Maria João Brito de Sousa
Trago nas mãos o mesmo que tu trazes,
Uns pós de um quase nada que não usas,
Um punho, erguido aos dias mais audazes,
E um punhado – infalível! - de recusas…
Grito nas ruas, escrevo-me em cartazes
E exalto-me na cor de tantas blusas
Que ninguém sonhará a quantos “quases”
Reconduzo estas lutas inconclusas…
Devo, porém, dizer-te que fraquejo,
Que, embora corpo e alma, o meu desejo
Seria ir muito além do que consigo…
Que importa?! Ele surge sempre um novo ensejo;
Se me parece pouco o que em mim vejo,
Sempre há-de ser maior por estares comigo!
Maria João Brito de Sousa – 23.09.2012 – 19.14h
publicado às 19:36
Maria João Brito de Sousa
Das pétalas me irrompe uma só pressa;
Estender-me, transparente, intacta e pura,
Entre outras flores que a morte não segura
Antes que a Primavera se despeça…
Não sei se é pertinente, ou vos interessa,
Que fale de quem sou, nesta loucura
Em mim, tornada “eterna enquanto dura”,
Mas que, em murchando, em mim se reconheça.
Interesse, ou não, só nela me defino!
Sou ponte a florescer sobre um destino
Que pode, ou não, ser meu… pouco me importa!
Persigo-me a mim mesma em desatino
E só sei serenar se me imagino
Comemorando a flor, depois de morta.
Maria João Brito de Sousa – 19.09.2012 – 21.03h
publicado às 22:04
Maria João Brito de Sousa
AO ANIMAL CRIADOR QUE NOS HABITA
Amo as penas discretas dos pardais,
Macias, leves, quase intemporais…
Amo a serena calma dos meus dias,
Sem saudade, sem medo ou nostalgias,
Repudiando humanas tiranias,
Liberta já das cangas tão banais
Do que se engendra em ciclos rituais
Devoro a manhã clara, as tardes mansas,
Retorno à tal menina que usa tranças,
Devolvo corpo e alma às simples danças
Das coisas sem rotina, ocasionais,
Que são espólio comum dos animais.
“O morto és tu, Lázaro! Surge et ambula!”
Citando António de Sousa em Mea Culpa, Mea Maxima Culpa – Livro de Bordo
Maria João Brito de Sousa – 13.09.2012 – 15.33h
publicado às 23:14
Maria João Brito de Sousa
Eu, que tanto o pratico, sei tão mal As razões de voar do próprio engenho… Sinto que é muito meu, mas sei-o estranho E chego a acreditá-lo original… Por vezes, volitando, é um pardal Que por mim passa a ver quando o detenho, Sabendo que eu, sem asas, não desdenho Um timorato adejo ocasional… E logo as mãos me adejam no teclado Por causa de um pardal me ter tentado, Por obra de tão parca tentação Que é caso pr`a dizer que ter voado Tem sempre uma razão, sempre um “culpado” E as "culpas" nunca são da própria mão… Maria João Brito de Sousa – 05.09.2012 – 20.10h
Imagem de pardoca, retirada da net, via Google
publicado às 20:23
Maria João Brito de Sousa
Há sempre uma coragem que se inventa
E outra que habita em nós, sempre a crescer;
Uma que oferece a força àquele que tenta
E outra que há-de tentar até morrer!
Há sempre um sonho mais que se acrescenta
Ao rol daquilo que haja pr`a fazer
E um bichinho voraz que se alimenta
Do que, antes, foi capaz de nos vencer
E há sempre uma certeza que nos move
Dentro desta engrenagem sabotada,
Que, às vezes, faz chorar, que nos comove,
Mas que em chegando a nós não pede nada
Senão a força hercúlea que promove
Assim que faz de nós sua morada...
Maria João Brito de Sousa – 01.09.2012 – 18.45
IMAGEM - Gravura de JOSÉ DIAS COELHO retirada da net, via Google
publicado às 21:01