Maria João Brito de Sousa
Meu estro de luar dobra a finados,
Vão-se-me as mãos crispando sobre o rosto
Que já desfeito em rios – em rios salgados –
Dá largas à aflição de outro desgosto.
Mas, dois dias depois, quando, encantados,
Meus olhos se secaram, ao sol-posto,
E os dedos, relaxados, mergulharam
No leito do meu lago, em pleno Agosto,
Não haveria rio que transbordasse,
Nem nuvem que escondesse o azul do céu,
Mágoa que estrangulasse a voz que trago!
Não haveria, então, quem me alcançasse
Na plena criação do que era meu!
E assim me nasceria um novo lago.
Maria João Brito de Sousa – 27.06.2010 – 18.52h
IMAGEM RETIRADA DA INTERNET
publicado às 11:32
Maria João Brito de Sousa
DEPOIS DO ESCURO - Brevíssimo ensaio sobre uma alucinação ou Morte
Quando, em horas lunares, o medo arpoa
A complexa embalagem que te envolve
E te faz recuar, por mais que doa,
Até onde a razão te não resolve
E quando ao teu ouvido a voz ecoa,
Te antecipa um castigo e te devolve
O eco aterrador que em ti ressoa
Enquanto o que Tu eras se dissolve
Deixando a porta aberta ao teu temor…
Saberás tu, então, permanecer?
Saberás aceitar, estando seguro
Do Nada que antevês assustador?
[Flutua sem receio de temer
A luz que vem depois. Depois do escuro].
Maria João Brito de Sousa – 27.06.2010 – 21,55h
PERCURSO II
Um dia, por razões que desconheço
Ou que já não consigo recordar,
Prescindi da razão. Paguei o preço
De algo que nem sequer ousei usar…
Mas, se está pago e se este recomeço
Puder, de alguma forma, ter lugar,
Eu juro que estou pronta e mais não peço;
“Isto” é tudo o que sou, sem mascarar!
Contudo alguma coisa vai faltando
E essa é a razão que vai fazendo
Com que este meu trabalho de crescer
Possa continuar. Um dia, quando
O corpo que me cobre, envelhecendo,
Me recusar trabalho… é pr`a morrer!
Maria João Brito de Sousa – 27.06.2010 – 22.58h
O SEGREDO II
Perguntas-me do tempo que me resta…
Amigo, isso eu não digo, isso eu não sei…
Tu nem sonhas o preço que eu paguei
Por esta insubmissão de ser honesta,
Por ser o que outros julgam que não presta,
Mas para mim é tudo o que sonhei!
Portanto, amigo, eu nunca te direi
Que cada dia, em mim, se vive em festa…
Segredos, se os tiver, são coisas fúteis
Na tua perspectiva, mas, na minha,
Mais altos que o castelo em que me abrigo!
Por isso te direi coisas mais úteis;
Falar-te-ei do Deus que me encaminha,
Mas nunca do meu Tempo, querido amigo!
Maria João Brito de Sousa – 27.06.2010 – 18,16h
publicado às 15:54
Maria João Brito de Sousa
Enquanto a bola rola no relvado
E as respirações, entrecortadas,
Mostram bem a tensão que, em cada lado,
Arrosta multidões entusiasmadas,
Eu devo confessar ter reparado
Que ninguém meteu golo e, nas bancadas,
Se grita: - Portugal, tem lá cuidado,
Não vá entrar-te um golo às três pancadas...
Não acabou ainda, ainda há esp`rança
De meter um golito - um só que seja! -
Pr`animar estes lusos navegantes
Naquele rola-que-rola com pujança,
Que - como diz Camões... - o mundo inveja,
A tentarmos vencer outros gigantes!
Maria João Brito de Sousa, quase no final do Portugal x Brasil
publicado às 16:25
Maria João Brito de Sousa
E o que hei-de fazer se esta cabeça
De repente tontinha e esvaziada
Se recuse a pensar sem que eu lho peça,
E me deixe pr`aqui desamparada?
Por muito que lhe diga: "- Anda depressa
Porque o tempo não pára e, de atrasada,
Me parece provável que pareça
Poeta desistente ou desleixada..."
Ela, sem se importar com tanta queixa,
Continua tontinha e não me entende
Ou faz que não entende e não me liga...
Tanta dor de cabeça já me deixa
Capaz de acreditar que ela pretende
Usurpar as funções de uma barriga!
Maria João Brito de Sousa
publicado às 15:56
Maria João Brito de Sousa
A PROCURA II
Falaste-me de um Deus que não conheces,
Tal como eu assumi não conhecer
Quem ouve, noite e dia, as minhas preces,
Quem me inspira as palavras que eu escrever,
Porém, no mesmo Deus, tu reconheces,
Tanto quanto eu me pude aperceber,
A força da procura e até pareces
Mais empenhado Nele que outro qualquer…
Se aonde tu subiste eu alcançasse,
Bem mais perto estaria de alcançar
A força que me move e me acalenta
Tão só tanta procura eu consagrasse
- como tu o fizeste ao caminhar –
Com essa convicção que te sustenta.
