Maria João Brito de Sousa
PORQUE SÓ AMAR É PODER SEGURO
Há quem do poder faça seu amor
Numa entrega total quase paixão
Impondo-se pla força e sem pudor
Não se aceitando amar nem ver razão...
Mas que importa o poder sem o calor
E o carinho dum só toque de mão
Dum beijo e abraço dados com ardor
Sentindo bater forte o coração?
Se poder é o mando que dispõe
E que ímpio obriga e logo impõe...
Onde estará o amor real e puro?...
Não me peçam então que ame o poder
Nem sequer pra com ele conviver
Porque só amar é poder seguro...!
MEA
30/11/2017
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PODER(es)
Tão-pouco essa obsessão pelo Poder,
Alguma vez senti, ou entendi,
Por muito que o tentasse perceber,
Nunca pude, ao Poder, trazê-lo aqui.
Dissecá-lo – a mão firme e sem tremer... -,
Lamento confessar, não consegui,
Mas isso não bastou pra nel` não crer,
Porque, apesar de tudo, bem o vi,
Brutal na sua forma de exercer
A funesta paixão que se acender
Em todo o que o trouxer dentro de si.
Eu pouco posso e nada quero ter
Para além do que posso e que é escrever,
Mas, se algum dia o quis, nem o senti.
Maria João Brito de Sousa -30.11.2017 -16.20h
publicado às 17:47
Maria João Brito de Sousa
É LÁ NESSE LUGAR QUE A VIDA HIBERNA
Lá no alto onde o tempo se calou
Onde há nuvens que choram sem querer
Pra onde a lua foi e não voltou
E há estrelas acabadas de nascer…..
Lá no alto onde o tempo já brilhou
Quando o sol lá nasceu sem se esconder
Lá onde o azul do céu se misturou
Com as cinzas das estrelas a morrer
Fica o lugar mais belo, mais sereno
Onde a paz é maior o vento ameno
E a luz, eu direi mesmo que é eterna
Onde o sonho renasce e permanece
Quando a idade já nos entardece
…É lá nesse lugar que a vida hiberna!
MEA
28/11/2017
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TAMBÉM NESSE LUGAR NASCE A POESIA
“Lá no alto onde o tempo se calou”
E os astros pulsam ao sabor do espanto
Cadências de um quasar que começou
Há milhões de anos sem que o desencanto,
“Lá no alto onde o tempo já brilhou”,
O impedisse de ir espraiando um manto
Sobre o vazio de um espaço que inundou
De química, primeiro, e... depois tanto,
“Fica o lugar mais belo, mais sereno”
De todos os locais que um ser terreno
Pode engendrar, se sonha e fantasia;
“Onde o sonho renasce e permanece”,
Cresce o Homem que ainda desconhece
Quanto de si é Ciência... e Poesia.
Maria João Brito de Sousa – 29.11.2017 – 18.10h
publicado às 18:27
Maria João Brito de Sousa
PINGOS DE CHUVA
Há no inverno e também neste verão, Fazendo reflorir todas as flores E muito amor ao nosso coração, Livrando-nos a todos de suas dores. Os pingos batem forte no telhado Tal qual som musical em harmonia Que sai do piano ao toque do teclado, Como todos nós numa sinfonia. Cantemos todos nós em dós e rés Juntamente com todos trovadores, Pois o grande concerto já se instalou. Tal musicalidade é das marés Sobre bravos e fortes pescadores Dos mares que o poeta já nos falou.Adílio Belmonte
Belém – PA - Brasil
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DE OLHOS NO HORIZONTE E MÃO NO LEME
Que a musicalidade das marés Te traga inspiração e força e esp`rança! Que nessa Barca e sobre o seu convés, Em vez de tempestade, haja bonança! Que o céu, que agora está negro-de-pez, Se encha das cores do arco-da-aliança Preenchendo esse negro que ora vês P´ra tornar mais harmónica a mudança! Haja o que houver, que a Barca permaneça, Que nas ondas do Mar nunca pereça Essa que tudo enfrenta e nada teme E nem a Tempestade nos impeça, De rumar devagar, ou mais depressa, De olhos no Horizonte e mão no Leme! Maria João Brito de Sousa - 27.11.2017 - 10.12
Oeiras, Portugal
publicado às 12:07
Maria João Brito de Sousa
Mais três tímidos pingos se juntaram
Aos três primeiros, hoje anunciados,
E, bem depressa, mil outros tombaram,
Pois já cai chuva a rodos nos telhados,
Nos canteiros do buxo que ensoparam,
Nos vidros das janelas, salpicados,
Nas gentes que aqui passam, ou passaram,
Sob chapéus-de-chuva improvisados...
Bendita sejas tu, que dessedentas!
