"CADA DIA É UMA ETAPA"
Tenha a bondade de ler aqui
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Tenha a bondade de ler aqui
SONETO A UMA "CHAMA QUE ARDE SEM SE VER"
*
Quem pode ver amor que arde invisível
se Amor se mostra avesso a definir-se
e se esconde e se mostra intraduzível
no instante em que começa a traduzir-se?
*
Se além, se muito além do que é tangível
pudesse o mesmo amor baixinho ouvir-se
nalgum murmúrio que tornasse audível
o silêncio que deixa ao despedir-se
*
Diríamos que Amor, sendo sensível,
passível de acender-se e consumir-se,
é comburente e chama e combustível...
*
Mas como poderá tanto exigir-se
se para a maioria é impossível
entrar em combustão e não extinguir-se?
*
Maria João Brito de Sousa – 25.06.2015 – 17.16h
*
(Ligeiramente reformulado)
Fotografia de António Pedro Brito de Sousa
NOS MEUS VERSOS, NOS TEUS DEDOS...
*
Nas aves que se soltam dos teus dedos
E pousam nos meus versos de poeta
Sondando e desvendando os seus segredos
Na sua intimidade mais secreta,
*
Nesse seu dedilhá-los, loucos, ledos,
Quando bem me sabiam ser discreta,
Devolvem-me antiquíssimos folguedos
E, por momentos, deixam-me completa.
*
Sondam-mos verso a verso, toque a toque...
Porquê fugir-lhes quando, não fugindo,
Mais versos nascerão sem que os convoque?
*
E por que não frui-los se, fruindo,
Mais rica fico? E basta que os evoque
Pra mais e mais humana me ir sentindo.
*
Maria João Brito de Sousa - Março, 2016
*
In A CEIA DO POETA - (inédito)
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Imagem - O meu pai, no seu escritório da casa de Algés,
fotografado pela minha mãe. 1950
SONHAR, SEM ASAS?
*
Sentar-me a vosso lado e estar calada,
Vendo o desabrochar das vossas rosas
Enquanto as mãos protestam, já nervosas
Por não criarem nada... mesmo nada?
*
Sonhar, senhor, debaixo da sacada,
Enquanto há estrofes livres, generosas,
Que definham até formarem prosas?
Sonhar pra quê, se a tal for condenada,
*
Se a minha solidão for posta em causa
E tudo o que me reste seja a pausa
Que, para mim, define um pesadelo
*
Tão denso, tão concreto como um muro?
Pra quê esboçar um sonho se, vos juro,
Que este vôo que enceto é tão mais belo?
*
Maria João Brito de Sousa - 07.08.2016 - 10.29h
Ao António Só, poeta.
"NO AMOR, CIRURGIÃO, NA TEMPESTADE, O RAIO"
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(Soneto em verso alexandrino)
*
"No amor cirurgião, na tempestade o raio",
Na poesia, ensaio em plena orquestração,
Às vezes equação, às vezes de soslaio
Reinventa-se catraio em trovas sem (es)cansão
*
E vai-se a solidão assim que abraça Maio...
Jamais será lacaio! Ainda que em tensão
Cumpre a sua função não sendo rei nem aio;
Corsário, se malaio, ou mero herói de acção
*
Será, sem solução, poeta até morrer;
Ainda que sem ver, muito embora cativo
Manter-se-á bem vivo, ousando renascer...
*
Mais não sabe fazer e ao passar, furtivo,
Passa a "ser criativo", em vez de apenas ser;
Porque se há-de esconder, se em verso é produtivo?
*
Maria João Brito de Sousa - 24.05.2021 - 10.00h
Ler aqui, por favor.
CONVOCATÓRIA
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Convoco-te, poema, em cada verso,
Em cada estrofe ainda não tecida,
Em cada afirmação, no seu reverso,
No sopro que conduz do verbo à vida
*
E sempre que comigo, em mim disperso,
Te encontro e vou moldando, já rendida,
Perder-te-ei depois, depressa imerso
Num mar cuja maré me traz perdida...
*
Porém, a sensação de, em tempo adverso,
Estar presa, acorrentada e sem saída
Num barco naufragado e já submerso
*
Quando olhada de frente foi vencida
Pela mão com que embalo o velho berço
Da dor que em cada verso é redimida.
*
Maria João Brito de Sousa - Março 2016
In A CEIA DO POETA (inédito)
“E” de EPHEMERA
*
Estranho este escuso embrionário estado
Entre eras estendendo-se enlaçadas:
Esculpo-me em estanho, estranho-me estanhado
E endosso. Ensaio. Efeitos. Embrulhadas...