Maria João Brito de Sousa – 21.06.2010 – 19.58h
ESTA IMENSA FOGUEIRA DE PALAVRAS...
Sei que não sou pior pelo que faço…
Celebro a mesma vida que celebras
Vestindo o amanhã das ternas pregas
Do manto de palavras deste abraço
Mas desta virtual linha que traço
- a mesma que tu negas sem reservas -
Entregarei bem mais do que me entregas
No limiar do esforço e do cansaço;
Deixarei só palavras! São sementes
Que agora não entendes mas, mais tarde
No espaço de outro tempo, irão florir
Só não quero, de todo, que lamentes
Esta imensa fogueira que em mim arde
Enquanto eu vou escrevendo e te oiço rir…
Maria João Brito de Sousa – 22.06.2010 – 18.51h
NOTA - Hoje publico, excepcionalmente, dois sonetos. Ontem publiquei, por engano, um soneto que havia sido publicado na véspera.
As minhas desculpas.
publicado às 14:21
Maria João Brito de Sousa
Tão longe estão as estrelas e, contudo,
Tão perto podem estar do que sentimos
Quando nós, os cometas, lhes sorrimos
E quando, no sorriso, damos tudo…
Tão perto sinto a estrela e, se me iludo,
É porque eu e a estrela somos primos
Nessa família astral que definimos
Na fazenda de um velho sobretudo…
Casacas de Cometas, Luas, Sóis,
Palavras que não vergam, que se inventam
Em astros nunca dantes alcançados
Pelos descobridores que só depois
Abrirão os portões que em si concentram
Mil mundos que mal foram vislumbrados …
Maria João Brito de Sousa – 20.06.2010
publicado às 11:44
Maria João Brito de Sousa
UMA ESTRADA DE PALAVRAS
O sol nasceu de novo, quem diria?
Há, apesar de tudo, uma diferença;
Adormeceu, por fim, essa alegria
Que, estranhamente, vinha da presença.
Aprendiza da escrita, que harmonia,
De súbito quebrada, te pôs tensa,
E depois te roubou tudo o que havia
Suscitando tristeza tão imensa?
Que solidárias forças te tocaram,
Que estranhas harmonias se quebraram
E te deixaram tão desanimada?
E as horas, que em passando não passaram,
Responderam palavras que ficaram
Gravadas no papel, como uma estrada.
Maria João Brito de Sousa – 19.06.2010 – 17.20h
OS OPERÁRIOS DA PALAVRA
Enquanto a nossa escrita aqui deixamos,
Nós, eternos operários da palavra,
Seremos sempre aquilo que criamos
A tempo inteiro, nesta nossa lavra
Realidade é tudo o que engendramos
A partir desta força – a louca escrava! –
Que produz sempre mais do que esperamos
Quando o punhal da escrita em nós se crava
Será sempre uma escolha. Este salário
- Quantas vezes não mais que estarmos bem
Com a força interior de uma Vontade –
Nos diz: - Tu que escolheste ser operário
Deverás não esquecer que te convém
Ser escravo dessa mesma Liberdade!
Maria João Brito de Sousa – 19.06.2010 – 16.49h
TÃO LONGE, TÃO PERTO
Tão longe estão as estrelas e, contudo,
Tão perto podem estar do que sentimos
Quando nós, os cometas, lhes sorrimos
E quando, no sorriso, damos tudo…
Tão perto sinto a estrela e, se me iludo,
É porque eu e a estrela somos primos
Nessa família astral que definimos
Na fazenda de um velho sobretudo…
Casacas de Cometas, Luas, Sóis,
Palavras que não vergam, que se inventam
Em astros nunca dantes alcançados
Pelos descobridores que só depois
Abrirão os portões que em si concentram
Mil mundos que mal foram vislumbrados …
Maria João Brito de Sousa – 20.06.2010
A José Saramago
A António de Sousa que com ele partilha a eternidade, o amor pela literatura e Sete Luas.
