"QUANDO O AMOR ACONTECE"
Queira ter a gentileza de ler aqui
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Queira ter a gentileza de ler aqui
MOIRA(S)
*
(Mitologia Grega)
*
Não são parcas, as Moiras, no seu zelo;
Fiam, tecem e cortam noite e dia
Sem se cansarem da monotonia,
Sem se esquecerem de nenhum novelo
*
Desponta o fio e logo irão tecê-lo
Com mão que sabiamente doba e fia,
Senhoras da tristeza e da alegria
Dos dias mais magoados e mais belos.
*
No fim, uma das Moiras corta o fio
Das luas e dos sóis de cada vida;
Só essa determina o fim de um rio,
*
Só essa indica a hora da partida;
Ela é quem sela o poderoso trio
Ante o qual Zeus recolhe a espada erguida.
*
Maria João Brito de Sousa - 27.02.2021 - 12.00h
COISAS QUE SÓ EU SEI
*
(em verso alexandrino)
*
Não canto essoutro amor cantado à exaustão
Que é fruto da paixão que irrompe como a flor
Quando, no seu esplendor, garante a gestação
A cada geração que seduz pra se impor.
*
Cantá-lo por favor, a mim, não me imporão
Que eu moro na canção que eu entender compor
E não ando ao dispor da velha tradição;
Nada faço à traição, nem guardarei rancor
*
Porque é com despudor que afirmo que cantei
Coisas que só eu sei e outras que, não sabendo,
Tentei ir aprendendo assim que aqui cheguei;
*
A Amor nunca neguei, que o vivi no crescendo
Que a vida foi tecendo enquanto o que sonhei
Cá dentro sufoquei. De amar não me arrependo.
*
Maria João Brito de Sousa - 26.02.2021 - 11.35h
DE NOVO O MAR
*
De novo o mar. Tão longe e aqui tão perto,
Vem relembrar-me o sonho da jangada;
Pede-me tudo e não me pede nada
Que eu já não tenha, há muito, descoberto
*
Pois sempre que num verso me liberto,
É nesse mar que encontro a minha estrada
E tão mais lesta quanto mais cansada
Prossigo em busca do meu porto (in)certo.
*
Não sei se cacilheiro, se canoa,
A jangada de sonhos e de espantos
Que hoje me espera num cais de Lisboa,
*
Mas sei que vence as dores e desencantos
Do vastidão marinha que a atordoa
E não teme os rochedos, que são tantos.
*
Maria João Brito de Sousa - 23.02.2021 -14.53h
*
Soneto criado para a Antologia Luso-Brasileira "Tanto Mar Entre Nós"
*
Fotografia de Fernando Ribeiro
QUEM NÃO TEM CÃO...
*
Erato não serei, poeta amigo,
Que para tal não tenho engenho e graça,
Mas posso garantir-lhe garra e raça
Sempre que aceite que escreva consigo.
*
Não ostento os cabelos de oiro ou trigo
Que enfeitam qualquer deusa quando caça,
Mas meu arco-de-versos tem a traça
Do que não tem idade, sendo antigo.
*
Se errar "humanum est", eu errarei,
Mas pode crer que lhe não faltarei,
Se Erato me ceder a sua vez...
*
Porque "quem não tem cão, caça com gato",
Sempre que o ignorar a bela Erato,
Conte c`oa minha humana pequenez!
*
Maria João Brito de Sousa - 22.02.2021 - 18.37h
***
Soneto escrito em resposta ao soneto ERATO do poeta Custódio Montes.
*
Imagem - ERATO - Tela de Francis Boucher
UM PAPEL NO PALCO DA VIDA
*
"E voltam os meus medos de menino"
Num barco de papel lançado ao rio
Num dia enevoado agreste e frio
P`la vontade insondável do destino...
*
Ao longe, o repicar um velho sino
Invade a rua, embala o casario
E a toada acalma o arrepio
De um eu tão vulnerável quão franzino.
*
Brinca contigo o Tempo, em certos dias;
Todo o cenário muda e, num repente,
Vês-te no palco, nu, de mão vazias
*
E tu, que eras tão lúcido e valente,
Porque impotente em nada contrarias
Um fim que é sempre igual pra toda a gente.
*
Maria João Brito de Sousa - 22.02.2021 - 13.17h
*
Soneto inspirado no soneto DIA DO SOL (Sunday) do poeta Carlos Fragata.