*
Encómios evoquei. É-me (n)egado
Expor-me entre eros e ébrios. Ensonadas,
Esperam-me esporos do etéreo, estipulado
E encontro exaltações exacerbadas...
*
Escondo o ego esculpido. Enrodilho-me,
Excluo “esses” e “erres”: estribilho-me
E expurgo eternos erros (d)e escansão
*
Especializada em estrelas, ecos, entes,
Executo estratégias (d)e eloquentes
E emancipo-me em “E” (d)e Evolução.
*
Maria João Brito de Sousa – 05.08.2018 – 16.30h
***
ACRÓSTICOS A FLORBELA ESPANCA
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Primeiro poema gentilmente cedido pelo seu autor, o poeta José Manuel Cabrita Neves.
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ACRÓSTICO
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Fui a tristeza, a mágoa, a solidão!
Longe da felicidade e da alegria,
Ostentei um caminho que sabia,
Reverso e controverso de paixão…
*
Bebendo silenciosa a nostalgia,
Enquanto eu era toda adoração,
Lia nalguns olhares condenação,
A esse amor tão puro que sentia…
*
Errei pois por amar quem não devia,
Seguindo a terna voz do coração,
Peregrina fiel duma ilusão,
Alimentando a cega idolatria…
*
Não creio haver sequer comparação,
Com esta minha entrega doentia,
Ao dedicar-me inteira ao próprio irmão!...
*
José Manuel Cabrita Neves
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ACRÓSTICO- RESPOSTA
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Fui, sim, tristeza e mágoa e solidão,
Lamento de insondável nostalgia
Ornato de candura e poesia,
Remate de perfeita (in)confecção
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Bordado a ponto-cruz sobre aflição,
Errando, ou não, - conforme a disforia... -,
Louca, talvez, pois muito bem sabia
A que conduziria tal paixão...
*
Estou livre, no entanto - quem diria? -
Singrando uma outra estranha imensidão,
Passando, sem passar de mão em mão,
Adivinhando, agora, o que antes qu`ria
*
Não posso responder-te - ó decepção! -,
Cuidando, embora, que te respondia...
Ah, que te importa? Nunca amaste em vão?
*
Maria João Brito de Sousa - 09.02.2016 - 17.21h
*
Reservados os direitos autorais
***
FORÇA
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Vem-nos, a força, duma alma crestada
Por átomos de espanto, intemporais,
E, às vezes, conseguimos fazer mais
Quando julgámos não poder mais nada
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Vem improvável, mais do que adiada
- à luz das consciências mais normais -
Reencher-nos de sonho o velho cais
Da barca eternamente naufragada
*
Virá de onde diríamos não vir
Nem a remota sombra de um auxílio;
Impossível, absurda e, no entanto,
*
Vem como se quisesse destruir
As fronteiras reais do nosso exílio
Pra vir morar connosco em qualquer canto.
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Maria João Brito de Sousa – 13.11.2010 – 13.42h
SONETO DE ALTO RISCO
(Em verso eneassilábico)
*
Trago a louca impudícia das horas
A tanger-me, em violinos traídos,
A inocência das aves canoras
Sobre arames farpados floridos.
*
Uso abismos sem fim como escoras
Dos mais altos castelos erguidos
Aos dilemas dos bagos de amoras;
Meus troféus são corsários vencidos!
*
Conquistei terra e mar aos meus medos,
Moldei estátuas com chamas de velas,
Dediquei-me a estudar os segredos
*
Dos abismos do mito em desnorte...
Encontrando maleita ou sequelas,
Proporciono, ora a cura, ora a morte!
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Maria João Brito de Sousa – 26.11.2012 – 21.47h
PROCURA-SE
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(Ideia, conceito, palavra)
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Procura-se uma ideia. Uma. Isolada.
Moldada em puro barro, honesta, crua,
Mais do que apenas minha, apenas tua,
Que dê bom fruto assim que semeada
*
Inda que erre dispersa, abandonada,
Ou vagueie ao relento em qualquer rua
Disfarçada de sol quando está nua,
De lua, se de sol estiver cansada
*
E aguarda-se a palavra. Ela também
Define cada coisa e não convém
Deixar muda uma ideia procurada.
*
Humanizo a palavra. É ela quem
Conceptualizará quanto contém
A ideia que é por fim verbalizada.
*
Maria João Brito de Sousa - 26.10.2015 -16.17h
*
(Reformulado)
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