publicado às 12:06
Maria João Brito de Sousa
Quando canto o Amor, eu canto a Vida, Sobrevivendo à dor de cada dia E é meu canto a simples despedida Deste lado da Vida em que eu vivia... Soa o meu canto e afasta-se, perdida, A mais elementar desarmonia Porquanto este meu espanto dá guarida À esperança, a crescer, de um novo dia... Se canto é porque o canto em mim desperta A sede de cantar que é tão mais forte, Quão forte for o canto que a motiva E, pelo canto, eu parto à descoberta Dos horizontes do meu novo norte Com a plena certeza de estar viva! Maria João Brito de Sousa
NOTA - Soneto inspirado num soneto com o mesmo nome de Efigênia Coutinho, Presidente Fundadora da Academia Virtual Sala dos Poetas e Escritores www.avspe.eti.br/
publicado às 12:00
Maria João Brito de Sousa
(Soneto em decassílabo heróico) Soneto que me nasça “por favor”, sem essa rebeldia indefinível dos versos que se esculpem por amor na sequência de urgência irreprimível, Bem pode ostentar forma e ter rigor, mas falta-lhe a “centelha”, essa indizível, que o tempera, o reforça, dá vigor, e é, no fundo, o que o torna irrepetível... Mas … que posso fazer contra a vontade, transformada em rotina involuntária. que me exige um soneto? Aqui o deixo, Sabendo que ajo mal pois, na verdade, por capricho tornei-me, a mim, contrária e, em vez de excelência, urdi desleixo... Maria João Brito de Sousa – 17.06.2010 – 09.26h
NOTA -
Soneto inteiramente reformulado a 22'06.2015
Ontem consegui ainda publicar no http://liberdadespoeticas.blogs.sapo.pt/ no http://asmontanhasqueosratosvaoparindo.blogs.sapo.pt/ no http://mumbles.blogs.sapo.pt/ e http://contra-sensual.blogs.sapo.pt/
Fica o "aviso à navegação", caso vos apeteça passar por lá.
publicado às 11:54
Maria João Brito de Sousa
Procuro, não te encontro e, se duvido
Dessa tua presença vertical,
É por ser tão humana e sem sentido
Não é por querer negar-te ou dizer mal…
Procuro mais ainda e, se divido
Esta minha incerteza ocasional
Com quem estiver por perto, quem comigo
Possa sentir que isto é disfuncional,
É porque esta procura se demora
Na esquina dos minutos que há na hora,
Ao longo duma rua que não finda.
Procurando, caminho estrada fora
E enquanto caminho, como agora,
Descubro o que em procura se deslinda…
Maria João Brito de Sousa
publicado às 15:43
Maria João Brito de Sousa
Não semeaste Tu, nas ondas bravas,
A espuma de corcéis jamais domados?
Dos profundos abismos que criavas
Erguiam-se eles, depois, espumando irados…
E nesse imenso sonho em que moldavas
No futuro os penhascos planejados,
Que imensa força em Ti mesmo encontravas
Nesse acto de engendrar os incriados?
Depois, desses corcéis de branca espuma
Que galgavam planícies infindáveis,
Eclodiria a vida primitiva
Que se acrescentaria e que, uma a uma,
Conquistando os vazios mais improváveis,
Morreria tão só pr`a ficar viva…
Maria João Brito de Sousa – 14.06.2010 – 23.28
IMAGEM RETIRADA DA INTERNET
publicado às 11:26
Maria João Brito de Sousa
OURO NEGRO, NEGRO...
Enquanto o “ouro negro” se derrama
Nas águas de um Pacífico inquinado,
Há um que é indiferente, um que reclama
E outro que já morreu envenenado.
Nasce de novo o sol, mas morre a chama
E apaga-se o pavio enquanto o fado
Se faz ouvir por quem tanto o declama
E adormece depois de declamado…
E borbulhando sobe, esse ouro negro
Que deixa um rasto bem mais negro ainda
Manchando as mãos de quem o não deteve,
Deixando o mundo num desassossego
E pondo tanta gente na berlinda
Porquanto muito tendo, `inda mais deve…
Maria João Brito de Sousa – 07.06.2010, 12.21h
AS FLORES DE MAÇAPÃO
Se as flores de maçapão fizessem contas
Acerca dos sabores, das sensações
Que podem suscitar, as pobres tontas,
Custariam bem mais que alguns tostões…
Fossem de maçapão as soltas pontas
Que nos vão impedindo as soluções
E eu teria sempre as coisas prontas
Em vez de andar perdida em tentações…
Se muitas coisas se “ antitetizassem”
Ou mudassem, tão só, de direcção
Por um segundo, por um só que fosse,
E se muitas pessoas não pensassem
Que nada há de melhor que o maçapão
Apenas porque torna a vida doce…
Maria João Brito de Sousa – 07.06.2010 – 19.46h
O CAMPEONATO
Por muito que o espectáculo comova
E leve além-fronteiras tanta gente,
Por mais que o Campeonato se promova
No berço do africano continente,
Não lhe encontro o mistério que me mova,
Que dê vida ao poema – sempre urgente –
E disso, agora mesmo, faço prova
Neste absurdo soneto que não mente…
Não consigo forçar-me! O que fazer,
Se só digo a verdade, em Poesia,
E se ela me comanda a toda a hora?
Que ganhe o meu país [isto é dizer
não mais do que um qualquer por mim diria…]
E viva Portugal pl`o mundo fora!
Maria João Brito de Sousa
publicado às 11:39