Bendita, pelo bem que representas
Para a terra sequiosa e para a vida!
Chorando sobre a crosta, a reinventas,
A cobres de verdura e a sustentas,
Ó chuva, tão sonhada, quão fugida!
Maria João Brito de Sousa – 23.11.2017 – 16.34h
NOTA – Na sequência do soneto “Só Três Pingos...” de Maria da Encarnação Alexandre.
publicado às 17:27
Maria João Brito de Sousa
SONETO ATRASADO
De Marília os sinais aqui ficaram, Que tudo são sinais de ter passado: Se de flores vejo o chão atapetado, Foi que do chão seus pés as levantaram. Do riso de Marília se formaram Os cantos que escuto deleitado, E as águas correntes neste prado Dos olhos de Marília é que brotaram. O seu rasto seguindo, vou andando, Ora sentindo dor, ora alegria, Entre uma e outra a vida partilhando: Mas quando o sol se esconde, a noite fria Sobre mim desce, e logo, miserando, Após Marília corro, após o dia.
José Saramago
In “Os Poemas Possíveis”
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SONETO DO ENCONTRO TARDIO
Atrás de mim vieste e me alcançaste
No rasto dos sinais por mim deixados,
Mas tivesse eu mais rio, mais chão, mais prados,
Soubesse eu desses sonhos que sonhaste,
Mais sinais deixaria onde passaste;
Mais lágrimas, mais risos entoados,
Mas muito menos passos apressados
Teria dado até onde me achaste...
Caminhava apressada pela vida,
Sem cuidar de cuidar que havia um fim,
Sem notar que passava distraída,
Mas que um rasto deixava e, sendo assim,
Te apontava uma rota percorrida
Que antecipava a tua, atrás de mim...
Marília
(Maria João Brito de Sousa – 20.11.2012 – 11.20h)
publicado às 11:35
Maria João Brito de Sousa
(Soneto em verso hendecassilábico e rima encadeada)
Fecharam-me um dia numa arca de espantos;
Roubaram-me, uns tantos, fortuna, alegria,
Quanto eu possuía de força e de encantos
Deixando-me os mantos com que me cobria,
Quando eu mal sabia da dor, dos quebrantos,
Dos sábios, dos santos, do frio que faria...
Alguma energia, contida entre prantos,
Me ergueu desses cantos que eu desconhecia
E, aos poucos, fui vendo que essa arca de ferro
Era um simples erro e... de erros, entendo!
Lá fui aprendendo com erro após erro...
Nessa arca me encerro mas, dela nascendo,
Ouve-se, em crescendo, um protesto, um berro
E os dentes que cerro, rangendo, rangendo...
Maria João Brito de Sousa – 17.11.2017 – 13.20h
publicado às 15:19
Maria João Brito de Sousa
(Soneto em decassílabo heróico)
O céu não tem limites, nem fronteiras
E, tanto quanto sei, nem tecto tem,
Mas nem por isso é pobre e verdadeiras
Serão sempre as estrelas, mais além,
Brilhando como tiaras ou pulseiras
Nas frontes e nos pulsos de ninguém,
Pulsando até às vistas derradeiras,
Iluminando tudo e mais alguém...
No céu, hás-de ver estrelas que estão extintas
E nunca as que estão hoje a começar,
Portanto, mundo meu, nunca me mintas;
Não passarei de um raio de luar,
Mas sei avaliar coisas distintas
E tenho estrelas pr`a me iluminar!
Maria João Brito de Sousa – 16.11.2017 – 16.05h
publicado às 16:15
Maria João Brito de Sousa
Não jogo, não jogo, não jogo nem morta!
Retiro-me absorta, não brinco com fogo!
Se quase me afogo na maré mais torta,
A Barca suporta tudo o que lhe rogo,
Porque, logo, logo, me salva e conforta,
Abrindo-me a porta, vencendo outro jogo,
Nunca o que me arrogo... esse pouco importa,
Nem viva, nem morta, lhe aceito o regougo!
Ó Barca cativa das minhas algemas,
Guarda-me, não temas as penas que eu viva
Se a sorte me priva de embalar poemas
Mantém-te passiva nas tardes amenas,
Sonha com fonemas na noite furtiva,
Mas sê sempre altiva; não cedas, nem tremas!
Maria João Brito de Sousa – 14.11.2017 – 17.05h
NOTA - Soneto em verso hendecassilábico, rima encadeada e acentuação tónica na quinta sílaba métrica.
publicado às 06:30
Maria João Brito de Sousa
Pequeno poema escrito em contra-mão,
Não te sei compor, mas deixo uma razão;
Sinto-me aturdida, perco-me de ti,
Não te oiço pulsando, nada sei senão
Que fugindo ao tom, escapas-me à canção...