"WHERE THE WILD ROSES BLOOM"
***
COROA DE SONETOS
*
Maria João Brito de Sousa e Laurinda Rodrigues
***
1.
*
Nesta minh`alma, presa por um fio,
Tremeluz uma lágrima que insiste
Em dominar a dor a que resiste
Em vez de, solta, transformar-se em rio.
*
A sua teima, mais que um desvario,
É luta de que a alma não desiste,
E se é certo que a dor em mim persiste,
Mais certo é que eu lhe ganhe o desafio
*
Pois do mar que chorei em tempos idos
Por mágoas que nem dei a conhecer,
Nasceram-me, cá dentro, rios traídos
*
Que desaguaram antes de irromper
Criando um mar de versos (in)contidos
Ao qual, sempre que sofra, irei beber.
*
Maria João Brito de Sousa - 18.02.2021 - 17.35h
***
2.
*
"Ao qual, sempre que sofra, irei beber"
serenamente, como fora ópio
que, por entre essas mágoas, vai tecer
formas vibrantes em caleidoscópio.
*
E ninguém diga que amar é sofrer
porque o sofrer de amor é sempre próprio:
faz angústia e ansiedade, faz doer,
que nos desvenda como em microscópio.
*
Vamos negando a razão de ser
de tanto sofrimento do momento
e fazemos de tudo para esquecer...
*
Só que essa dor vem do nascimento
e irá ser companhia até morrer
quer seja aragem leve ou rude vento.
*
Laurinda Rodrigues
***
3.
*
"Quer seja aragem leve ou rude vento"
O que ameaça quem de nós nasceu,
Ameaça também o nosso "eu"
Que, ainda que distante, fica atento
*
A cada sopro e a cada movimento
De quem está a sofrer ou já sofreu
Pois, no segundo em que isso aconteceu,
Cerraram-se-me as asas do talento.
*
Assim fiquei numa tensão de espera
Que os poemas me ensinaram a gerir
Com a perseverança de uma hera
*
Que espera alguma impede de subir
A parede mais nua e se supera
Na própria dor que a esteja a consumir.
*
Maria João Brito de Sousa - 19.02.2021 - 13.22h
***
4.
*
"Na própria dor que a esteja a consumir"
encontrou o sentido da existência
porque, mesmo em período de carência,
de algum lado abundância há-de surgir.
*
Não permitindo ao corpo reagir
é o medo, crescendo com premência
que transforma em estado de latência,
a coragem de ser e de existir.
*
E todos vão esperando um novo dia
quando, afinal, o sol há-de surgir
num espetáculo de luz e de alegria,
*
Se o nosso olhar não recusar sorrir
e, dando uns aos outros a poesia,
damos abraços que a hera há-de cobrir.
*
Laurinda Rodrigues
***
4.
*
"Na própria dor que a esteja a consumir"
encontrou o sentido da existência
porque, mesmo em período de carência,
de algum lado abundância há-de surgir.
*
Não permitindo ao corpo reagir
é o medo, crescendo com premência
que transforma em estado de latência,
a coragem de ser e de existir.
*
E todos vão esperando um novo dia
quando, afinal, o sol há-de surgir
num espetáculo de luz e de alegria,
*
se o nosso olhar não recusar sorrir
e, dando uns aos outros a poesia,
damos abraços que a hera há-de cobrir.
*
Laurinda Rodrigues
***
5.
*
"Damos abraços que a hera há-de cobrir",
Sobrevivemos a todas as dores
E vamos dando o melhor dos melhores
De tudo o que façamos ressurgir
*
De um mundo que parece qu`rer ruir
Sob o domínio dos novos temores
E que solta os gemidos e estertores
Dos que estão quase, quase a desistir.
*
Dos destroços, contudo, irrompe a vida
Porque a vida abomina a rendição
E sempre que parece estar vencida
*
Encontra forma de mostrar que não,
Que apenas se calara confundida,
Que segue ainda o rumo evolução.
*
Maria João Brito de Sousa - 19.02.2021 -17.45h
***
6.
*
"Que segue ainda o rumo evolução"
mesmo que não se note, por temor
desse desconhecido que dá dor
mas é a terra inteira em convulsão.
*
Ela emitira há muito a prevenção...
Fomos traídos p'la força do pavor
e, querendo ainda evocar o amor,
ficamos esmagados sem perdão.
*
Oh liberdade de ser e de criar!
