Maria João Brito de Sousa
EU E AS PALAVRAS
Juntos , tu, eu e as palavras, Vamos pela vida lado a lado, Tentando esquecer o que é passado, Para ter o futuro que ambicionava.
A palavra é a minha companhia, Nos melhores momentos e nos maus, Quando a minha vida está um caos, Busco na palavra a energia.
Às vezes não encontro o que dizer, E por essa razão eu fico triste, E sinto que por dentro estou vazia.
Mas quando começo a escrever, Vejo que a Paixão ainda existe, E volta de novo a alegria.
Maria Idalina Pata
29-03-2017
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O MEU CANTIL DE PALAVRAS
"Juntos, tu, eu e as palavras",
Escrevemos tudo aquilo que entendermos
Desde que essas palavras sejam termos
Concretos e leais, nas suas lavras...
"A palavra é a minha companhia",
Minha raiz, meu fruto e meu sustento;
Dela me nasce um caule, inda rebento,
Que cresce noite a noite e dia a dia...
"Às vezes não encontro o que dizer"
Porque a palavra tarda em renascer
Quando a vida me lança em campo hostil,
"Mas quando (re)começo a escrever",
Cada palavra, diga o que disser,
Enche de esp`rança e seiva o meu cantil...
Maria João Brito de Sousa - 31.03.2017 - 09.58h
publicado às 12:23
Maria João Brito de Sousa
COLHEITA
Surge o coro dos pássaros cantores
na catedral pagã da mataria.
O milho ruivo e os pomos tentadores
cobrem a terra pródiga e sadia.
É o tempo da colheita. Os segadores
remoçam, cantam, choram de alegria.
Como prêmio ao suor dos lavradores,
não vai faltar o pão de cada dia.
Garças esbeltas, de alva formosura,
passeiam pelo campo aquela alvura
que põe, no verde, branquidões bizarras.
E o coqueiro se curva, satisfeito,
porque ainda vibra, dentro do seu peito,
o zunido estridente das cigarras...
Vasco de Castro Lima
In osecularsoneto.blogspot.pt
COLHEITAS,,,
"Surge o coro dos pássaros cantores"
E eu páro de cantar, que é já cumprida
A função de aliar-me aos produtores
Das mais belas colheitas desta vida.
"O tempo é de colheita. Os segadores"
Empunham, com mão forte e decidida,
As foices e, esquecendo algumas dores,
Empenham corpo e alma na corrida.
"Garças esbeltas de alva formosura"
Vão-nos sobrevoando a grande altura,
Um mesmo sol dourado os abençoa
"E o coqueiro se curva, satisfeito,"
Completando um cenário tão perfeito
Que nos lembra uma tela de Malhoa...
Maria João Brito de Sousa - 30.03.2017 - 12.39h
publicado às 12:47
Maria João Brito de Sousa
DIAS DE MULHER
Na madrugada ainda escurecida
Desperta, com o sono inacabado
E vai ainda meio adormecida
Começar mais um dia complicado
Tem como companheira a avenida
Que percorre com passo já cansado
Do tanto que já fez, até comida!
Para poupar no seu magro ordenado
Entre papéis com tanta informação
Pessoas e projectos, reunião
O seu dia passou alucinante
Já em casa as palavras são caladas
Plo silêncio que soa quais baladas
No cansaço que em si se faz reinante
MEA
21/03/2017
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TODOS OS DIAS...
"Na madrugada ainda escurecida",
Desperta antes que o sol possa ofuscá-la
E mesmo que tirite enfrenta a vida,
Que a mulher pobre, nem o frio a cala.
"Tem como companheira a avenida"
Que a leva desde o quarto até à sala;
Passo a passo a percorre decidida
A não falhar um passo e a alcançá-la.
"Entre papéis com tanta informação",
Vai-se vergando àquela profusão
De guias e de contas por pagar.
"Já em casa as palavras são caladas"
Por cálculo mental. Contas saldadas,
Nada lhe sobra pr`a poder contar...
Maria João Brito de Sousa - 29.03.2017 - 16.34h
publicado às 17:43
Maria João Brito de Sousa
Sem força, quase paro e, se te alcanço,
É sem coragem que te piso as margens
E é sem garra alguma que em ti lanço
Quanto me sobra de estro, ou de miragens...
Evoco um rio e é num regueiro manso
Que me traduzo agora... que mensagens,
Que palavras grafar se assim me canso
De espelhar-me sem ver, de volta, imagens?
Serena, mas selvagem fui, um dia...