Poema, que fazes ao teu “dó-ré-mi”
Que escondes, que guardas tão longe de mim?
Peço-te desculpa, pois rude pareço,
Mas bem reconheço; estranha, sou-o sim,
Se te escrevo assim, pondo o fim no começo,
Mas nunca te impeço desta forma, assim,
Tornar-te jardim, jardim em que tropeço
E no qual me empeço muito antes do fim,
Nalguns ramos de alecrim... eis o teu preço!
Maria João Brito de Sousa – 14.11.2017 – 10.04h
NOTA – Soneto "excêntrico" escrito no seguimento de um soneto do poeta Albertino Galvão, em verso hendecassilábico e acentuação tónica na sétima sílaba métrica.
publicado às 15:16
Maria João Brito de Sousa
SONETO BÁRBARO
Pedem tónicas na sétima? Cá vão elas, cá vão elas,
A dançar, deselegantes, como bandos de elefantes
Que às doze não chegarão, nem estarão perto de tê-las,
Mas vale a pena tentar, mesmo que em versos gigantes
*
Solfejando um “dó-de-mim” sobre umas linhas singelas,
Construir algumas delas que nos soem mais cantantes,
Sabendo que não serão, nem de longe, coisas belas,
Antes são, em vez de estrelas, versos muito dissonantes.
*
A musiqueta, essa, foi-se desta pauta putativa
Que, para manter-se viva, dá por cada verso, um coice
E - juro! - a gente condói-se, se de harmonia se priva!
*
Eis a música cativa, já sem martelo e sem foice,
Dando coice atrás de coice na pobre da comitiva
Que jamais foi punitiva! Mas o soneto constrói-se!
*
Maria João Brito de Sousa – 09.11.2017 – 10.00h
NOTA – Chama-se BÁRBARO a todo o soneto composto por versos de mais de doze sílabas métricas. Este é composto, na sua totalidade, por dois hemistíquios (metades de um verso) de sete sílabas métricas, o que, como poderão verificar, nem sempre resulta num verso de catorze sílabas métricas, dadas as palavras proparoxítonas (esdrúxulas) utilizadas na sua construção, bem como à dificuldade em criar um ponto neutro (átono) entre os dois hemistíquios de cada verso.
publicado às 10:28
Maria João Brito de Sousa
(Soneto em verso hendecassilábico e rima encadeada)
Castelos na praia... quem lhes reconhece
Aval que se aprece em direitos de autor,
Se feitos de amor e do espanto da prece
Quase me acontece sabê-los de cor?
São quase um pendor... quando um desfalece
Logo outro se of`rece e lhe iguala o esplendor
De fruto, ou de flor, que ninguém desvanece
E assim permanece, seja como for!
Memórias de infância, de infância remota,
Quem não as anota num canto qualquer
Que o corpo escolher, quando as não derrota?
Ressurgem-me em frota, mesmo sem eu qu`rer,
Tomando o poder, mudando-me a rota...
Ah, fazem batota... mas deixo-as viver!
Maria João Brito de Sousa – 08.11.2017 – 11.32h
publicado às 13:45
Maria João Brito de Sousa
ALI...NO CAIS DO SODRÉ
ALI... NO CAIS DO SODRÉ
Ali onde o Tejo parecendo o mar
Vem bem de mansinho encostar-se no cais
E em sua dormência fica a suspirar
Aos pés de Lisboa seus factos reais
Com doces meneios a quer abraçar
Faz juras de amor, dizendo que jamais
Em dia de sol ou noite sem luar
Deixará de vir murmurar-lhe seus ais
E ela enamorada vem cantar-lhe um fado
Num doce clamor num tom apaixonado
E com ar brejeiro vai mostrando o pé
E o Tejo promete,que num gesto eterno
Virá sempre dar-lhe aquele abraço terno
Ali, bem juntinhos, no Cais do Sodré
MEA
1/11/2017
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AQUI, NA BARRA
Aqui, onde o Tejo, deixando pr`a trás
Todo o manso espanto que o prende à cidade
E, avançando sempre, às ondas se faz
Deste mar imenso e, tenso, o invade
Sem medos, nem freios, ainda que em paz
O mar o receba – que o Tejo é saudade
que o mar nunca esquece por não ser capaz -
Num fraterno abraço, sem qualquer maldade,
Só mesmo as gaivotas se fazem ouvir
Mais alto que as ondas do mar que, a rugir,
Com elas faz coro e desgarra, desgarra...
Ouvindo o seu coro, não sei senão ir
Atrás desse som que não sei produzir,
Mas que ecoa em mim e por toda esta Barra!
Maria João Brito de Sousa – 01.11.2017 – 16.44h
(Portuguesa, natural de Oeiras e S. Julião da Barra)
publicado às 17:03