UM SONETO PARA SÁ DE MIRANDA
I
O sol é grande: caem coa calma as aves,
Do tempo em tal sazão, que sói ser fria.
Esta água que alto cai acordar-me-ia,
Do sono não, mas de cuidados graves.
Ó cousas, todas vãs, todas mudaves,
Qual é tal coração que em vós confia?
Passam os tempos, vai dia trás dia,
Incertos muito mais que ao vento as naves.
Eu vira já aqui sombras, vira flores,
Vi tantas águas, vi tanta verdura,
As aves todas cantavam de amores.
Tudo é seco e mudo; e, de mistura,
Também mudando-me eu fiz doutras cores.
E tudo o mais renova: isto é sem cura!
Francisco Sá de Miranda - 1481/1558
II
Filha de um novo tempo, nada sabes
das minhas mil razões, da minha dor,
da força que me eleva, como as aves
esvoaçam nesse azul em derredor,
Mas se em tempo distamos, se mal cabes
nos versos que deixei quando o vigor
soprava, poderoso, sobre as traves
do corpo, que era o meu, no seu melhor
Hoje coube-me ler-te e, num repente,
nasceu-me esta vontade de entender-te,
de ver-te, ainda vivo, inda presente...
Loucura minha, eu sei, pois, conhecer-te,
foi mero impulso que, embora premente,
soçobrou no momento em que ousei ler-te.
Maria João Brito de Sousa - 11.10.2015 - 14.21h
II
Filha de um novo tempo, nada sabes
das minhas mil razões, da minha dor,
da força que me eleva, como as aves
esvoaçam nesse azul em derredor,
Mas se em tempo distamos, se mal cabes
nos versos que deixei quando o vigor
soprava, poderoso, sobre as traves
do corpo, que era o meu, no seu melhor
Hoje coube-me ler-te e, num repente,
nasceu-me esta vontade de entender-te,
de ver-te, ainda vivo, inda presente...
Loucura minha, eu sei, pois, conhecer-te,
foi mero impulso que, embora premente,
soçobrou no momento em que ousei ler-te...
Maria João Brito de Sousa - 11.10.2015 - 14.21h