Não mais selvagem sou porque, rendida,
Torno-me água que estagna em agonia,
Em vez desse caudal que soma vida
Ao mesmo mar de onde renasceria,
Se a rota exacta fosse enfim cumprida...
Maria João Brito de Sousa - 28.03.2017 - 15.57h
publicado às 16:28
Maria João Brito de Sousa
JÁ FOSTE RICO E FORTE E SOBERANO
Já foste rico e forte e soberano, Já deste leis a mundos e nações, Heróico Portugal, que o gram Camões Cantou, como o não pôde um ser humano! Zombando do furor do mar insano, Os teus nautas, em fracos galeões, Descobriram longínquas regiões, Perdidas na amplidão do vasto oceano. Hoje vejo-te triste e abatido, E quem sabe se choras, ou então, Relembras com saudade o tempo ido? Mas a queda fatal não temas, não. Porque o teu povo, outrora tão temido, Ainda tem ardor no coração. Saúl Dias, in "Dispersos (Primeiros Poemas)"
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DEPOIS DE CADA NOVA PROVAÇÃO
"Já foste rico e forte e soberano,"
Cruzando o mar remoto dos mil medos,
Das ondas, dos abismos, dos rochedos
Que a tantos provocaram tanto dano.
"Zombando do furor do mar insano",
Tentaste ir desvendando os seus segredos
E, conseguiste, embora os mil degredos,
Conhecê-los melhor, ano após ano.
"Hoje vejo-te triste e abatido",
Como se toda a gesta o fosse em vão
E vão te fosse o tanto já cumprido,
"Mas a queda fatal não temas, não"!
Erguer-te-ás mais forte e aguerrido
Depois de cada nova provação!
Maria João Brito de Sousa - 26.03.2017 -18.59h
NOTA - Sául Dias é o pseudónimo literário de Júlio Maria dos Reis Pereira, irmão de José Régio.
O nome que usou enquanto artista plástico foi Julio.
publicado às 22:18
Maria João Brito de Sousa
É dia vinte e quatro, sexta-feira
De um mês que segue a esteira, mas tropeça,
Pois sempre recomeça na carteira
E, nesta sexta-feira, não começa...
Promessa que é promessa, sem rasteira,
Será de outra maneira que se apressa,
Assim que reconheça a sua asneira,
A ser mais verdadeira, pois confessa;
- Depressa, bem depressa, à dianteira,
Sairei da fronteira da promessa
Que nunca mais se apressa a dar-se inteira...
Talvez, segunda-feira, até te peça
Que o teu corpo se esqueça da canseira
Pra meter na carteira o que lhe interessa...
Maria João Brito de Sousa - 25.03.2017 -09.37h
("Brincando" com as angústias bem reais dos atrasos do RSI, em decassílabo heróico e rima cruzada...)
publicado às 09:42
Maria João Brito de Sousa
APEADEIROS
*
Por um segundo paro... e foi-se um dia,
Ou mesmo dois ou três passaram já,
Que o tempo voa e nunca abrandará,
Nem mesmo pr`a fazer-me companhia
*
Quando, em contra-relógio, adormecia
Na cama, na cadeira, ou no sofá,
Esquecendo-me do nada que não dá
Pra perfazer, dos gastos, a quantia.
*
Peço desculpa por estar viva... ainda;
A Poesia é muito mais bem-vinda
Quando é fruto dos vates do passado
*
E, sempre que o constato, sinto, assim,
Uma espécie de angústia acesa em mim.
(Cada "melhor de mim", passa-me ao lado...)
*
Maria João Brito de Sousa - 23.03.2017 - 06.44h
publicado às 07:32
Maria João Brito de Sousa
A UM POETA
SURGE ET AMBULA!
Tu, que dormes, espírito sereno,
Posto à sombra dos cedros seculares,
Como um levita à sombra dos altares,
Longe da luta e do fragor terreno,
Acorda! é tempo! O Sol, já alto e pleno,
Afugentou as larvas tumulares…
Para surgir do seio desses mares,
Um mundo novo espera só um aceno…
Escuta! é a grande voz das multidões.
São teus irmãos que se erguem! são canções…
Mas de guerra… e são vozes de rebate!
Ergue-te, pois, soldado do Futuro,
E dos raios de luz do sonho puro,
Sonhador, faze espada de combate!
Antero de Quental
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CONVOCATÓRIA
"Tu que dormes, espírito sereno",
Convicto das razões que ora te movem,
Sincero, sonhador, ainda jovem
E, na credulidade, em tudo ameno,
"Acorda! É tempo! O Sol, já alto e pleno",
Afasta as duras penas que nos chovem
Das negras, negras nuvens que promovem
Uma bátega d`água, a medo obsceno!
