Maria João Brito de Sousa
AGORA II
Agora, diz-me tudo o que quiseres
Agora, é o momento de sentir
Agora, não desfolho malmequeres
Agora, é o instante de sorrir
Agora, é uma pressa que tu queres
Agora, é outro passo no porvir
Agora, é outra seta que desferes
Agora, nem me chegas a ferir
Agora, já passou, já é futuro
Agora, foi o tempo que perdi
Agora, se quiser, posso ser puro
Agora, não importa o que vivi
Agora, já não posso ser mais duro
Agora, já não sei viver sem ti
João Moutinho
MORDENDO O ALHEIO FRUTO
“Agora, diz-me tudo o que quiseres”,
Agora, e não depois, te glosarei,
Agora, bem sabendo que preferes
Que apenas prove e diga que gostei.
“Agora, é uma pressa que tu queres”
E foi precisamente onde eu parei,
Agora, vou esquecer quanto opuseres
Aos versos que, na pressa, te roubei.
“Agora, já passou, já é futuro”
Agora, sem pedir - nada pedi... -,
Tomo posse daquilo que capturo.
“Agora, não importa o que vivi”,
Mordo o poema urgente e já maduro
Que sem pedir licença aqui colhi.
Maria João Brito de Sousa – 24.06.2017 - 09.15h
publicado às 10:13
Maria João Brito de Sousa
NÓS, E MAIS NÓS
Há no meu peito nós. E tantos são!
Que me embargam a voz, cortam o ar
Que fazem os meus pés perder o chão
Quando nele me faço caminhar
É tal este tumulto e confusão
De rituais que me vêm molestar
Que roubam meu sossego, qual ladrão
Quando a noite, serena se vem dar
Percorrem cada vaso, cada veia
Fazendo do meu peito uma odisseia
De suspiros calados plo aperto
Devagar o cansaço trava a luta
O sono chega e vence esta labuta
E do meu peito faz suave deserto
MEA
20/06/2017
TENTANDO DESEMBARAÇAR-ME...
"Há no meu peito nós. E tantos são!"
Alguns são como "a volta do fiel"
Que é duplo e tudo amarra com paixão
Por ser bom cumpridor do seu papel...
"É tal este tumulto e confusão"
Que os versos que acorriam num tropel,
Pararam sob a sua imposição
E foi também parando o meu cinzel...
"Percorrem cada vaso, cada veia"
E dou comigo presa numa teia
Composta pelos nós que havia em mim...
"Devagar o cansaço trava a luta";
Desembaraço estes meus nós "de escuta"(*)
Ou fico embaraçada até ao fim?
Maria João Brito de Sousa - 22.06.2017 - 19.45h
(*) nós de escoteiro
publicado às 20:06
Maria João Brito de Sousa
INFILTRAÇÕES
*
(Soneto em verso hendecassilábico)
*
Já chove e goteja na minha cozinha!
Dispenso-lhe, asinha, coisa que a proteja...
Um balde? Que seja! Mantenho-a sequinha,
sem uma gotinha, nem estragos... que eu veja...
*
Mas, por muito lesta que eu seja, vizinha,
sempre uma gotinha me escapa e rasteja,
se infiltra e graceja... ninguém adivinha
que, ao longe, se aninha nas zonas que eleja
*
E, dia após dia, vai-se acumulando,
mais gotas juntando, fazendo razia;
Por sempre ínvia via se esgueira, infiltrando
*
Pouco adiantando, vos garantiria
que vos saberia dizer como e quando,
mas, nem me escutando... por que é que o diria?
*
Maria João Brito de Sousa - 29.05.2016 - 13. 18h
publicado às 10:36
Maria João Brito de Sousa
Resposta a um amigo que me enviou um soneto por email
(Soneto em decassílabo heróico)
O Poema e Eu... Eu, dos meus, serei sempre a terna amante, A que se lhes entrega, a que é fiel, Pois mal nos nasça um verso, de rompante, Logo os mais vão surgindo, num tropel... Assim me dei desde o primeiro instante E assim me darei sempre. O meu papel, No palco do poema, é ser constante E cavalgar - sem sela... - esse corcel... Um riso, um choro, um grito lancinante... De tudo um pouco neste carrossel Em que o verso galopa e, já distante, Chama por mim se hesita o meu cinzel Em dar-lhe muito mais do que o bastante Pr`a que a ambos nos saiba a escrita a mel...
Maria João Brito de Sousa - 2.06.2016 - 10.25h
publicado às 09:08
Maria João Brito de Sousa
Não mais me prende o Tejo e nem o mar,
De que ao longe vislumbro um quase nada,
Faz por manter-me alegre ou minorar
As penas de uma morte anunciada.
É tarde. É muito tarde pr`a sonhar
E quando um sonho vai, não sobra nada,
Ou sobra-me, acoplado ao que sobrar,
Este sentir-me presa e derrotada.
No entanto, criei. Se ousei criar,
Se fui rebelde, persistente, ousada,
Tive um tesouro e cabe-me aceitar
Ter sido pela musa abandonada,
Ter já perdido a força pr`a cantar
E a sorte de ir morrendo, assim, calada.
Maria João Brito de Sousa -08.06.2017 - 19.21h
publicado às 19:31
Maria João Brito de Sousa
FANTASIA, SONHOS E BRINQUEDOS
Há fantasia, sonhos e brinquedos
Fundidos com amor e esperança
Alegria aventuras e segredos
Nos olhos inocentes da criança
E quando chora e grita com os medos
Nos seus olhos há gotas numa dança
Translúcida, que brotam quais torpedos
Até sentir de novo ar de bonança
Se na água do rio se vê espelhada
Tem nos olhos uma estrela desenhada
Que cintila nos risos que declama
Como sendo poemas, esses risos
Mágicos, que se fazem de improvisos
Quando os seus olhos vêm quem ama
MEA
1/06/2017
A CURIOSIDADE INFANTIL
"Há fantasia, sonhos e brinquedos"
E essa curiosidade natural
Que, ao fervilhar nas pontas dos seus dedos,
Desvenda do complexo ao mais banal
"E quando chora e grita com os medos",
São esses choros coisa ocasional,
Porque logo se apagam nos folguedos
Que engendra pela casa, ou no quintal...
"Se na água do rio se vê espelhada",
Sobre ela se debruça extasiada,
Fantasiando sobre o que ali viu...
"Como sendo poemas, esses risos",
São seus? Serão reflexos imprecisos?
Foi ela ou foi a água quem sorriu?
Maria João Brito de Sousa -02.06.2016 - 10.36h
publicado às 10:50