Agora és planta seca e espezinhada...
Onde escondeste a força do teu ar?
*
Ouvi gemidos quando ia cantar
Já não há alegria nesta estrada...
Ajoelho na terra e vou rezar.
*
Laurinda Rodrigues
***
7.
*
"Ajoelho na terra e vou rezar"
Um verso que me chega libertado
Pois nunca tem presente, nem passado
Que nunca sei quando me irá chegar.
*
Nisto consiste o acto de criar
Que, não sabendo o que irá ser criado,
Quanto mais solto, mais harmonizado
E mais seguro de se propagar.
*
É rebelde insubmisso mas confia,
O verso, nessa força que o conduz
Como vento que sopra e que assobia;
*
Subverte a escuridão e faz-se luz
Nas malhas do momento em que se fia
Ou, no pior dos casos, se traduz.
*
Maria João Brito de Sousa - 20.02.2021 - 13.04h
***
8.
*
"Ou, no pior dos casos, se traduz"
não sei em que linguagem inventada...
Sei, apenas, que a hora da chegada
servirá às palavras que a traduz.
*
Porque a hora chegada tem a cruz
pendurada no teto da entrada
e tu olhas para ela fascinada
e escreves o poema que a seduz.
*
Vens à procura de encontrar permutas
de outros e outras almas resolutas
que insistem em criar dia após dia...
*
E sendo esses encontros que desfrutas
companheiros de tal e tantas lutas
aqui deixo o meu sonho como guia.
*
Laurinda Rodrigues
***
9.
*
"Aqui deixo o meu sonho como guia"
Ou companheiro cândido e leal
Do que nos nasce do sal que há no sal
Do mais íntimo sal que em nós havia.
*
Assim vamos somando, em sincronia,
Um verso quase sempre acidental
A outro que é também original
E dá continuidade à sinfonia.
*
Porque a Arte é pilar fundamental
E grande parte dela é poesia,
Nela encontramos sempre um ideal
*
Ao qual juntamos sonho e fantasia;
Então, sem iludirmos o real,
Podemos dar-lhe uns toques de magia...
*
Maria João Brito de Sousa - 20.02.2021 - 17.12h
***
10.
*
"Podemos dar-lhe uns toques de magia"
num circo onde seremos aprendizes:
tu e eu treinando como atrizes
de equilibristas em grande fantasia.
*
As bancadas do povo que assistia
eram, do nosso circo, as bissetrizes
feitas de troncos de árvores e raízes,
que a luz da inspiração as imergia.
*
Às vezes com aplausos, outras não,
no silêncio da voz ou na paixão,
criar seja o que for é uma virtude...
*
Mas, se deixamos vir a solidão,
correremos o risco da ilusão
de nos vermos caídos num talude.
*
Laurinda Rodrigues
***
11.
*
"De nos vermos caídos num talude",
Tal como os que, vivendo acompanhados,
Se vêem pela morte separados,
Ainda que homogéneos como grude...
*
A solidão dos poetas é virtude;
Conquistam-na e não querem ser privados
Das asas solidárias dos seus fados,
Quer gozem, quer não gozem de saúde.
*
Confundes solidão com abandono
E há um abismo entre esses dois conceitos;
Um faz sonhar, o outro rouba o sono
*
E é o carrasco-mor dos seus "eleitos"
Quando assume o poder e sobe ao trono
Da bárbara crueza dos seus feitos.
*
Maria João Brito de Sousa - 21.02.2021 - 12.17h
***
12.
*
"Da bárbara crueza dos seus feitos"
irá nascer, no tempo, a agonia
de os carrascos sentirem, dia-a-dia,
o remorso a que estarão sujeitos.
*
Então a solidão cresce nos leitos
onde a alma habita tão vazia
com o abandono feito a uma cria
que precisava tanto dos seus peitos.
*
Mistura-se abandono e solidão
na teia do sentir do coração
onde ambos fazem ninho pouco a pouco...
*
E, um dia, sem notar, nasce a ilusão
de poder ter da cria o seu perdão
p'ra que o carrasco não acabe louco.
*
Laurinda Rodrigues
*
***
13.
*
"Pra que o carrasco não acabe louco"?
Porquê, se bem merece esse castigo?
Terás compreendido o que aqui digo,
Se digo que o castigo é muito pouco?
*
"Conceitos", disse, e não me deste troco...
