E AGORA?
E agora? – Foi a primeira coisa que pensou quando abriu a conta da banda larga daquele mês e os olhos lhe pousaram na descrição do débito total.
Já estava na blogosfera havia mais de um ano e nunca uma simples conta de banda larga tomara aquelas proporções. Mais de cento e setenta euros!
Exactamente menos nove euros do que o que recebia mensalmente do subsídio de inserção social e que, pagas as contas de água, luz e gás, mal lhe davam para jantar durante uma semana. Pousou a carta sobre o tampo da secretária e foi aos seus afazeres. Outras coisas a preocupavam naquele momento e, embora tendo vendido uma tela havia poucos dias, não conseguira pagar nem metade das dívidas que acumulara ao longo dos últimos meses.
Lembrava-se do dia em que recebera o vale da última tela, de quão gratificada se sentira, da ilusão pontual de poder sobreviver com um mínimo de dignidade. Lembrava-se de ter corrido para a farmácia, para pagar uma parte da dívida, lembrava-se das outras contas que haviam acabado de chegar e que reclamavam pagamento, dos condomínios, da eterna dívida bancária, dos animais que a mãe lhe deixara em testamento verbal…
Não era uma mulher inteligente, embora respirasse criatividade por todos os poros. Não podia ser inteligente ou nunca teria imaginado que o seu trabalho, um tanto ou quanto à revelia do sistema, pudesse vir a ser premiado ou recompensado de outro modo que não fosse aquela alegria genuína de quem dá tudo o que pode e, por vezes, mais do que isso. Mas era assim que ela entendia as coisas e, durante uns dias, não voltou a pensar no assunto. Aquela estupidez natural de quem teima em deslumbrar-se com as pequeninas coisas, colara-se-lhe ao corpo e, tomando as rédeas do percurso, passara a ser a sua mais determinante característica. Tão determinante que ela jamais pensaria que não fosse, lá bem no fundo, a sua maior qualidade.
Agora, sentada frente ao PC, repetia a frase: - E agora?
Agora escreveria, claro! Se mais não podia fazer!
Escreveu, então, mas, desta vez, sabia que talvez fosse a última que o sistema lhe permitiria. Não. Não se voltaria para os sonetos, como era habitual. Não aceitaria mais do que o que dava! Passava horas e horas agarrada àquele computador, “poetando” a sua burrice congénita, ao ponto de considerar-se justificada pelo ar que consumia neste planeta e aquilo teria de acabar. Teria de acabar mesmo! A Fábrica de Histórias pedia um “E agora?” esta semana e esta era a oportunidade exacta para falar do seu.
E agora? – escreveu…
Maria João Brito de Sousa - 2009
Directamente do fundo da alma para
http://fabricadehistorias.blogs.sapo.pt/
Imagem - Auto-Retrato em paint (sem rato...)
NOTA - Segue a amarelo pela vaga - ou não tão vaga assim... - simbologia que o amarelo tem para nós, humanos.
O meu amigo FREE STYLE precisa de apoio por uma causa que não é dele, mas na qual acredita e pela qual está a sofrer.
Deixo-vos uma "portinha" aberta para que possais, pelo menos, reflectir um pouco sobre o assunto ou deixar-lhe umas palavras de apoio:
http://free-stile.blogs.sapo.pt/ É aqui...