rumo e directriz *
Viver, viver, viver com alegria
Ouvir um canto mestre e a magia
De circundar o mundo sem problema *
Andar pelo mar dentro, amar o Tejo
Ter em cada palavra um desejo
Girarmos sempre envoltos no poema *
Custódio Montes
11.2.2022 ***
4. *
"Girarmos sempre envoltos no poema",
Irmos aonde o sonho nos levar,
Subirmos às alturas e pousar
Com elegância e sem que a voz nos trema *
Na segurança de um qualquer fonema
Que surja sem sequer nos avisar;
Nada me seduz mais que improvisar,
Ainda que enfrentado algum dilema... *
Abracemos a Vida enquanto há vida
Pulsando em nós enquanto a nós rendida;
Nenhum de nós pediu a eternidade, *
Nenhum de nós quer mais do que poder
Abraçar cada verso que nascer
Deste exercício da nossa amizade. *
Mª João Brito de Sousa
11.02.2022 - 14.40h ***
5. *
“Deste exercício da nossa amizade”
Há-de resplandecer a nova aurora
Quebrando a escuridão que noite fora
Encobre mais e mais a claridade *
Que o verso é só amor, é irmandade
É lágrima que sai e que se chora
Mas sem mágoa…alegria protectora
Carinhosa lembrança na saudade *
Limites não os há e continua
A noite, o dia, o sol e mesmo a lua
E esta discussão tão criativa *
Recuso-me a viver sem a palavra
Sem ela tudo morre tudo acaba
E no poema a gente encontra a vida *
Custódio Montes
11.2.2022 *** 6. *
"E no poema a gente encontra a vida"
Que o mundo tantas vezes nos recusa
E quando a dor emerge, há sempre a Musa
Que mitigando a dor nos cura a ferida *
E ela virá, ousada e decidida,
Pra retocar a estrofe, se confusa,
Ou pra tomar as rédeas, que ela abusa
E às vezes faz do verbo uma corrida... *
Sem a palavra também eu não sei
Se sobreviveria ao que enfrentei;
Nela pus toda a força que me resta *
E sem abraços destes... que tristeza!,
Bem mais me pesaria esta pobreza
Se nos abraços fosse mais canhestra. *
Mª João Brito de Sousa
11.02.2022 - 17.10h ***
7. *
“Se nos abraços fosse mais canhestra”
Mas não é, porque os gestos nada são
Se neles não couber a emoção
Que se define ao vir e nos sequestra *
Não basta a conferência e a palestra
Faz falta revelar-se o coração
E termos no amigo um irmão
E ver em si, amiga, uma mestra *
Por isso, dei-lhe o abraço merecido
E ao tê-lo aceite fico agradecido
Que até me respondeu mesmo doente *
Paremos por aqui esta coroa
Para voltar a ela estando boa
E regresse depressa e mais valente *
Custódio Montes
11.2.2022 ***
8. *
"E regress(o) depressa e mais valente" :)
Que menos treme agora a minha mão
E já bate a compasso o coração
Que há pouco latejava loucamente *
Temi que rebentasse de repente
De espanto, de surpresa e comoção
Por saber que a ansiada operação
Se irá realizar tão brevemente... *
Agora, entre contente e receosa,
Conquanto a Musa penda para a prosa,
Devolvo à Poesia o nosso abraço *
Ela virá depois, conheço-a bem,
Atrás do ritmo que o poema tem;
Nunca resiste a Musa ao seu compasso! *
Mª João Brito de Sousa
11.02.2022 - 21.10h ***
9. *
“Nunca resiste a musa ao seu compasso”
Ainda bem. Então, continuamos
Que enquanto nesta azáfama andamos
Damos continuidade ao nosso abraço *
Enchemos a coroa espaço a espaço
Florimos o caminho e atapetamos
E quando para ela nós olhamos
Sentimo-nos alegres, sem cansaço *
E tem-se mesmo até a ilusão
Que a doença se foi e o corpo são
Renova como o faz a primavera *
E volta a alegria e até se pensa
Que se foi a moléstia e a doença
E volta a gente a ser como antes era *
Custódio Montes
11.2.2022 ***
10. *
"E volta a gente ser como antes era"
Pois se em verdade uma criança houver
Em cada um de nós, pode até ser
Que esteja a Primavera à nossa espera *
Onde o verso renasce e prolifera
E ao verbo aponta o rumo que entender...
