Maria João Brito de Sousa
Disto, que te não escondo, nada nego;
Nem o intenso olhar com que te fito,
Nem, vago, o esgar da dor que quase evito
Mas te revela o meu desassossego.
Do resto, que não disse, nem delego
Na boca de outro alguém, pois não admito
Que um outro assuma aquilo que foi escrito
Noutro modo verbal que nunca emprego,
Do restante - dizia – e dessas letras
Que, em tempos, me ficaram por escrever
Nos papéis que recordo (ou vejo e sinto?),
Surge a ponta do véu que esconde as metas
Que nunca revelou, mas, sem saber,
Te irá, depois, mostrar que te não minto.
Maria João Brito de Sousa – 29.12.2010 – 19.01h
publicado às 12:46
Maria João Brito de Sousa
Cada verso me nasce, sem pedir,
Com asas de papel, corpo de chama,
Quando, nele, em voz alta se proclama
Tudo quanto me doa… se o sentir…
Cada verso que "roubo" é, sem mentir,
Isento de razão, alheio à fama,
Surgindo como a chuva se derrama
Sobre eternas planuras a florir.
Cada qual se reforça quando afirma
Seu derradeiro apelo à solidão;
Rabisco mal esboçado, mas urgente
De quem dispensa um outro que o redima…
Por cada verso, a ponte em suspensão
Entre aquilo que sou e toda a gente…
Maria João Brito de Sousa - 29.12.2012 - 14.51h
publicado às 14:51
Maria João Brito de Sousa
Há dias em que tudo me transcende;
A rota de um cometa, a Terra, o Céu…
[as coisas que aqui vejo, Deus mas deu,
mas só porque, quem sou, logo as entende…]
Nesses dias, serei quem compreende
Que o mundo, revelado, é todo meu,
Que basta levantar a ponta ao véu
E a chama que há em mim logo se acende…
Mas se é certo que um dia não são dias,
Que os mais me trazem duras agonias,
São coisas que se esquecem pois virão
Os que trarão sorrisos, alegrias,
Os do deslumbramento e fantasias;
Há sempre um “dia sim” nas “vidas não”...
Maria João Brito de Sousa - 28.12.2010 -12.09h
publicado às 12:09
Maria João Brito de Sousa
PUPPEN THEATER - 1923 – Aguarela sobre fudo de giz sobre dois papéis, debruado a aguarela e pena sobre cartão
Paul Klee
Como se me nascessem quando quero,
Como se eu carregasse num botão
E se materializasse a inspiração,
A tal que só me vem quando a não espero...
Como se fosse simples! Não tolero
Ser submetida a tanta sujeição!
Mas, se sou eu quem me comanda a mão,
Quem o comanda a ele? E desespero...
Mostra vontade própria, esse poema
Que faz o que quer porque nasceu
Do que não sei explicar, desse mistério
Que veio não sei de onde e, sem um tema,
Desceu sem me dizer por que cresceu
Tal qual como um ser vivo, sendo etéreo.
Maria João Brito de Sousa – 23.12.2010 – 17.10h
NOTA DE EDIÇÃO - Por esta estrada*, caminha-se para o subtítulo do Poetaporkedeusker, para a minha paralela paixão pela biologia, para o entendimento – ou não… - da abstracção e para todas as inexplicabilidades. Esta foi construída por mim e traz marcadores que são meus, que têm a ver com o percurso que eu escolhi depois da interacção com todas as infinitas variáveis que se me foram apresentando ao longo do caminho… mas é também, de alguma forma, a vossa estrada porque, na sua essência, nos remete, a todos, para a inexplicabilidade, em geral.
Façam favor…
*soneto…
publicado às 12:18
Maria João Brito de Sousa
Não escreverei até que as mãos me doam
Pois muito além da dor, ainda escrevo
E, às vezes, digo tudo o que não devo
Que nem deuses, nem o homens me perdoam,
Mas, se pressinto as rimas que ressoam
E se acaso as alcanço, onde me atrevo,
Prendo-as nas duas mãos que logo elevo
Em estandartes, como aves quando voam.
São asas transcendentes, vigorosas,
Vermelhas como as pétalas viçosas
Que preferem morrer a ser vencidas
Em estrofes que persistem, que, teimosas,
Brandem espinhos agudos, como as rosas
Que sempre os usarão quando colhidas.
Maria João Brito de Sousa – 22.12.2010 – 00.13h
http://www.dominiopublico.gov.br/ - Um site que recomendo e que corre o risco de terminar por ter muito poucos visitantes
publicado às 11:56
Maria João Brito de Sousa
Noutro ponto qualquer desta viagem,
Num dia a que não sei dizer o nome,
Encontrarei, talvez, força e coragem
Pr´a negar esta absurda, humana fome.
Terei, enfim, traçado a minha imagem
E não haverá mundo que me dome
Pois serei, de quem fui, simples miragem
A diluir-se na luz em que se some.
Será num tempo ainda por chegar,
No desaguar de um rio que ruma ao mar
Na barca destas tábuas que talhei…
Será onde eu couber, mas há-de ser!
E é tudo o que, pra já, posso dizer
Porque, a bem da verdade, eu nada sei!
Maria João Brito de Sousa – 20.12.2010 – 19.59h
publicado às 12:41
Maria João Brito de Sousa
MISTÉRIOS DE TODAS AS POÉTICAS
Há gotas de suor nos meus sonetos,
Jorrando de outros poros, porque os meus
Não podem entender tantos dialectos
E portam-se, por vezes, como ateus
Que pasmam só de olhar os riscos pretos
Feitos – quem sabe… - pela mão de Deus,
Destes grafismos estáticos, erectos,
Que descrevem o Mar, a Terra, os Céus…
Inunda-me, o poema, o corpo inteiro,
Escorrendo como a tinta de um tinteiro
Que outro alguém, derrubando, não quisesse
Aceitar nas palavras que eu emprego
E, à pressa, derramasse um grito negro
Sobre o que eu escreveria… se pudesse.
