"A MENTE GUARDA SEGREDOS"
Queira fazer o favor de ler aqui
Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]
Queira fazer o favor de ler aqui
TRISTE
*
Estou triste e sou palmeira degolada
sou ave derrubada em pleno voo,
palavra em que tropeço e me magoo
por sabê-la indefesa e maltratada...
*
Tão triste! Às vezes fico tão magoada
que nem sei s`inda sou, se só destoo
dos “grandes”, na pobreza em que me roo
e em que, inteira, me vejo mergulhada
*
Mas, na mesma palavra em que me doo,
me espelho, me confundo e sei que soo
conforme soa a coisa inacabada,
*
Sou verso e, nesse verso, o verbo arpoo;
mais triste ou menos triste, ainda ecoo
inda que melhor fora estar calada.
*
Maria João Brito de Sousa – 02.04.2015 – 17.54
*
Eu, fotgrafada por Carlos Ricardo - 2014
"LUXO(S)"
*
Vestiu-se de veludo e, aos cabelos
Cruzados por riachos prateados
Prendeu dois ganchos lassos, muito usados,
Cobertos de pontinhos amarelos...
*
Meteu os pés inchados nuns chinelos
Baratos, duros, gastos e cambados;
Deixaram-lhe os dois pés muito apertados,
Mas já nem se importou... sorte era tê-los!
*
Sobre os ombros lançou velha mantilha
De cor incerta, incerta na textura
Como o vão sendo as coisas já sem cura
*
Que viajaram mundos na partilha,
Mas que o vão desmentindo na postura
Porque, no mundo dela, são fartura...
*
Maria João Brito de Sousa - Março, 2016
*
In A CEIA DO POETA, (inédito)
“M” de MULHER
*
Mordaz, mordisco o M de mulher,
Magnânimo, magnífico (i)mortal...
Mágico ou mitológico morder.
Modesta me (e)molduro marginal
*
Menos mastigo o M de morrer,
Mórbido mártir (i)memorial.
Manto. Monotonia. Maldizer.
Mistério. Maldição. Medieval.
*
Mede, menina, as miras de (a)manhã,
Modifica a moléstia mais malsã.
Mirífica matriz do (i)mponderável,
*
Ministra o ministério e molda mais;
Mostra as morenas mãos monumentais
Medindo, maternais, o (i)mensurável!
*
Maria João Brito de Sousa – 06.09.2018 – 17.22h
*
(Soneto ligeiramente modificado em 11.04.2021)
*
Tela de Pablo Picasso
ESTA VELHA MENINA...
(Desgaste)
*
Esta menina, velha quanto baste,
Exibe uma grisalha cabeleira
E muito embora brinque, inda faceira,
Já dos anos acusa um bom desgaste.
*
Sorriu quando menina lhe chamaste,
Mas já percorre a rampa derradeira
Que a (re)conduz à última fronteira
E se aproxima, por mais que ela a afaste.
*
Menina que o não é mas já o foi
E já deve algum tempo à sepultura,
Sabe bem quanto custa e quanto dói
*
Contrariar um mal que não tem cura
E a chaga que desgasta e que corrói
O fio/pavio da chama que a segura.
*
Maria João Brito de Sousa - 12.04.2021 - 16.24h
*
Ao Gil
NÃO VOLTES
*
Não voltes, por favor! Na solitude
Que me acompanha enquanto me ilumina,
Reconstruí-me, enfim, velha menina
De astros embriagada... e quietude.
*
Ignoro a latitude ou longitude
Desta alma sedentária e peregrina;
Sei lá se subo ou desço!? A minha sina
Firmou-se ao confirmar-te a finitude.
*
O café, que não bebo, sabe agora
Às coisas que conquisto ou que supero,
Mas me seduzem. Sou a que namora
*
O ritmo inebriante de um bolero
Que (re)nasceu assim que foste embora;
Não voltes por favor. Já não te quero!
*
Maria João Brito de Sousa - 12.04.2021 - 10.08h
*
Na sequência de um texto poético do Senhor das Nuvens
*
Imagem - Isadora Duncan
AMBIÇÕES
*
(Em Modo Decrescente)
*
"Eu queria ser o mar de altivo porte",
Ou a montanha imensa e pedregosa
Que desafia a alma ambiciosa
A escalá-la sem medo e sem suporte...
*
Queria provar, da flor, cada recorte,
E, das corolas, ser a mais viçosa;
Talvez a rosa que por ser espinhosa
Me faz lembrar a minha triste sorte...
*
Porém, rosa não sou... tão pouco ao mar
Me posso comparar, se tão dif`rente
Sei ser desse gigante bipolar...
*
Só posso ser, da montanha imponente,
A mais modesta pedra que encontrar
"E as pedras... essas... pisa-as toda a gente!..."
*
Maria João Brito de Sousa - 10.04.2021 - 13.55h
*
*
Soneto criado a partir do primeiro e último versos do soneto "Desejos Vãos", de Florbela Espanca, para uma rubrica do Horizontes da Poesia
AMOR E DOR NAS FALDAS DO ARARATE
*
Chegando ao Ararate, Amor e Dor,
Sentaram-se, cansados da jornada.
Olhando o Monte, a Dor ficou sarada
E, de contente, quis curar Amor;
*
Repara, Amor, que estava bem pior
Antes de iniciar a caminhada,
Que olhei o Monte e foi-se-me a pontada,
Que sinto despontar força e vigor!