Se assim for por instantes, quero crer
Ser gentil, ser graciosa e ser sincera *
A criança que nunca envelheceu
Que mora em nós, que (somos?) tu e eu
Neste abraço e nos tantos que já demos *
Mas se um de nós afirma que a perdeu
Algures, num tempo em que a desconheceu,
Não a perdeu um só, que os dois perdemos. *
Mª João Brito de Sousa
12.02.2022 - 00.20h ***
11. *
“Não a perdeu um só, que os dois perdemos”
Isso só em hipótese poética
Que lendo-se o que diz, a sinalética
Indica que um e outro a mantemos *
Velhos são os trapos bem sabemos
E seguindo o discurso, a dialética
Entendo que nem mesmo em fonética
A criança que fomos já não temos *
Quem anda por jardins a colher flores
Tem dentro da sua alma só amores
E é com eles que pula e que avança *
O inverno há-de vir mas não chegou
E não chega a quem tanto sempre amou
Que não mais deixará de ser criança *
Custódio Montes
12.2.2022 *** 12. *
"Que não mais deixará de ser criança"
Quem de velho e menino cultivar
O melhor que um e outro possam dar
De alegria, de espanto e de confiança *
A que se vem juntar serena a esp`rança
(a última a morrer, a primeira a lutar),
Que viver, meu amigo, é conquistar
Dentro de nós o que a vontade alcança *
E se a vontade pede, de repente,
Humano abraço que aproxime a gente
Dessoutra gente que abraçar não sabe *
Faça-se-lhe a vontade que a Amizade
É transversal a toda a humanidade
E não há monstro que com ela acabe! *
Mª João Brito de Sousa
12.02.2022 - 11.50h ***
13. *
“E não há monstro que com ela acabe”
Sim, era o que faltava que acabasse
Porque quando a amizade terminasse
Como seria o mundo ? Não se sabe *
Havia em toda a parte o seu entrave
A raiva, como o ódio, era impasse
Sem respeito algum por cada classe
Com as portas trancadas e sem chave *
Mas ao falar sentimos a amizade
Como há dias senti, com claridade,
Nessa entrevista dada eu me enlaço *
Gostei bem do que é e da razão
De ter o Tejo e o mar no coração
Por isso, lhe renovo o meu abraço *
Custódio Montes
12.2.2022 *** 14. *
"Por isso lhe renovo o meu abraço"
Que recebo e, sentindo-me abraçada,
Um outro lhe devolvo alvoroçada;
Mais forte é a amizade que o cansaço *
E vence esta amizade um longo espaço
Transformando um ecrã numa jangada,
Numa canoa ou numa barca alada,
Consoante a destreza do meu traço... *
Ao longe, junto à praia, uma gaivota
Parece ter escolhido a mesma rota,
Talvez nesse teu cais venha a pousar... *
Perco-lhe o rasto, fica-me o talvez,
E em cada Abraço/Fado português
"O Tejo passa em frente para o mar"... *
Mª João Brito de Sousa
12.02.2022 - 16.10h ***
publicado às 11:03
Maria João Brito de Sousa
Comprove aqui
publicado às 11:08
Maria João Brito de Sousa