"Escuta! É a grande voz das multidões"
Que, renegando antigas convenções,
Se lança a conquistar um mundo novo!
"Ergue-te, pois, soldado do Futuro"
E derruba as prisões que, muro a muro,
Sufocam as razões de cada povo!
Maria João Brito de Sousa - 12.03.2017 - 15.57h
publicado às 16:26
Maria João Brito de Sousa
O SEU NOME
Ela não sabe a luz suave e pura Que derrama numa alma acostumada A não ver nunca a luz da madrugada Vir raiando, senão com amargura! Não sabe a avidez com que a procura Ver esta vista, de chorar cansada, A ela... única nuvem prateada, Única estrela desta noite escura! E mil anos que leve a Providência A dar-me este degredo por cumprido, Por acabada já tão longa ausência, Ainda nesse instante apetecido Será meu pensamento essa existência... E o seu nome, o meu último gemido.
João de Deus
(Campo de Flores, 1893) In Poemas Portugueses Antologia da Poesia Portuguesa do Séc. XIII ao Séc. XXI, Porto Editora
INOCÊNCIA(S)
"Ela não sabe a luz suave e pura"
Que um soneto lhe acende, ao desfolhar-se
E não pode, portanto, recordar-se
De jamais ter provado essa doçura,
"Não sabe a avidez com que a procura"
Da pura melodia, ao ter-se, ao dar-se,
Lhe traria a certeza de encontrar-se
A fundo, até ao ponto de ruptura,
"E mil anos que leve a Providência"
A apontar-lhe o caminho, é bem sabido
Que, enchendo-se de pressa e de impaciência
"Ainda nesse instante apetecido",
Nunca o encontrará. Pura inocência
Julgar, por puro azar, tê-lo perdido...
Maria João Brito de Sousa - 11.03.2017 - 15.43h
publicado às 15:41
Maria João Brito de Sousa
CORAGEM *
Coragem? Que é dela se, manipulada,
Me sinto sondada, moldada, invadida
No que à minha vida concerne e, num nada,
Me vejo humilhada, presa e sem saída? *
Calo a voz dorida que assim controlada
Em vez de indomada carne aberta em f`rida
Que oscila vencida qual chama apagada
Da vela engendrada nos palcos da vida *
Esta, de sumida, soa-me abafada,
Ou desafinada, que triste e vencida
Não será ouvida porque amordaçada *
Por mão precavida. Solto-a sussurrada
Em vez de exaltada mostrá-la traída
Que a força antes tida foi-me ora negada. *
Maria João Brito de Sousa
09.03.2017 - 16.13h
publicado às 16:23
Maria João Brito de Sousa
Todas as minhas raivas e tristezas
E todas as angústias, todas elas,
Me vêm da dif`rença entre as grandezas
Engendradas por homens, não por estrelas!
Nem de astros, nem de ocultas naturezas,
Me surgem, com razão, razões pr`a tê-las,
Pois sendo humanas todas as fraquezas,
Também humanas são as causas delas...
Burocracias, desencontro, atraso,
Não saber ver-se um caso em cada caso
E as mil e uma falhas do sistema,
Vão-me deixando assim, fora de prazo;
Ribeira sêca em cujo leito raso
Naufraga, verso a verso, o meu poema...
Maria João Brito de Sousa - 08.03.2017 - 14.10h
publicado às 14:35
Maria João Brito de Sousa
APOGEU POÉTICO FESTIVO
Patrono: Florbela Espanca
Académica: Maria João Brito de Sousa
Cadeira: 06
NASCE E CRESCE, POESIA!
Perguntas por que escrevo. Eu sei-o lá?!
Mais forte do que eu própria, mais teimosa,
Floresço na Poesia, mais que em prosa,
E torno-me um dos frutos que ela dá...
De mim mesma, ou da vida, me virá,
Impondo-se-me, forte, imperiosa,
Mesmo quando sem esp`rança e desgostosa
Me arrasto pela vida ao Deus-dará;
Afastem-na de mim, que logo morro,
Pois será sempre a ela que recorro
Nas mais doridas horas da amargura
E sempre que sobre ela assim discorro,
Bem mais procuro, além do seu socorro,
Que a própria Vida nasça da procura...
Maria João Brito de Sousa - 07.03.3017 - 10.29h
IMAGEM - "Madona do Silêncio", Debora Arango
publicado às 10:56