Casos particulares não são comigo;
Não penso misturar joio com trigo,
Nem Neo-realismo com Barroco,
*
Por isso demonstrei, por A mais B,
Que a solidão dos férteis dá mais frutos,
E de afectos sinceros não descrê,
*
Mas descrê, sim, e em termos absolutos,
Dos que abandonam, sem explicar porquê,
Novos ou velhos, sensíveis ou brutos.
*
Maria João Brito de Sousa - 21.02.2021 - 16.59h
***
14.
*
"Novos ou velhos, sensíveis ou brutos"
todos nós já sofremos abandono
mas sem mostrar fraqueza a esse dono
vamos tentar esquecê-lo, resolutos.
*
Pensamos ficar livres mas, sem lutos,
vamos perdendo horas desse sono
que é preciso para libertar o mono
feito de raivas que já não dão frutos.
*
Mas, ao falar com alguém que saiba amar,
pode ser que retorne, em nós, o olhar
que tenha a suavidade como um rio
*
que caminha tranquilo para o mar
guardando na memória o que pesar
"nesta minh'alma, presa por fio".
*
Laurinda Rodrigues
***
*
O SONETO POSSÍVEL
NUM DIA COMO O DE HOJE
***
... e pouco a pouco vamos definhando,
Pouco nos sobra, somos só estilhaços,
Sombras furtivas dos humanos traços
Que este presente foi desfigurando.
*
Sobrevivemos sem sabermos quando
Se nos refazem os humanos laços,
Ou se cerram, de vez, os olhos baços
Que muitos - tantos... - foram já cerrando.
*
Tudo está longe mesmo estando perto
E o mundo transmutou-se num deserto
Que gela à noite e, de dia, sufoca
*
Quem se atreva a adentrá-lo a descoberto;
Nada há de certo neste tempo incerto,
Excepto a mordaça que nos tapa a boca.
*
Maria João Brito de Sousa - 21.02.2021 - 12.40h
Queira ter a bondade de ler aqui, se faz favor.
"WHERE THE WILD ROSES BLOOM"
*
Nesta minh`alma, presa por um fio,
Tremeluz uma lágrima que insiste
Em dominar a dor a que resiste
Em vez de, solta, transformar-se em rio.
*
A sua teima, mais que um desvario,
É luta de que a alma não desiste,
E se é certo que a dor em mim persiste,
Mais certo é que eu lhe ganhe o desafio
*
Pois do mar que chorei em tempos idos
Por mágoas que nem dei a conhecer,
Nasceram-me, cá dentro, rios traídos
*
Que desaguaram antes de irromper
Criando um mar de versos (in)contidos
Ao qual, sempre que sofra, irei beber.
*
Maria João Brito de Sousa - 18.02.2021 - 17.35h
CARTA ABERTA A UM BRASIL (TAMBÉM) CONFINADO
*
É em silêncio que te lembro... e dorme
Ainda o chão solar do teu país
Na sua selva inexplorada, enorme,
Onde o poema ousou lançar raiz
*
À espera de que o verso se transforme
No que, em confinamento, disse e fiz
Pra que o disforme se molde conforme
Chaga que sara e se faz cicatriz
*
E se essa cicatriz profunda for,
Se deixar marca como o mal de amor
Que é indelével, mas nunca insolúvel,
*
Que possa despontar como uma flor
Aquilo que salvarmos desta dor
Que há-de passar pois sempre foi volúvel.
*
Maria João Brito de Sousa - 17.02.2021- 09.30h
*
Soneto criado para a Antologia Luso-Brasileira "Tanto Mar Entre Nós".
UM CHEIRINHO DE ALECRIM
*
Irei levar-te aquilo que me sobra
Do rubro cravo aceso no meu peito
E o cheirinho a alecrim deste meu jeito
De ser haste que quebra mas não dobra.
*
O reencontro que a memória cobra,
Quando me aceitas tal como eu te aceito,
Culminará no tal final perfeito
Que a poesia exige a qualquer obra.
*
Sei que ainda te lembras da semente
E esse Amazonas que enlaçava o Tejo
Não desertou do coração da gente
*
Que recorda o sabor de um velho beijo;
Quem receia falar de quanto sente
Quando cantá-lo é mais do que um desejo?
*
Maria João Brito de Sousa - 15.02.2021 - 15.44h
*
Soneto criado para a Antologia Luso-Brasileira "Tanto Mar Entre Nós..."
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