Às 17 horas de Brasília /20 horas de Portugal continental,
VIDEO
publicado às 13:06
Maria João Brito de Sousa
SEM TÍTULO IV *
Deram-lhe o Futuro dentro de um pacote
De cartão prensado em forma de esfera
No topo enfeitada por um laçarote,
Por dentro vazia pra guardar-lhe a espera *
Deram-lhe o embrulho, negaram-lhe o dote,
Por isso o poeta não soube que o era;
A Musa agastada recusou-lhe o mote
E afastou-se à pressa, tal qual duma fera *
Estivesse fugindo, em vez de um poeta
Prestes a queimar-se como borboleta
Que ao tocar na chama julgasse salvar-se *
Aguarda o poeta que tão só pondera,
Mas em vão aguarda que se não supera;
Não conhece a dor, nem faz a catarse. *
Mª João Brito de Sousa
08.02.2022 - 13.30h ***
publicado às 14:35
Maria João Brito de Sousa
ENSAIO SOBRE
A CEGUEIRA *
Coroa de Sonetos *
Mª João Brito de Sousa e Custódio Montes *
1. *
Num rio de uma gota, numa gota só,
Viriam banhar-se a mulher de vapor,
O homem sem corpo, sem suor, sem dó,
E a dor sem tamanho de quem não tem dor *
De quem foi esmagado pela grande mó,
De quem foi comprado por nenhum valor
Que a realidade, se desfeita em pó,
Ao vendar-te os olhos, lança-te em torpor *
E eu, inda que cega, rasgo essoutra venda
De rosada seda rematada a renda,
Entro nas fileiras da luta de classes *
Que também tem sonhos, ideais concretos
Que são bem mais belos mas que estão repletos
Da crua dureza dos grandes impasses. *
Mª João Brito de Sousa
05.02.2022 - 14.15h *** 2. *
“Da crua dureza dos grandes impasses”
A luta medonha que se vai travar
Difícil será mas temos que a ganhar
Contra quem nos rouba, malditos rapaces *
Se quando tu vias bem melhor olhasses
Agora bem vias só a recordar
Não vês o que queres mas imaginar
É mais criativo talvez te ultrapasses *
Que o ver vem de dentro lá da nossa alma
E ao trazê-lo à luz ganhar-se-á a palma
Se o que nós dissermos for lindo ao lê-lo *
Então nossos olhos por dentro rirão
Sentindo o poema com o coração
E mesmo não vendo vai senti-lo belo *
Custódio Montes
6.2.2022 ***
3. *
"E mesmo não vendo vai senti-lo belo"
E talvez entenda que é mais importante
Que essoutra beleza que há no Sete-Estrelo
Por muito que seja pungente e brilhante *
O "homem sem corpo" não saberá lê-lo
E a "mulher de nuvens" `stará tão distante
Que não mais verá que um ponto singelo,
Pequeno, ilegível e algo intrigante, *
Mas o operário da escura oficina
E o mineiro em risco nos túneis da mina,
Conseguirão lê-lo, irão decifrá-lo *
Sob a luz que é parca mas que os ilumina
E a vida que é dura mas que tanto ensina...
Quem os calaria se eu, cega, o não calo? *
Mª João Brito de Sousa
06.02.2022 - 12.30h ***
4. *
“Quem os calaria se eu, cega, o não calo?”