*
Vem ver, para que o mal nunca te chegue,
Para que a praga, ao ver-te, se te negue,
E não possa haver peste que te mate!
*
Ouviu-a, Amor. Olhou. Perdeu-se olhando.
Voltou sozinha Dor, de dor chorando
Por se perder de Amor no Ararate.
*
Maria João Brito de Sousa – 10.05.2018
***
AMOR E DOR II.
*
Amor e Dor, brincando se entre-chocam
E enredam-se num fio que acaba em nó...
Até então Amor vivera só
E Dor, lá nas lonjuras que se evocam.
*
Moram juntos agora e, mal se tocam,
Sentem um pelo outro um mesmo dó;
Amor, que era imortal, desfaz-se em pó
E Dor sucumbe à dor que os nós provocam.
*
Nesta paradoxal (des)união,
Sente Amor, pela Dor, tal compaixão,
Que cega, pra não vê-la sucumbir
*
E Dor, que vendo Amor, o julga são,
Mais se enreda nos nós, mais sem perdão
Se obriga a não deixar Amor partir.
*
Maria João Brito de Sousa – 13.05.2018 – 09.27h
***
AMOR E DOR - Epílogo
*
Pra rematar a saga, Amor consente
Tomar Dor por esposa e companheira
E já que sendo ainda inexp`riente,
Não sabe o que é passar a vida inteira
*
Lado a lado com Dor, que impenitente,
Inflige a Amor insónias e canseira;
Amor está cego e Dor, sendo inocente,
Não pode pressupor ter feito asneira.
*
Deu-se este enlace em tempos tão remotos
Que nem posso evocar que estranhos votos
Uniram para sempre este casal,
*
Mas garanto que afirmam ser felizes,
Que deram fruto, tiveram petizes
E se amam. Para o bem e para o mal!
*
Maria João Brito de Sousa – 14.05.2018 – 11.15h
***
In "... Até a Neve Chorará Num Dia Quente...", Euedito, 2018
Imagem - "Amor e Dor", Edvard Munch
“T” de TAMBOR
*
Trágico. Triste. Tácito. Torpor.
Talvez tabu, talvez timidamente,
Trote em tropel por traços de tangente;
Turbulento e tenaz, toca o tambor!
*
Tenta tergiversar, teima transpor,
Tã-tã-tã-tã-tã-tã, tenso, temente...
Transporta o tom, tradu-lo toscamente.
Tirânico trovão, timbre de Thor.
*
Troça o traidor. Trepida a tentação.
Toca o trompete trôpego, em tensão,
Troa, travessa, a trompa. Tudo toca.
*
Tã-tã-tã-tã-tã-tã... tempos trocados;
Tanto toca o tambor (quan)to, em trinados,
Tenta o tímido tordo a terna troca.
*
Maria João Brito de Sousa – 25.08.2018 – 13.40h
“D” de DOMÍNIO
*
Dedilho o “d” de dar, dedilho a dor.
Drama. Dedicação. Diversidade.
Dessedenta-se a (se)de à divindade,
Declara-se (in)domado o ditador
*
Defenda-se do dardo, o domador!
Deveras dorme de debilidade.
Durante. Dolo. Dão. Docilidade.
Demonizam-se, demo e dissuasor!
*
Doutrina. Dogma. Drama. Dirigente.
Dicotomia. Dante. Diligente.
Doem dedos dispersos, decepados.
*
Dilema. Dado. Dólmen. Dissidente.
Dogma. Defunto. Doxa. Diferente.
Dobrem-se os débeis, driblem-se os dotados!
*
Maria João Brito de Sousa – 22.08.2018 – 13.15h
“E” de ELFO
*
Ei-lo enfrentando encostas escarpadas,
Engenhosa estrutura a esmo erguida
Entre elfos e entre estopa entretecida
De estrofes a escanteio estribilhadas.
*
Estranhando, esboça entraves. Eram escadas
Emulando essa escarpa embrutecida,
Escondida em eixo esconso, era esquecida,
Estro embebido em esponjas ensopadas.
*
Engendra esfera e escopro. Eternidade!
Esculpe-se efémero em estabilidade,
Empunha o espanto, exalta entendimento;
*
Escapa-se a estigmas e excentricidade,
Extrapola essoutra esdrúxula entidade,
Estrangula ebúrneo eclipse em esquecimento.
*
Maria João Brito de Sousa – 24.07.2018 – 15.30h
*
(soneto em decassílabo heróico)
ROLETA RUSSA
*
Mandaram-me ir jogar roleta russa
num casino qualquer que desconheço
e tudo (ar)risco porque, ou pago o preço,
ou saio ilesa desta escaramuça...
*
Tal qual ponta de lápis que se aguça
pra registo de data ou de endereço,
(ar)risco o risco desde o seu começo,
nunca (en)fiando inteira a carapuça...
*
Deixei, contudo, pronto o testamento
porque o diabo, esse em que não creio,
já tudo me levou, excepto o talento.
*
Mais por prudência do que por receio,
deixo o meu espólio ao mar, à terra, ao vento
e a todos quantos foram o meu esteio!
*
Maria João Brito de Sousa - 06.04.2021 - 11.33h
A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.