Maria João Brito de Sousa
ANTES QUE O SOL NASÇA
*
Antes que o sol nasça,
lembrar-te-ei que as noites
justificam o retorno dos dias
e que as borboletas, como as palavras,
rastejam, estéreis, antes de voar
*
Lembrar-te-ei,
ainda que eu própria o tenha esquecido,
que todos os horizontes germinam
na lonjura exacta do alcance do teu olhar
apesar dos teus olhos o imaginarem
na fronteira do sonho (in)comum
*
Lembrar-te-ei,
ainda que a lua possa desmentir-me,
que as manhãs te irão sobreviver
e que as montanhas nunca se vergaram
a uma vontade isolada
porque só as mãos juntas apontam os caminhos
que vale a pena desbravar
nas longínquas escarpas do monte improvável
e nada do que eu te lembrar fará sentido
a menos que o descubras antes que o sol nasça
*
Maria João Brito de Sousa – 18.10.2012 – 16.13h
publicado às 14:42
Maria João Brito de Sousa
CAMINHO(S) *
"Sonho de olhos abertos, caminhando"
Bem mais do que contava caminhar
E só de olhos abertos sei trilhar
Estes caminhos que encontrei sonhando *
Como luz que se acende e vai brilhando,
Assim se me ilumina o caminhar
Em quantos passos der, sempre a sonhar,
Acordado, contudo, e avançando... *
Não posso conceber um melhor guia
Do que este, passo a passo conseguido,
Que a cada passo dado me alumia, *
Mas sei que se sonhasse adormecido
Talvez me alumiasse ao fim do dia
"Outra luz, outro fim só pressentido..." *
Maria João Brito de Sousa - 29.03.2021 - 20.11h
*
Entre aspas, versos de Antero de Quental.
Soneto criado para uma rubrica do Horizontes da Poesia
*
Na fotografia, o meu pai no seu escritório do nº 91-A da Rua Luís de Camões, Algés
publicado às 10:09
Maria João Brito de Sousa
PARA TE AMAR, POEMA
*
Nenhuma montanha
será demasiado alta
para te amar,
poema,
para te amar,
tão só…
*
E decido-me a deixar-te tombar…
Na queda confundem-se
flor e pássaro,
tempo e modo,
metáfora
e urgência real de não chegar ao fim
*
Porém,
tudo não dura mais do que a palavra
que,
num súbito recuo,
opto por não deixar cair.
*
Salvo “in extremis”
no segundo imediatamente anterior
ao impacto derradeiro,
devolvo-te às asas a que sempre pertenceste
e enfrento,
mais só do que nunca
porque consciente e lúcida,
o maior de todos os riscos
no crescente declive das banalidades
*
É tempo de dormir.
Amanhã será um novo dia
para te amar,
poema,
para te amar,
tão só…
*
Maria João Brito de Sousa – Poema manuscrito a 24.12.2012 – 02.00h
*
Tela de minha autoria, fotografada e digitalizada por Vítor Martinez
*
NOTA - Mais uma vez, por pontual ausência da Musa, trago um poema de verso branco à morada do soneto
publicado às 11:58
Maria João Brito de Sousa
Para sorrir um pouco, leia aqui, se faz favor
publicado às 11:47
Maria João Brito de Sousa
UMA "DEIXA" IMPROVISADA * (pormenor de bastidores) *
Claríssima, a manhã espreita a nudez
De uma protagonista enluarada
Que acorda enrubescida e estremunhada
De um sono que durava há mais de um mês. *
No palco, a sua deixa, a sua vez,
Vai a meio de ser representada
Por uma musa atenta e acordada
Que do seu sono a tempo se refez. *
Sendo esta peça feita de improvisos,
Entra a protagonista noutra altura,
Esbanjando vénias, gestos e sorrisos *
Prossegue, então, a Peça, que a cultura
Nasce também de gestos imprecisos
E de erros que alguns julgam ser sem cura. *
Maria João Brito de Sousa - 27.03.2021 - 13.11h
publicado às 16:19
Maria João Brito de Sousa
HUMANA NATUREZA II *
"Vai a fresca manhã alvorecendo"
No limbo das razões adormecidas
E do sono despertam novas vidas
Que, pouco a pouco, vão prevalecendo *
Sobre as que o sono eterno foi vencendo
E que, de madrugada, são esquecidas;
Mil teorias são então tecidas
Sobre outras tantas que fomos tecendo. *
Como humanos que somos, questionamos,
Teorizando tudo. Ateu ou crente,
O homem teoriza. E constatamos *
Que o dia dorme já serenamente
Enquanto, estremunhados, suplicamos;
"Torna a alentar-te, ó sol resplandecente!" *
Maria João Brito de Sousa - 25.03.2021 - 12.30h *
Entre aspas, versos de Leonor de Almeida Portugal de Lorena e Lencastre (Marquesa de Alorna)
Soneto criado para uma rubrica do Horizontes da Poesia
publicado às 09:08
Maria João Brito de Sousa
METÁFORA
(Manifesto)
*
Eu digo-te
que o sol floresce limpo
sobre o estrume das aparências
e que as palavras são casas nas cidades da voz
*
Digo-te
que as ruas são mãos a (re)pousar,
que as estátuas de pedra são canções
e que as canções são luas, de tão brancas…
*
Dir-te-ei,
vez por outra,
que as plantas são mulheres e homens
cansados da colheita improvável,
que os dias – todos eles –
são movimento,
que as noites são o esconderijo
dos sonhos à espera de acordar
e que os muros são pontes entre agora e depois
*
Falar-te-ei de passos sem distância,
de espaços sem medida,
de memórias sem tempo
e de gente sem medo de morrer,
mas jamais me ouvirás falar de renúncia
enquanto o murmúrio me for permitido
na cidade da voz libertada
*
Também a metáfora se come, se bebe
e não sabe render-se enquanto viva
*
Maria João Brito de Sousa – 03.09.2012 – 18.12h
publicado às 10:13
Maria João Brito de Sousa
Imagem retirada daqui
VENDAS
*
Vendaram-me estes olhos que desvendam,
(que desvendavam quando desvendados)
Caminhos dia a dia vislumbrados
A que os olhos vendados se me prendam.