Ninguém, penso eu, o que diz é verdade
Mas eu continuo que a claridade
Tê-la sem os olhos é bem um regalo *
Paramos às vezes tendo um intervalo
E vemos as coisas com realidade
Com gosto acrescido e mais à-vontade
Não é tudo a vista melhor é pensá-lo *
A amiga bem sabe que ser-se pujante
Como é nos poemas de modo brilhante
É ser-se completa, uma grande artista *
Por isso, não deixe aqui tanto lamento
Que tudo o que escreve é um monumento
Pare, não lamente ter tão pouca vista *
Custódio Montes
6.2.2022 ***
5. *
"Pare, não lamente ter tão pouca vista";
Assim o farei porque alguma me resta
E à miséria, a essa, há quem não resista,
Que a miséria é dura, cruel e funesta *
Mas é necessário que o tema persista
Pois é a cegueira que o tema me empresta
Pra tecer a c`roa e pra dar-me uma pista
Sobre algo que dura, que humilha, que empesta *
O homem explorado sobre este planeta
Que tanto trabalha e tão pouco colecta;
Migalhas das mesas dos grandes senhores *
São tudo o que sobra e as sobras não bastam
Prós tornar pessoas. Assim pouco gastam
E são humilhados os trabalhadores! *
Mª João Brito de Sousa
06.02.2022 - 14.45h
6. *
“E são humilhados os trabalhadores”
E os que os humilham são todos tratantes
Uns são manda-chuvas, outros governantes
Que lhes levam tudo e armam-se em doutores *
Porque se sentissem todas essas dores
De pão não o terem nem outros sobrantes
De passarem fome e outros males restantes
Não seriam eles tão exploradores *
Mas prendem-se muito à sua avareza
Que nunca reparam em tanta pobreza
São homens avaros de toda a maneira *
Cegos, maltrapilhos são uma cambada
Pensam-se importantes mas não valem nada
Não vêem por perto com tanta cegueira *
Custódio Montes
6.2.2022 *** 7. *
"Não vêem por perto com tanta cegueira",
Só a si se vêem contando a riqueza
Que outros produziram numa vida inteira
De trabalho duro, de extrema pobreza *
Subindo a calçada, descendo a ladeira
De casa ao trabalho, do trabalho à mesa
Pra comer à pressa, talvez sem cadeira,
Um caldo apurado na lareira acesa... *
E, do outro lado, é tanta a abundância
Que nem causa inveja, causa repugnância
O imenso abismo que as classes divide *
Que sempre assim foi, dir-me-ão sorrindo
Os que estando "a meio" não o estão sentindo...
Mas o Povo, um dia, será quem decide! *
Mª João Brito de Sousa
06.02.2022 - 17.30h
***
8. *
“Mas o Povo, um dia, será quem decide”
O povo é cego ou então não quer ver
Prometem-lhe tudo mas já no poder
É só propaganda como o sabão Tide *
Mesmo assim o povo no erro incide
Apenas elege quem nunca vai ter
Pena da pobreza… quer enriquecer.
É assim o povo e nunca progride *
Vejo bem as coisas que eu não sou cego
O homem só quer alimentar seu ego
Dá pouca importância a cada irmão *
Não pensa na fome, não vê a miséria
Só pensa no corpo e na vil matéria
Às vezes sem alma e sem coração *
Custódio Montes
6.2.2022 ***
9. *
"Às vezes sem alma e sem coração"?
Só se ambos tiverem sido confiscados,
Que tudo nos levam (até a paixão!)
E eu, que sou povo, estou entre os visados... *
Não falei das urnas nem da votação,
Falei dos futuros povos libertados,
Dos que já caminham nessa direcção
Inda que tropecem nos erros passados *
Porque ao que foi escrito não retirarei
Nem uma palavra, pouco mais direi
Que o sono já pesa mais do que a vontade *
E assim desarmada, sonolenta e tonta,
Só diria coisas de pequena monta,
Só faria versos de má qualidade... *
Mª João Brito de Sousa
06.02.2022 - 22.30h ***
10. *
“E faria versos de má qualidade”
Se fosse outra gente vivendo no espaço
Lá longe lá longe sem desembaraço
Sem ter qualquer jeito nem ter liberdade *
Se a vejo a rimar com todo esse à vontade
Eu não acredito só se por cansaço
Tiver de parar. Já sei é o que faço
Paro e recomeço com fraternidade *
É sobre a cegueira que a coroa versa
Vamos ao assunto mude-se a conversa
Que siga o poema por sobre esse embate *
Doutra forma penso talvez, se calhar,
Quem a ler nos venha nos possa acusar
Que em vez de coroa se faz disparate *
Custódio Montes
6.2.2022 ***
13. *
"Que em vez de coroa se faz disparate"
E em boa verdade os faço amiúde
Se meio da frase ou no seu remate
Me falha a memória ou me falta a saúde... *
A Morfeu me oponho; que não me arrebate
Prá terra dos sonhos a que agora alude,
Que a Musa, mais forte, sobre mim se abate
E exige-me garra, lucidez, virtude... *
Assim me proponho não render-me ainda
À branca cegueira que não é bem-vinda
Porquanto os tercetos não estão terminados *
E se me proponho, não torço, nem cedo!