Maria João Brito de Sousa – 18.12.2010 – 18.36h
CONDICIONALISMOS, COMODISMOS E RECEIOS, S.A.
Eu cantaria a rosa que há em mim,
Mas posso muito bem vir-me a esquecer,
Ou mesmo perguntar-me, até ao fim:
- Se um espinho me picar, irá doer?
Eu cantaria as ervas de um jardim
Até o mundo olhar e entender
Mistérios numa haste de alecrim...
Mas se ele for cego e nunca o puder ver?
Há preconceitos e receiozinhos
Que vão atando as mãos da minha voz
E que me vão deixando assim, perdida
Na conjectura de actos comezinhos…
Ficam flores e jardins muito mais sós
E assim se vão as horas de uma vida.
Maria João Brito de Sousa – 15.12.2010 – 19.19h
NATAL - Amor, simbolismos e metáforas
Tão leve é o seu jugo… e já chegou
O tempo de afastar toda a cegueira
Porque o Tempo cresceu, tudo mudou,
Mas nunca foi Natal na Terra inteira.
Tão suave a sua carga… e demorou,
Como qualquer terrena sementeira,
O tempo necessário, o que bastou,
Pra dar vida ao escondido na poeira.
Tão ínfimo e tão grande! Que pesada
A mão que desferiu a chicotada,
Qual célula a cumprir suas funções
Em troca do perdão, na consoada,
Escolhe nascer na mesma humana estrada
Em que, ao morrer, reinou sobre as paixões.
Maria João Brito de Sousa– 16.12.2010 - 19.25h
publicado às 15:17
Maria João Brito de Sousa
Há rios mais caudalosos, outros menos,
Há-os com margens planas, ou escarpadas,
Com percursos maiores, ou mais pequenos,
Com e sem quedas de água alvoroçadas...
Há discursos que são como venenos
Cheios de frases “feitas”, tão estafadas,
Que não contribuirão pr`ó que aprendemos
Pois só repetem coisas já escutadas…
Há rios que têm leitos tão constantes
Que, ao passar, deixam tudo como dantes,
Que nunca nos farão nem bem, nem mal…
Assim se hão-de pautar vossos discursos;
Os rios mais sinuosos nos seus cursos
Podem nem nos trazer grande caudal…
Maria João Brito de Sousa – 16.12.2010 – 20.12h
publicado às 11:24
Maria João Brito de Sousa
Na tarde imaginária e soalheira
De um pedaço de terra por escrever,
Isolada, crescera uma palmeira
Junto a um curso de água por nascer.
Ninguém soube dizer se era a primeira
Pois não teve ninguém pr`á receber
E ninguém nos dirá se a derradeira
Pois sei que mais ninguém a pode ver.
Na tarde calma despontou, contudo,
Fazendo ouvir um estranho apelo mudo
Que não seria audível pr`a ninguém.
Nasceu, mas foi por pura antinomia
Ou mera sugestão de uma ironia
Que a neguei mas que quis nascer, também.
Maria João Brito de Sousa – 14.12.2010 – 19.12h
publicado às 11:24
Maria João Brito de Sousa
De um céu escuro, fechado e opressivo,
Surge aquele astro em vias de reforma
Que não pára, que brilha e contra a norma
Nos dizem estar sobejamente vivo!
Pr`a leigos, aquele astro é tão excessivo,
Quão impensável tudo o que transforma
O ecrã plúmbeo de uma tarde morna
Num filme censurável, intrusivo...
Que astro seria aquele que então brilhava,
Que, passando a correr, se partilhava
Sem que ninguém soubesse de onde vinha?
Que mistérios trará? E nem sequer
Nos mostra claramente o que nos quer,
Nos dá conta da luz que o encaminha…
Maria João Brito de Sousa – 09.12.2010 – 18.56h
NOTA DE EDIÇÃO DE POST – Eu, como qualquer revolução que se preze, também paro em todos os sinais vermelhos…
publicado às 11:34
Maria João Brito de Sousa
Quem, querendo dar-me vida, a perde assim
Decerto desconhece o que sobrou
Desta anímica força que há em mim,
Ou desconhece mesmo quem eu sou…
Desconhece este jogo até ao fim
E o treino de o jogar que me ficou
Depois de ter vencido, ao dizer; - Sim!
A partida a que a morte me forçou…
Mas, sendo assim tão frágil, todos pensam
Que o que eu vos relatar será mentira,
Exagero, talvez… mera invenção!
Neste Ping-pong, à espera que me vençam,
Troféu que já ganhei, ninguém me tira!
[bolinha que cair… fica no chão!]
Maria João Brito de Sousa
Imagem retirada da internet
publicado às 12:28
Maria João Brito de Sousa
El` que, ali, tanto se dava
Lá ficou sem perceber
Do que essa gente falava;
De trabalho e de dever?
Afinal, quem é que estava
A “desafinar” sem qu`rer?
Ele, ao ser feliz, mostrava
Que “dar” significa “ter”…
Melhor seria calar-se,
Fazer de concha e fechar-se
Sobre essa sua riqueza!
Afinal, isto de dar-se
Pode, por vezes, mostrar-se…
Quem sabe?… indelicadeza?
Maria João Brito de Sousa
publicado às 10:58