Da autoria de Maria João Brito de Sousa, sócia nº 88 da Associação Portuguesa de Poetas, Membro Efectivo da Academia Virtual Sala dos Poetas e Escritores - AVSPE -, Membro da Academia Virtual de Letras (AVL) , autora no Portal CEN, e membro da Associação Desenhando Sonhos, escrito num portátil gentilmente oferecido pelos seus leitores.
...porque os poemas nascem, alimentam-se, crescem, reproduzem-se e (por vezes...) não morrem.
Saiu da agência de viagens arrumando, na malinha a tiracolo, a papelada que escrevera nos intervalos dos telefonemas dos muitos turistas que pediam o apoio da sua “hostess” depois do check-in no hotel. Eram quatro e meia de uma tarde de Verão e as palavras do chefe do Foreign Department soavam-lhe, ainda, aos ouvidos:
- Maria João, gostaríamos de tê-la no nosso próximo Grupo da Getaway Adventures, desde Espanha, acompanhando o grupo desde lá.
Não respondera logo. Esboçara um sorrisinho “polite” e murmurara meia dúzia de palavras que não queriam dizer coisa nenhuma. Aquele momento seria supostamente especial. Era-o. Não da forma que seria para as suas colegas que viviam e trabalhavam de olhos postos na primeira viagem. Na inesquecível primeira viagem.
Para ela era muito diferente. A palavra fazia-lhe despontar raízes por dentro e por fora. Não era medo. Não era falta de ambição. Era uma ausência de medos e um desvio real das ambições… as dela ficavam-se mais por ali, pelas escadinhas da estação do Rossio onde os alfarrabistas de rua espalhavam os exemplares semi-novos e muito antigos onde, inevitavelmente, ficava a viajar durante horas. Colega que a acompanhasse
Acabava por desistir da companhia e rumar sozinha aos Porfírios enquanto ela, esquecida de horas e desoras, se eternizava nas escadinhas, entre páginas de velhos alfarrábios.
Tomava sempre como própria da sua pouca idade aquela excentricidade que tentava dissimular, quantas vezes da forma mais desastrada…
Deixou, em troca de dois exemplares de Nefrologia Clínica, uma boa parte do que ganhara no “transfer” do dia e rumou à estação de comboios, remoendo ainda as palavras do chefe. O raio da viagem estava-se-lhe a tornar incomodativa, colava-se-lhe às páginas do livro, consumia-lhe as letras num rodopio constante que lhe tirava o prazer da leitura… ou da interiorização das palavras que lia. Impedia-a, inclusive, de saborear as cores e os paladares das ideias que se lhe começavam a enredar nos vês, nos iis e nos gês das viagens. Fechou o livro enquanto evitava, com a habilidade de uma longa experiência, um encontrão no senhor que vinha em sentido contrário e que parecia mais interessado nas pedras da calçada do que ela na porcaria da primeira viagem.
Quase, quase a chegar à estação dos comboios perdeu o olhar no céu que escurecia. Parou por instantes e olhou os pombos sedentários que por ali debicavam invisíveis migalhas. Abriu a carteira, retomou o percurso num passo mais decidido e anotou na agenda… “Amanhã – avisar a Benilde de que se vá preparando para tomar o meu lugar na viagem”.
Guardou a agenda enquanto entrava no comboio, pronta para retomar a leitura sobre o diagnóstico precoce das nefropatias.
Peço desculpa se não puder postar mais nada hoje. A E.T. acaba de morrer e não me sinto em condições de publicar nada. Não estou a lamentar-me. Estou a reportar um facto que doeu muito. A ET não foi recolhida por mim. Foi a minha mãe que, antes de morrer, a trouxe para cá, ainda com os olhos fechados, cordão umbilical e tudo. Tinha - e tenho - um carinho muito especial por esta pequena sobrevivente e preciso de fazer o meu luto.
Lamento muito que ela tenha morrido. Não me lamento muito.
Este post vai ser publicado com a opção “pré-datação” e constantemente actualizado em termos de horário, de forma a que, quando esteja visível possa significar que fiquei sem acesso à internet.
Tenho, com efeito, um acesso de banda larga, USB, da TMN em atraso de pagamento. Não houve desleixo. Houve apenas uma tentativa de chegar até onde pudesse e, por vezes, um pouco além. De ser profunda e intensamente “Eu mesma”… aquela qualidade da qual Deus, mais tarde, me pedirá contas…
Penso que não seja novidade para ninguém que estou a auferir de um subsídio da Segurança Social, no valor de 181,91€… foi aumentado, este ano, para 187 e alguns cêntimos de que não consigo, neste momento, lembrar-me com matemática exactidão. A Crise, – o raio da crise! – pelos vistos, anda a fazer grandes estragos em muito boa gente e as beneméritas que me auxiliavam com os animais não lhe escaparam… diminuíram consideravelmente os donativos para o “hospital veterinário” aqui do 4º Frente.
Também não é novidade – penso eu… - que de vez em quando tenho de comer qualquer coisinha. Opto, quase sempre, por uma sopa ou uma meia-de-leite no cafezinho da esquina, por razões que, a mim, me parecem óbvias… mas que talvez só o sejam… para mim. Para mim que pago, sozinha, as contas de água, de gás e de electricidade. Para mim que tenho de distribuir pelas 24 horas que os dias ainda têm – pelo menos para mim e para os animais que comigo coabitam… - o cuidado, higiene e tratamento de 15 criaturas vivas. Contando comigo.Para mim que, estando em casa, não paro um minuto para descansar porque assim o exige esta minha pequena multidão. Para mim que, de alguma forma, estou convicta de ter sido algo dotada em termos de escrita e traço e me encontro, portanto, na obrigação moral de partilhar esses dons. Para mim que, muito ao contrário do que possa parecer, até não sou estúpida de todo e considero que uma vida vale muito mais pela sua qualidade do que pela sua quantidade. Para mim que me sinto, também, na obrigação – alegre obrigação porque é com muito gosto que dialogo através da escrita – de responder aos comentários que diariamente vão deixando nos meus blogs
E, quantas vezes, não tenho de “inventar” horas sobressalentes para “colar” aos dias em que, ininterruptamente, trabalho . Todos os dias.
Toda esta prosa para vos dizer que o meu acesso à internet foi cortado, que tenho mais dívidas do que aquelas que gostaria, sequer, de imaginar e que não senhor. Não sou calona nem gastadora. Desenganem-se os descrentes. Não uso a internet para me divertir ou namorar. Não vejo filmes. Não jogo jogos. Não.
Eu tive, sempre, a certeza – ou a ilusão? – de ter usado a internet para trabalhar. Para crescer enquanto ser vivo e para, na minha opinião, contribuir para que outros pudessem melhorar um pouco. Penso ter dado o meu melhor. Penso que nada mais – e nada mais importante – se pode exigir a um ser humano. Malgré tout.
FORA DO SISTEMA.
PS - Dentro ou fora do sistema, seja qual for a minha orientação espacial ou espácio-temporal, estarei, sempre, profundamente grata a todos os que contribuíram - muito ou pouco, não interessa! - para que os meus dias online não tivessem terminado mais cedo.
Um muito obrigada e um grande abraço de cometa.
... era uma vez um cometa que passou e deixou, atrás de si, algumas centenas de sonetos, muitos abraços - todos os que tinha -, sorrisos, algum espanto e também algumas lágrimas.Porque é este, afinal, o destino de todos os cometas.