*
Ainda que os meus olhos pouco entendam,
Ir-mo-ão desvendando os passos dados
Pois todos os caminhos são lavrados
Pelos arados que se lhes não rendam.
*
Abrem os passos ruas que se fecham
Atrás dos mesmos passos que as abriram;
São caminhos que rasto nunca deixam,
*
Ruas que apenas nossos pés serviram
Ainda que esses pés pouco se mexam
E ainda que esses passos muito os firam.
*
Maria João Brito de Sousa – 2020/2021(?)
*
NOTA - Encontrei este soneto de rima toante nos ficheiros, sem data. Não posso estar segura de nunca o ter publicado, mas penso nunca o ter chegado a fazer.
publicado às 08:56
Maria João Brito de Sousa
Papoilas - Monet
PAPOILA(S)
*
Estão secas as papoilas que murcharam
Mas será sempre rubra a sua cor
Que é a dos corações abrindo em flor
Sobre o verde do prado em que brotaram. *
Persistem na memória em que atearam
As chamas rubras desse seu fulgor
E sabem ao melhor que há no melhor
Da cor vermelha com que o chão pintaram. *
Tão belas e tão frágeis quão selvagens
Parecem, bastas vezes, ser miragens
Em vez de coisas vivas e reais *
Que se espraiam na tela das paisagens
Pontilhadas de vida e de mensagens
Escritas pra serem lidas por mortais. *
Maria João Brito de Sousa - 22.03.2021 - 10.56h
*
NOTA - Porque a Vida e a Poesia não se confinam, logo, às 19.30h
de hoje, dia 23 de Março, estarei aqui . Quer-me fazer companhia?
publicado às 08:06
Maria João Brito de Sousa
Eu, fotografada em 1972
SEDE(S) *
"Encontraste-me um dia no caminho"
Que eu fazia sozinho, em desencanto;
Não te esperava nem esperava tanto
De um desencanto assim, tão comezinho... *
Foi então que deixei de estar sozinho
Neste caminho em que floresce o espanto
E em que utrapasso a dor e o quebranto
Sempre que assumo um passo mais asinho *
Deste-me a mão, sondaste de mansinho
A vulnerab`lidade do meu manto
De sede ardente e do mais puro linho *
E tanta sede em ti sentiste, quanto
Em mim secara, por inteiro, o vinho;
"Tivemos de beber do mesmo pranto" ***
Maria João Brito de Sousa - 21.03.2021 - 13.17h *
Entre aspas, versos de Camilo Pessanha
Soneto criado para uma rubrica do Horizontes da Poesia
publicado às 08:36
Maria João Brito de Sousa
NASCE, POESIA!
*
Porque o que sou
me não cabe nas mãos fechadas,
escorrem-me,
por entre os dedos,
estas sobras
do que recuso transformar
em gesto de troca,
artigo de compra e venda,
alimento, embriaguez, culto, ritual
e que és tu,
Poesia.
*
Divinizam-te,
alguns,
o corpo que não tens
no altar que insistes em não ser,
mas sei-te no cerne de todas as coisas,
escorrendo inevitavelmente
de todos os poros, por todas as frestas,
limpa, lúcida, viva, inexplicada…
*
Cantas,
ainda,
onde a esperança morreu,
ressoas no vácuo, apesar de inaudível,
desdobras-te
em invisibilidades e vislumbres,
acendes-te, sublime,
no temor de cada escuridão.
*
Inútil,
ou não,
Nasce, Poesia!
*
Maria João Brito de Sousa – 11.09.2012 -01.53h
QUEBRANDO REGRAS
*
Sou uma poeta que tenta ser arrumadinha nas suas publicações, daí que tenha criado um blog para sonetos, um para poemas em redondilha maior ou menor e outro ainda para os poemas em verso livre e branco, porém...
dado o afecto que nutro pelo Ilustre Batráquio (Sapo) em cujo território há tantos anos fundei os alicerces desta minha humílima casinha poética, decidi quebrar a regra e trazer a este espaço um poema em verso branco que, a meu ver, celebra às mil maravilhas o
DIA INTERNACIONAL DA POESIA
publicado às 17:06
Maria João Brito de Sousa
Queira fazer o favor de ler aqui
publicado às 09:29