Maria João Brito de Sousa
I A ceifeira, nos trigais, Traz nas mãos sonhos negados E os dedos bem calejados De quem já ceifou demais… Flancos doendo, agachados, Entre mil gestos iguais Evoca uns pontos errados Destas questões laborais… Essa ceifeira não chora, Mas começa a acreditar Que pode bem estar na hora De que quem assim a explora Também se deva agachar Tal como ela o faz agora…
II Já não sonha, as dores são tantas Que só pode trabalhar Se as abafa nas mil mantas Que inventa pr`ás disfarçar… Faltam horas, umas quantas, Pr`á ordem de “despegar” E as ceifeiras, como as plantas, Podem, às tantas, murchar… Vai longa a jorna, ceifeira! Já esgotada da labuta, Tão no auge da canseira Depois de uma tarde inteira, Pensa enfim: - Antes a luta Que viver desta maneira!
III
Reúne os seus companheiros Da labuta dos trigais, Fala dos dias inteiros Sol a sol, sem poder mais, Lembra a escassez dos dinheiros, Diz que os patrões, sendo iguais, Os tratam como aos carneiros Que abundam nos seus currais… É dessa reunião, Que lhes nasce, firmemente, Uma justa decisão De exigirem mais do pão Que é devido a toda a gente Mas só não falta ao patrão…
IV Vão em grupo e vão em paz Falar da fome que sentem Pois pela fome se faz Quanto os fartos não consentem… Encontram o capataz, Dizem ter fome… e não mentem, Só o não sabem capaz De matar os que o enfrentem… Soa um disparo… a ceifeira Cai por terra; - O que se passa? Catarina, à dianteira, Jaz morta sobre uma leira Por ter negado a mordaça De humilhar-se a vida inteira!
Maria João Brito de Sousa – 26.04.2012 – 19.11h
IMAGEM - "A MORTE DE CATARINA EUFÉMIA" - Gravura de José Dias Coelho, retirada da net
publicado às 19:45
Maria João Brito de Sousa
publicado às 13:41
Maria João Brito de Sousa
Se escrevo e a voz me soa em poço fundo, Se vai crescendo pouco inteligível Pr`a quem, tal como eu, anda no mundo, Será poema em vão, grito inaudível…
Mas se se eleva mais, se chega a quem Quanto aqui escrevo possa decifrar, Se encontro a voz na voz de quem lá vem, Mesmo que tente, apenas, perturbar,
Mais que não seja pra lembrar que aqui Está quem, não desdenhando uma partilha, Questiona um novo mundo em rota incerta,
Terá sido pr`ó mundo o que eu escrevi; Pra todo aquele que nega ou que perfilha A voz do meu poema em carta - aberta.
Maria João Brito de Sousa – 19.04.2012 – 18.32h
publicado às 19:57
Maria João Brito de Sousa
Um dia, a mão na rédea, o pé no estribo, Lançou-se um cavaleiro em cavalgada Na esp`rança de encontrar a dama amada Que - narrava uma lenda - estava em p`rigo, Porém, fez dessa lenda o seu castigo, Pois não soube, sequer, achar a estrada Que conduzisse os passos da montada A alguém que, em vez de amor, quisesse abrigo... Diz-se que corre ainda atrás da lenda, Que há-de fazê-lo enquanto não pretenda Senão o desenlace em que ousou crer, O princípe-encantado-sem-emenda Que aspira, estrada afora, à estranha of`renda De perder-se a salvar quem o não quer…
Maria João Brito de Sousa – 11.04.2012 – 18.59h
Imagem retirada da net, via Google
publicado às 19:08
Maria João Brito de Sousa
Passa num nada este nada Que duma vida nos cabe Quando olhamos para a estrada Temendo que ela se acabe… Vamos medindo a passada Antes que tudo desabe Mas, duma estrada acabada, Pouco ou nada a gente sabe Pois, por mais que se procure Razão para os desatinos A que a estrada conduzia, Nunca evitamos que jure; - Todos vós nasceis meninos e haveis de morrer um dia…
Maria João Brito de Sousa – 06.04.2012 -13.21h
NOTA - Peço desculpa pela inusitada apresentação do texto poético... a decisão foi do Sapo...
publicado às 13:47
Maria João Brito de Sousa
São tantas as variáveis Desta equação de viver Que os resultados prováveis Jamais se hão-de resolver Mas, entre as mais condenáveis Das mil coisas por fazer, Estará sermos vulneráveis Aos disfarces do Poder... Que, ao pouco que aqui fizermos, Se acrescente o nosso amor Pois, nas mil voltas que dermos, Andaremos ao sabor Da Vontade que opusermos À avidez do predador…
Maria João Brito de Sousa – 04.04.2012 – 19.26h
publicado às 19:38
Maria João Brito de Sousa
Sobre tudo o que nasça e que se exprima Em forma do que nunca vos direi, Desse enigma me basta, eterna, a rima Pr`a falar-vos do muito que eu não sei E, mesmo que não haja quem redima Quantas lacunas já por cá deixei, Que importa se de música se anima O quanto quis dizer, mas não logrei? Jamais duvidarei de alguém que entenda Que ousar a melodia é dar-lhe a voz Que expressa o seu sentido universal, Ou que, ao ouvi-la, exulte e compreenda O quanto dela vibra em todos nós Se o ritmo que alcançou foi musical…
Maria João Brito de Sousa -02.04.2012 - 15.15h
Maria João Brito de Sousa – 02.04.2012 – 14.53h
publicado às 15:15