Tropeço, gaguejo, mas num arremedo
Termino sem gralhas nem ossos quebrados *
Mª João Brito de Sousa
07.02.2022 - 00.26h
***
12. *
“Termino sem gralhas nem ossos quebrados”
Então aproveito a sua correria
Por ver no poema tamanha alegria
Que se descortina nos versos rimados *
Fomos progredindo meios ensonados
Disse que parava até vir o dia
Foi-se-lhe a cegueira enquanto eu dormia
E só se enganou nos versos numerados *
O seu é o onze sendo o meu o doze
E só faz mais um e eu farei o catorze
Termina a coroa e acaba a cegueira *
Esta sugestão que agora aqui trago
Não é novo ensaio - o do Saramago
É cá entre nós mais uma brincadeira *
Custódio Montes
7.2.2022 ***
13. *
"É cá entre nós mais uma brincadeira"
Das nossas, humanas, que sabem a pouco...
Quem dera acabasse de vez a cegueira
E o mundo dos homens não andasse louco *
Com tanta clivagem, tanta roubalheira
E mil teorias que soam a ôco...
Porém, pouco a pouco - assim Homem queira! -,
Verá quem é cego, ouvirá quem é mouco! *
Não é nova a obra, nem nova é a tela
Que há mais de vinte anos pintei para ela,
Mas o que traduz é bem contemporâneo *
E eu, meio cega, ceguinha de todo
Não estou com certeza; bem vejo esse lodo
Que aspergem - disfarçam!- com "sprays" de gerânio *
Mª João Brito de Sousa
07.02.2022 - 10.50h ***
14. *
“Que aspergem - disfarçam!- com "sprays" de gerânio”
Não tem fim a luta que há muita ganância
“Eles comem tudo” não dão importância
Engordam o corpo sem nada no crânio *
Querem mostrar graça, mas em sucedâneo
Apenas ostentam muita ignorância
Olhando à volta com a petulância
De reles amigos do seu conterrâneo *
E à volta a miséria sempre a alastrar
Sem que a gente veja que vai acabar
Tudo mesmo tudo desfeito em pó *
Labutam os homens e é só miséria
A banhar-se em vida sem rumo sem féria
“Num rio de uma gota, numa gota só” *
Custódio Montes
7.2.2022
***
Tela de René Magritte
***
publicado às 15:03
Maria João Brito de Sousa
Um menino em duas quintilhas, aqui
publicado às 23:22
Maria João Brito de Sousa
ENSAIO SOBRE
A CEGUEIRA *
Num rio de uma gota, numa gota só,
Viriam banhar-se a mulher de vapor,
O homem sem corpo, sem suor, sem dó,
E a dor sem tamanho de quem não tem dor *
De quem foi esmagado pela grande mó,
De quem foi comprado por nenhum valor
Que a realidade, se desfeita em pó,
Ao vendar-te os olhos, lança-te em torpor *
E eu, inda que cega, rasgo essoutra venda
De rosada seda rematada a renda,
Entro nas fileiras da luta de classes *
Que também tem sonhos, ideais concretos
Que são bem mais belos mas que estão repletos
Da crua dureza dos grandes impasses. *
Mª João Brito de Sousa
05.02.2022 - 14.15h ***
publicado às 18:54